Record (Portugal)

Iniciados na violência

- André Veríssimo Diretor do Negócios

O clássico entre FC Porto e Sporting terminou sem golos, o que não é frequente, e sem incidentes, o que também é raro e por isso de sublinhar. Não houve polémicas ou declaraçõe­s incendiári­as antes e depois. Varandas e Pinto da Costa sentaram-se lado a lado, num clima de cordialida­de. Também não se registaram problemas com as claques, pelo menos dignos de nota.

Apesar da hora invulgar do

jogo, estiveram mais de 45 mil nas bancadas de Alvalade, a assistênci­a mais elevada da época até ao momento. Só faltaram os golos para a festa ser completa, mas isso não impede que este tenha sido um hino àquilo que deve ser o futebol, jogado dentro das quatro linhas, com respeito mútuo entre todos os in- tervenient­es. Vamos acreditar que um dia serão todos assim e que referir o ambiente pacífico em que os jogos decorreram deixará de ser notícia, tal a banalidade. Para lá chegar é preciso ir à raiz. Um vídeo partilhado por Duarte Gomes, antigo árbitro de futebol, na sua página do Facebook, deixa à vista o que normalment­e passa oculto.

São 26 segundos de adultos à pancada nas bancadas, ouvem-se gritos e há crianças à volta. A cena triste e obscena passa-se em Massamá, durante o jogo entre o Real Sport Clube e o Despertar de Beja em... iniciados. Ou seja, numa partida entre rapazes com 14 e 15 anos. Os miúdos são iniciados na violência verbal e física logo nos escalões jovens, praticada por pais e adeptos. Não só os miú- dos que jogam, mas também os que assistem.

“Árbitro agredido por paiem jogo sub-13 emLeiria”. “Pai de jogador agride jovens árbitros depois da expulsão do filho”. “Árbitro agredido em jogo de estudantes universitá­rios”. “Pais e adeptos encurralam e ameaçam árbitro em Fafe”. “Árbitro de 17 anos agredido em jogo de futsal feminino”. “Pai de jogador expulso invadiu campo para agredir árbitro”. “Agressões em jogo de juvenis em Setúbal terminam com um ferido”. São todos títulos dos últimos dois anos, obtidos numa simples pesquisa no Google. São títulos de mais e mostram bem que o fim da violência no futebol é uma batalha que tem de ser travada em cada terra, escalão a escalão.

A direção do Real Sport Clube veio condenar a violência, apelando “aos adeptos, em particular aos pais dos atletas, para que sejam o melhor exemplo dos valores desportivo­s”. Deveria ir mais longe e impedir os envolvidos de voltar a entrar no estádio, ponto final!

Não é por acaso que foi Duarte Gomes a ter acesso ao vídeo: tem-se batido pelo combate à violência no futebol. E também partilha bons exemplos na sua página do Facebook, como o dos benjamins do Paços de Brandão, do campeonato distrital de Aveiro, que entrou em campo com cinco jogadores em vez de sete, porque o Sporting de Espinho só tinha cinco jogadores disponívei­s.

OS MIÚDOS SÃO INICIADOS NA VIOLÊNCIA VERBAL E FÍSICA PRATICADA POR PAIS E ADEPTOS PRECISAMOS DE UM FUTEBOL MAIS COMO O DOS BENJAMINS DO PAÇOS DE BRANDÃO E SEM OS DELINQUENT­ES DAS BANCADAS DE MASSAMÁ

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