A desunião crónica e os cancros do Sporting
A ‘COMUNIDADE SPORTING’ OU SE UNE OU ACABARÁ POR SER UM CLUBE COM MUITOS SÓCIOS, MAS AINDA MENOS COMPETITIVO
O Sporting tem um problema de desunião crónica para resolver, que tudo afecta – e, claro, a natureza da gestão desportiva e a equipa de futebol.
Um problema de desunião cróni
ca é como um cancro. É muito difícil de curar, se não for atacado no momento certo, antes de se desenvolver e alastrar.
A desunião crónica ainda não matou o Sporting, mas está a enfraquecê-lo de uma forma irracionalmente inconcebível. É muito difícil erguer alguma coisa, no futebol do clube ou na sua periferia, enquanto a desunião prevalecer sobre tudo o resto.
A desunião crónica é o princípio e pode ser o fim de tudo.
O Sporting não morre, mas no futebol está a fraquejar perigosamente na sua dimensão desportiva e competitiva. É preciso ter a noção disso. E ter a noção que mais egos, arrogâncias, ambições descabeladas, insultos e manifestações de natureza patológica, gratuitamente violentas, vão empobrecer o Sporting a um nível que muitos imaginariam impossível.
Em dimensões diferentes, e, portanto, com menor suporte social e associativo, é bom lembrar que, embora por razões diferentes, clubes representativos como o V. Setúbal (vitorianos, não permitam, a propósito, que constitua uma espécie de insulto associar a cidade de Setúbal ao Vitória, como parece que está para acontecer…), Boavista, Belenenses, Académica, já para não citar outros que chegaram a andar na chamada 1.ª Divisão que entretanto já se extinguiram ou perderam representatividade, foram longe em resultados e, nalguns casos, até foram campeões nacionais ou importantes no contexto europeu, e debatem-se hoje com inegáveis problemas de afirmação ou reabilitação.
O Sporting, ainda noutro pata
mar, é um caso singular de resiliência. Metaforicamente, é um barco que anda no alto-mar a levar com a força das ondas, algumas das quais aumentadas, artificialmente, por ‘marinheiros-suicidas’ disfarçados de bóias-salvadoras. Não basta levar com o ‘mau tempo’ e com as investidas dos adversários, que querem legitimamente dominar as águas territoriais, mas também com uma incrível (auto) propensão para a sabotagem e para os actos de pirataria. As velas nos mastros estão rasgadas, há buracos no casco, água e ratos a rodos no porão, mas o barco, contra ventos e marés, lá resiste, numa trajectória errática mas ainda assim heróica e valente.
É nestas ‘condições mãoteorológicas’ (o mau tempo associado à má mão dos que tudo fazem para a embarcação submergir) e condicionados por elas – ninguém resiste a permanentes actos de sabotagem – que é preciso olhar para a responsabilidade da actual direcção e para a gestão desportiva.
Formou-se um vórtice nas águas revoltosas do oceano leonino, que tudo contamina e puxa para o fundo. No Sporting, por isso, tudo atinge uma dimensão facilmente catastrófica. Tudo começa na dificuldade em unir. E, na equipa, tudo o que é bom parece menos bom; tudo o que é razoável passa a medíocre e tudo o que é mau transforma-se em péssimo. Parece uma maldição.
A eliminação do Sporting da Taça de Portugal, caindo aos pés do Alverca, que fez um jogo competente e maduro, é ‘vergonhosa’ mas nem sequer já cabe, neste contexto, no âmbito das ‘grandes surpresas’. Parece que nada resulta, mesmo quando – aqui e ali – se faz um esforço mínimo para resultar.
Jorge Silas, o capitão (não encartado) da embarcação, está numa posição difícil (como já estavam Keizer e Pontes), mas pelas suas palavras parece querer fazer o seu trabalho, com honestidade, pois claro, e dentro daquilo que são os seus conceitos e ideias no plano técnico-táctico, dentro de uma redoma que não faz qualquer sentido. O treinador do Sporting tem de olhar à volta e não pode dissociar-se da realidade. O terreno está minado e é nas actuais condições de ‘pressão e temperatura’ que o treinador tem de agir. Encarar o jogo de Alverca accionando um plano de rotatividade incompatível com o plano de emergência em que caiu o Sporting não faz o menor sentido. Mesmo considerando as ausências e o envolvimento de alguns jogadores nos trabalhos das respectivas selecções nacionais, o Sporting não tem um plantel em quantidade/qualidade capaz de resistir a alterações de fundo. Viu-se isso em Alverca.
O Sporting sofre de um problema global de confiança. Ninguém é capaz de pegar na palavra para unir. Frederico Varandas está na cabeça do touro sem ajudas. Desgasta-se, e sempre que fala, acossado por todos os lados, não consegue ser assertivo. Há gente, na estrutura, certamente bem-intencionada, mas não está a ajudar o presidente. E ainda é preciso perceber se, em matéria de aconselhamento no apetrechamento do plantel, Frederico Varandas não foi traído. O plantel é desequilibrado e parece uma casa de recuperação de dói-dóis. Até dói.