Benfica, entre a estratégia e a identidade
Por alguma razão se diz que os números falam por si. Pois os de Bruno Lage no Benfica não deixam margem para dúvidas: com a 13.ª vitória consecutiva em jogos fora para o campeonato, Lage bateu mais um recorde. É o técnico a alcançar mais depressa 25 vitórias (em 27 jogos) na principal competição como treinador do Glorioso – ultrapassando os números de Fernando Riera, que duravam desde 1966/67, quando o chileno precisou de 28 jogos para atingir o mesmo registo. Se dúvidas houvesse sobre o que caracteriza o Benfica de Lage a resposta é fácil: ganhar. Foi assim a temporada passada com uma conquista impensável e as condições para que a história se repita esta época continuam todas presentes. Mas, com o passar do tempo, a identidade do técnico do Benfica vai-se tornando também mais conhecida.
As conferências de
imprensa de Lage são, aliás, um bom observatório da forma como o treinador do Benfica pensa o jogo da equipa. Há, a este propósito, uma declaração lapidar, proferida no rescaldo do jogo com o Lyon: “Em função do adversário, mudamos a estratégia e temos acertado mais vezes do que falhado e não vamos mudar porque foi assim que chegámos aqui.”
É óbvio que há sempre uma componente estratégica
na forma como os treinadores abordam os jogos, mas com Lage fica-se com a sensação de que a estratégia desempenha mesmo um papel fulcral (veja-se as alterações radicais no onze e até em alguns princípios de jogo nas partidas europeias). O ponto é importante, pois encerra um dilema que se sente, em campo, quando vemos o Benfica a jogar.
O enfoque na estratégia nas competições europeias
é, afinal, um reconhecimento de que com a nossa identidade não temos hipóteses a um nível mais elevado. É, também, uma abordagem realista: o plantel não está dimensionado para o nível Champions e a equipa não é capaz de se impor na Europa com o futebol mais associativo e que privilegia o jogo interior, dominante nas competições domésticas. Não há como negá-lo, o fosso crescente entre a intensidade da Liga portuguesa e o que se passa nos maiores campeonatos europeus, a prazo, condena a capacidade competitiva dos clubes nacionais.
A questão, contudo, é que também no campeonato
nacional a estratégia se vem impondo à identidade da equipa. O Benfica, hoje, é um clube com um futebol menos personalizado e impositivo no ataque do que no passado. O jogo em Tondela foi, apenas, um último exemplo.
Uma parte da explicação está na onda de lesões
que, uma vez mais, assume contornos estruturais e obriga a uma explicação (por si só, os regressos da dupla Florentino/Gabriel e a recuperação de Chiquinho vão solucionar muitos dos problemas), mas com tanta variação na equipa e sem alguém capaz de ligar o jogo atacante, o Benfica pode voltar a ser uma equipa descaracterizada e a depender apenas da estratégia. Ora, o sucesso recente tornou – felizmente – os adeptos mais exigentes.
O BENFICA, HOJE, É UM CLUBE COM FUTEBOL MENOS IMPOSITIVO
NO ATAQUE