Ricardo, coração de guerreiro
SUPERLATIVO NA EUROPA, COM 7 TRIUNFOS E 1 EMPATE EM 8 JOGOS, O SC BRAGA TEM REALIZADO UM CAMPEONATO BEM AQUÉM DAS EXPECTATIVAS PARA A RIQUEZA DO PLANTEL QUE POSSUI. O TRIUNFO EM GUIMARÃES, ONDE PUDERAM EXPLORAR O MOMENTO EM QUE SÃO MAIS FORTES (O CONTRA-ATAQUE), SÓ SERÁ UM PONTO DE VIRAGEM SE A EQUIPA GANHAR VALÊNCIAS EM ATAQUE POSICIONAL E ROBUSTECER A CONSISTÊNCIA DO PROCESSO DEFENSIVO
Quando Ricardo Sá Pinto foi apontado, a 3 de julho de 2019, como novo treinador do SC Braga, após a saída tardia de Abel Ferreira – que acabara o exercício anterior enfraquecido na sequência de cinco derrotas e um empate nos últimos nove jogos – para o campeão grego PAOK, rapidamente foi traçado o vaticínio que a conexão entre o génio efervescente do presidente António Salvador e o do novo técnico dos guerreiros do Minho tinha tudo para ser explosiva e redundar num malogro. Passados quatro meses, e apesar do rendimento muito aquém das expectativas dos bracarenses no campeonato, ao posicionarem-se no extenso grupo de sextos classificados, a par de Tondela, de Boavista e de Rio Ave, já a 15 pontos do líder Benfica, Salvador mostrou argúcia ao não recorrer ao caminho mais fácil – o de dispensar o treinador –, mesmo não se coibindo de tecer críticas ao rendimento da equipa. Tal como aconteceu, há pouco mais de uma semana, após o dececionante empate caseiro ante o Famalicão, capaz de marcar dois golos na Pedreira mesmo reduzido a dez unidades desde o minuto 34.
Além da relação de grande proximidade com o plantel, bem atestada na forma entusiástica como o êxito em Guimarães foi comemorado, refinada pelo conhecimento adquirido nas passagens pela Sérvia (Estrela Vermelha), Grécia (OFI e Atromitos), Arábia Saudita (Al Fateh), Bélgica (Standard Liège) e Polónia (Legia Varsóvia), o que lhe permitiu conviver com realidades radicalmente distintas, Sá Pinto tem protagonizado um trajeto notável na Liga Europa, bem atestado numa série de sete triunfos e um empate em oito jogos, o que tem garantido o redimensionamento europeu do finalista vencido da competição em 2010/11. Algo fortemente robustecido com o admirável registo de quatro vitórias em quatro partidas extramuros – Bröndby (4-2), Spartak Moscovo (2-1), Wolverhampton (1-0) e Besiktas (2-1) – em que se viu a melhor versão de um plantel de enorme qualidade e com múltiplas soluções nas diferentes posições, e que tem correspondido com triunfos, mesmo que sem qualquer baliza virgem, na Taça de Portugal e na Taça da Liga, com a final four, que será novamente disputada em Braga, em ponto de mira.
Corrosivos sempre que metamorfoseiam o momento de transição ofensiva em contra-ataque ou ataque rápido, principalmente ante rivais que patenteiam pouca preocupação em preparar o momento da perda, os bracarenses sabem tirar partido da capacidade de aceleração e de desequilíbrio dos extremos Galeno e Ricardo Horta, corrosivos no ataque aos espaços vazios e na exploração de diagonais para o espaço anterior, mas também dos apoios frontais oferecidos pela referência ofensiva mais habitual (o móvel Paulinho) e das associações que promove com o médio mais ofensivo (Fransérgio ou André Horta). Tem sido esse o mote para o trajeto notável na Liga Europa, como também o foi na dilacerante vitória em Guimarães, que permitiu encurtar para um ponto a diferença para uma equipa que não revela qualquer prurido em assumir o jogo em qualquer campo.
As maiores arduidades dos comandados de Sá Pinto têm passado pelos jogos em que se digladiam com opositores que lhes oferecem a posse e procuram defender num bloco médio-baixo. Aí, fica clara, apesar dos esforços do treinador em produzir alterações nas saídas para ataque quando comparadas com as do seu sobrevalorizadíssimo antecessor, a pouca fluidez dos guerreiros em ataque posicional, muito pouco incisivos na exploração do espaço interior, apesar de possuírem jogadores com as características de André Horta, João Novais, Ricardo Horta ou Trincão, e a dificuldade para controlar o jogo com bola, além da dependência de uma previsível construção em u, que condena a chegada a zonas de finalização ao recurso a incessantes cruzamentos quase sempre conjeturáveis. A isso juntam-se as insuficiências do sector recuado, principalmente na zona central, quando a equipa, face à necessidade em assumir o jogo, tem de defender mais alto. As lesões de longa duração de Raúl Silva, de Vítor Tormena e de Lucas agudizaram o problema, mas o rendimento pouco estável de Bruno Viana e os erros frequentes de Pablo Santos e Wallace não ajudam a solucionar um problema que conduz a que o SC Braga, após o primeiro terço do campeonato, tenha mais golos sofridos do que marcados.
ANTÓNIO SALVADOR MOSTROU ARGÚCIA AO NÃO RECORRER À DISPENSA DO TREINADOR