Uma competição de castas
LÍDER DA JUVENTUS E DA ECA, DEFENDE ABERTAMENTE UMA PROVA FECHADA A CRIAÇÃO DE UMA ESPÉCIE DE LIGA DE ELITE NAS COMPETIÇÕES EUROPEIAS VAI FAZENDO O SEU CAMINHO. ALÉM DO DESNÍVEL COMPETITIVO QUE IRÁ INDUZIR, É UMA AMEAÇA AOS CAMPEONATOS NACIONAIS
Ao longo da sua história, a Liga dos Campeões foi evoluindo de um modelo de representação igualitária para um formato que privilegia os campeonatos e clubes mais ricos. Por pressão destes, evidentemente.
Longe vai o tempo em que participavam os campeões
dos diferentes países e a equipa que defendia o título. Agora os quatro primeiros classificados dos quatro campeonatos que lideram o ranking têm entrada garantida e os clubes recebem à cabeça um ‘superprémio’ de entrada, em função da sua posição no ranking da UEFA.
Havia bons argumentos para evoluir para este
modelo. A presença de mais equipas de elevado nível competitivo das principais ligas permitia acrescentar interesse à prova e com isso aumentar as receitas. No fundo, ter mais dinheiro para distribuir por todos.
O ob j et ivo foi at ingido. A receit a da p rova passou de
820,4 milhões de euros em 2007/08 para 2.108 milhões na última época. A estratégia teve, no entanto, um importante dano colateral: contribuiu para criar um fosso monetário e competitivo entre as equipas europeias.
A coisa não vai ficar por aqui.
Andrea Agneli, presidente da Juventus e da poderosa Associação Europeia de Clubes (ECA, na sigla inglesa), defende já abertamente uma prova fechada num grupo de equipas. Após a assembleia geral da ECA, realizada no fim do mês, anunciou o lançamento da discussão sobre o modelo para a Liga dos Campeões no pós-2024, onde essa visão aparece vertida. Segundo o ‘Sunday Times’, a prova passaria a ter quatro grupos de oito equipas em vez de oito grupos de quatro. O que significa que cada uma faria 14 jogos só na fase de grupos, em vez dos atuais seis.
A qualificação inicial teria por base o coeficiente
de cada clube, calculado com base no desempenho desportivo nas provas europeias nos quatros anos anteriores, possivelmente ponderado com o número de troféus europeus erguidos no passado. Daí para a frente os 24 clubes classificados nas seis primeiras posições de cada grupo ficariam diretamente apurados para a competição do ano seguinte. Os restantes clubes europeus competiriam para apenas oito vagas.
O ob j et ivo é o mesmo: ir b uscar mais dinheiro.
Só que agora com um dano colateral insustentável e que viola o espírito do que devem ser competições europeias. Este modelo irá cristalizar um sistema de castas, onde a mobilidade das inferiores para as superiores será quase impossível, marginalizando 90% dos clubes. A menorização dos campeonatos nacionais parece inevitável: o maior peso e a pressão de calendário acrescida desta Champions será ganha à custa daqueles.
O ‘Futebol Primeiro’ é um dos princípios para o futuro
que a UEFA definiu. Diz ele que “o futebol é um jogo antes de ser um produto, um desporto antes de ser um mercado, um espetáculo antes de ser um negócio”. Outro princípio defende um “modelo caracterizado pela promoção e relegação (…) e competições abertas com oportunidades para todos”.
É a UEFA que o defende.
Conseguirá impor estes valores frente aos grandes clubes ou teremos uma competição inteiramente capturada por eles?