Record (Portugal)

Um risco controlado

- POUCO TEM A VER

história do Benfica do último mês e meio é uma sucessão de manobras de alto risco. Depois de ter mantido em funções um treinador para além do razoável, Luís Filipe Vieira promoveu interiname­nte o responsáve­l pela equipa B, pré-anunciou uma solução definitiva a breve trecho, afirmando que “o dinheiro não era um problema”, para, depois de um par de vitórias, confirmar Bruno Lage como treinador principal.

Mas se o que Vieira fez foi arriscado, que dizer das opções corajosas de Lage? Com um par de dias de treino, alterou o sistema, deu oportunida­des a jogadores ostracizad­os e colocou em campo os elementos certos nas posições certas, enquanto reforçava o plantel principal com o núcleo duro da equipa B. Escolhas tanto mais surpreende­ntes quanto vindas de um treinador que não tinha nem a autoridade de um passado como jogador de topo, nem sequer experiênci­a e curriculum relevantes em equipas seniores.

Se Lage goza hoje de apoio incontesta­do entre os adeptos e da confiança evidente do plantel, deve-o à qualidade na preparação dos jogos. O Benfica de hoje pouco tem a ver com a equipa sofrível que se arrastava em campo no final de 2018. Se assim é, não foi por ter tido uma injeção de motivação ou por apresentar outra atitude em campo, mas, sim, por ter melhorado muito o processo de jogo. Ontem, na Vila das Aves, ao contrário do que aconteceu no jogo para a Taça da Liga, de facto, havia necessidad­e de ganhar e a abordagem foi diferente: na forma como a equipa circula a bola, joga pelos três corredores e ataca a profundida­de. Em apenas mês e meio, sem pausas para treinar, o Benfica melhorou em todos os momentos do jogo.

O que nos devolve ao risco e à coragem. Quando foi conhecido o onze titular que defrontou o Galatasara­y na semana passada, a reação terá sido unânime: na Liga Europa, jogar com a equipa B reforçada talvez seja correr dema-

O BENFICA DE HOJE COM A EQUIPA QUE SE ARRASTAVA EM CAMPO

siados riscos. Para surpresa, diria, de quase todos, o risco compensou. O que talvez queira dizer que, uma vez mais, o risco era controlado.

Com seis jogadores da formação, quatro estreias na Europa e com uma média de 22 anos, na Turquia, o Benfica continuou a jogar um futebol coerente com a ideia de jogo de Lage e acabou até por vencer a partida. Se assim foi, é porque o processo começa a estar de tal forma consolidad­o que se sobrepõe a que jogadores jogam em cada momento. A velha afirmação de Jorge Jesus de que “se não jogar o Matic, joga o Manel”, voltou a fazer sentido. Com a vantagem de que, desta feita, o Manel é um miúdo formado no Seixal, que, afinal, não precisou de nascer dez vezes.

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