“TAD é elitista e serve-se do futebol”
O presidente do Sindicato dos Jogadores é pródigo em críticas ao Tribunal Arbitral do Desporto. As custas, a representatividade, a escolha dos árbitros e o esvaziamento da Comissão Arbitral Paritária são alguns dos reparos
Que balanço faz no final do primeiro mandato dos árbitros do TAD?
JOAQUIM EVANGELISTA - Como o Sindicato sempre afirmou, o TAD faz sentido se pensado para a arbitragem necessária, ultrapassando dessa forma o congestionamento que se verificava nos Tribunais Administrativos de Círculo e proporcionando, também, decisores mais próximos do fenómeno desportivo. Entendíamos e viemos a confirmar que o TAD não oferece grande mais-valia no que respeita à arbitragem voluntária, em concreto na resolução de litígios laborais entre jogadores e clubes ou SAD. Os números confirmam isso mesmo e revelam uma tendência preocupante e contrária ao espírito enunciado pelos seus criadores.
+ Em que se baseia para fazer essa avaliação?
JE - Em primeiro lugar, o número de processos e suas espécies. Em 2016, deram entrada no TAD 31 processos, todos respeitantes a arbitragem necessária – recursos de decisões das federações. Em 2017, entraram 76, dos quais 71 respeitaram a arbitragem necessária e cinco a arbitragem voluntária. Em 2018, foram 94 os processos, sendo 88 de arbitragem necessária e seis de arbitragem voluntária. Por outro lado, a esmagadora maioria dos processos relativos à arbitragem necessária respeitam a decisões tomadas pelo Conselho de Disciplina da FPF, pelo que temos como radiografia que o futebol ocupa a esmagadora maioria do trabalho do TAD. Finalmente, dos 11 processos de arbitragem voluntária, apenas um não respeita a um conflito de natureza laboral entre jogadores e SAD. É manifesto, portanto, o peso do futebol na atividade do TAD. De assinalar ainda que, tendo sido preocupação dos ‘pais’ do tribunal que das suas decisões não coubesse recurso para os tribunais administrativos, até hoje não houve nenhum recurso para a Câmara de Recurso, recorrendo-se sempre para o Tribunal Central Administrativo Sul.
+ O TAD veio retirar a competência à Comissão Arbitral Paritária (CAP) paradirimir litígios laborais entre jogadores e clubes. Foi uma boa solução?
JE - As decisões do TAD em processo de arbitragem voluntária – leiase processos de natureza juslaboral entre jogadores profissionais de futebol e SAD – têm um tempo de duração superior ao que se verificava no âmbito da CAP.
+ Há explicação para essa demora?
JE – A maioria dos árbitros do TAD é designada por entidades que não representam o desporto profissional, verificando-se uma carência muito grande de juslaboralistas e, por isso, com sensibilidade para a resolução de litígios de caráter marcadamente laboral. Situação que sai ainda mais agravada pelo facto de não existir paridade no colégio arbitral entre os árbitros designados pelos representantes das entidades empregadoras desportivas e os atletas profissionais, nomeadamente no futebol. Além disso, os custos para litigar no TAD são absolutamente incomportáveis para os atletas. É inaceitável e representa no limite uma denegação do acesso à Justiça que nem o sistema de apoio judiciário consegue suprir.
+ Não aceitaque umaJustiçacélere deva ter um preço alto?
JE - Os processos no TAD têm custos muito elevados, desde logo, se comparados com as taxas de justiça praticadas nos tribunais estaduais. Por exemplo, os encargos de uma ação em que se impugne uma sanção de suspensão da atividade de um atleta ultrapassarão os 5 mil euros. Na arbitragem voluntária as coisas ainda são mais gravosas. Nos processos que opõem os jogadores que rescindiram os contratos com o Sporting, os encargos com o processo totalizam cerca de 210 mil euros, quantitativo tem de ser pago por cada uma das partes antes de obtida a decisão. Nunca uma arbitragem na CAP teve custos destes.
+ Qual é então a solução?
JE - Urge alterar as taxas de justiça de forma a isentar o atleta do pagamento, além de serem pagas no final, e diminuir os encargos globais.
+ Qual a proposta do Sindicato para os conflitos laborais entre jogadores e clubes?
JE - A competência do TAD nessa matéria é mais cara, mais morosa e menos próxima do fenómeno sobre o qual atua, sendo, por isso, potencialmente, menos justa. Acresce que cria graves problemas no que respeita ao reconhecimento das decisões no plano internacional, porquanto estas instâncias têm advogados que apenas têm legitimidade nos tribunais arbitrais que tenham uma composição paritária de árbitros, designados pelas associações dos jogadores e pelas associações dos clubes/SAD.
+ A composição do Conselho de ArbitragemDesportiva(CAD) me-
rece-lhe algum reparo?
JE – Compete ao CAD superintender no TAD. Ora, apesar de caber ao TAD apreciar as decisões das federações e dirimir os litígios entre atletas e clubes/SAD, verifica-se que nem as federações nem as associações têm o direito de designar qualquer membro do CAD! Com efeito, do ‘mundo do desporto’, apenas o Comité Olímpico de Portugal e a Confederação do Desporto em Portugal têm direito a designar membros do CAD. Com o devido respeito, entende-se mal esta opção de conferir ao COP este poder. + A listagem de árbitros deverá ser norteada por outros princípios?
JE - O TAD tem 40 árbitros e no primeiro mandato foram nomeados alguns árbitros não juristas, os quais praticamente não tiveram intervenção em nenhuma decisão arbitral. Para o Sindicato é incompreensível e intolerável que versando a atividade do tribunal esmagadoramente sobre litígios no âmbito do futebol, não só não está previsto que a associação representativa de jogadores profissionais de futebol possa designar árbitros, como as organizações socioprofissionais de praticantes das modalidades em que se disputam as competições desportivas profissionais apenas têm o direito de designar um árbitro em 40. Ao invés, o COP designa cinco árbitros, e chegamos ao caricato de a Comissão de Atletas Olímpicos designar dois árbitros. A Associação Portuguesa de Direito Desportivo designa tantos árbitros como o Sindicato. Esta situação é inconcebível e tem de ser urgentemente alterada
+ Existemoutras matérias que penalizam os jogadores?
JE – Sim, o facto de o recurso para o TAD das sanções do CD, nomeadamente de suspensão, não ter efeito suspensivo. Atualmente, só por via de uma providência cautelar é possível obstar à sua execução imediata. Ora, o cumprimento de uma decisão de suspensão da atividade causa ao jogador um prejuízo terrível que o ganho da causa no recurso para o TAD jamais poderá repor. *
“É MANIFESTO O PESO DO FUTEBOL NA ATIVIDADE DO TRIBUNAL [...] E DE PROCESSOS QUE ENVOLVEM JOGADORES” “OS ENCARGOS COM O PROCESSO [RESCISÃO DOS JOGADORES DO SPORTING] TOTALIZAM 210 MIL EUROS”