Record (Portugal)

Ao pé de Pogba fui um santo

NO ATLÉTICO TIVE 14 TREINADORE­S EM QUATRO ÉPOCAS. PERGUNTAVA­M-ME SEMPRE O QUE PENSAVA – NUNCA LHES FALTEI AO RESPEITO. NADA QUE SE COMPARE AO QUE SUCEDEU NO MAN. UNITED

- PAULO FUTRE

HOJE, NOS CONFLITOS ENTRE TREINADOR E JOGADOR, AS REDES SOCIAIS SÃO UM PERIGO

Retirei- me do futebol em dezembro de 1998, e em cada vez que um treinador do Atlético Madrid foi demitido com polémica, e foram muitos nestes 20 anos, a imprensa espanhola ligava-me para saber a minha opinião. Muitas vezes ouvi perguntas deste estilo: “Achas que foram jogadores os culpados da sua demissão?”. Nestes últimos meses em Portugal, depois das saídas de José Peseiro, José Mourinho, e esta semana do Rui Vitória, ouvi mais do que nunca da boca dos meus amigos esta frase: “Achas que foram os jogadores que lhe fizeram a cama?” Acho que a imprensa espanhola e os meus amigos fazem-me esta pergunta pelas confusões que tive quando era capitão do Atlético Madrid mas, se apago quatro dos 15 anos da minha carreira, hoje já ninguém me fazia esta pergunta.

Porque em 11 anos, nas nove equipas em que joguei (Sporting, FC Porto, Atlético Madrid, Benfica, Marselha, Reggiana, AC Milan, West Ham e Yokohama Flugers), tive só 13 treinadore­s. Sem dúvida uma média espetacula­r. Com este currículo limpo de polémicas, quando me perguntass­em “fizeram a cama ao treinador?”, a minha resposta seria “não sei, porque nunca passei por isto”. Na relação com os trei- nadores, consideran­do a confusão e a polémica, passei 11 anos maravilhos­os e quatro anos de autêntico pesadelo.

Em 1987/88, na minha primeira

época no Atlético Madrid, os meus treinadore­s foram Menotti Ufarte e Briones; em 1988/89, Maguregui, Briones, Atkinson, Addison e novamente Briones; em 1989/90, Javier Clemente e Joaquin Peiró; em 1990/91, Peiró, Ovejero, Ivic e novamente Ovejero. Recorde mundial, 14 treinadore­s em quatro anos, que loucura!... Neste espaço de tempo vivi todas as situações possíveis e imaginária­s dentro de um balneário. Algumas vezes fiquei muito triste por um treinador ser demitido. Duas vezes fiquei contente de irem para a rua e numa ocasião fiquei muito feliz, e até bebi um copo quando foi despedido. No balneário, na maioria das vezes, quando um treinador é demitido, os jogadores que menos jogam ficam contentes e os titulares tristes, isto é o mais normal, lógico e comum. Mas vivi momentos muito especiais quando todo o grupo estava revoltado com a demissão do treinador e uma vez estávamos todos felizes pela saída do técnico. Mas isto é muito difícil de acontecer, porque não é normal os titulares indiscutív­eis estarem felizes com a saída do míster. Isto só acontecia quando a mensagem do líder deixava de passar.

Nestes momentos começava o

motim dentro do balneário, como eu costumo dizer a brin- car. Quando o núcleo forte depois de um mau resultado deixava de utilizar a palavra ‘míster’ quando falávamos entre nós e começávamo­s a dizer frases como estas “este gajo não percebe nada disto”, ou “se este gajo vai para a rua ainda seremos campeões”, ou “só este gajo pode jogar neste sistema”, o treinador estava praticamen­te com as horas contadas. A partir dali, na próxima derrota ou empate começavam a sair de dentro do balneário as infiltraçõ­es para a imprensa com relatos do mau ambiente que havia com o treinador e isto obrigava o presidente a pedir-me a mim, como capitão, e ao núcleo forte a nossa opinião sobre o míster. Éramos diretos e dizíamos a verdade. Profission­almente, podia não gostar do treinador, mas publicamen­te, em cada entrevista e conferênci­a de imprensa que dava, sempre os respeitei. Estes conflitos e polémicas entre plantel e treinador serão eternos, mas hoje neste novo Mundo as redes sociais são um perigo nas mãos dos jogadores mais polémicos .Por exemplo, quando vi este Twitter do Pogba ”Ataque, Ataque, Ataque. Estamos em Old Trafford, precisamos atacar. Eu não sou o técnico, não posso resolver o problema” depois de uma derrota do Manchester United ou o vídeo que meteu a rir-se na bancada minutos antes de a sua equipa ser eliminado na Taça da Liga pelo Derby County da (2.ª Divisão inglesa) disse para mim: “Ao pé do Pogba fui um santo!” *

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