Record (Portugal)

Futebol no sofá

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Ir aos estádios de futebol era uma prática antiga no nosso País. O estádios não tinham as condições de hoje, havia bancadas de gélidas pedras e lugares de pé no peão. As bancadas cobertas limitavam-se a uma qualquer Central A.

Investimos milhões, modernizám­os os nossos ‘palcos’ de futebol, tornámo-los confortáve­is, com o propósito de ter estádios cada vez mais cheios e esgotados aos fins de semana. Milhões de euros depois, percebemos que nos enganaram a todos. A culpa, em grande parte, é de quem aprova o calendário dos jogos para fazer o jeito às televisões.

Entre 16 de dezembro e 5 de janeiro, o meu clube, o FC Porto, esteve 20 dias seguidos sem jogar para a 1.ª Liga. Tenho a certeza de que se nesse período tivéssemos três jornadas para jogar (tal como se faz em Inglaterra), os estádios enchiam, as famílias marcavam presença em força, aproveitan­do as férias de Natal de muitos, as férias escolares das nossas crianças e a vinda dos emigrantes ao País.

Não contentes com isto, teremos já amanhã e a uma sexta-feira, dois jogos grandes; o FC Porto-Sp. Braga, às 19 horas, e o Sporting-Benfica, às 21h15. É perfeito para quem não trabalha. A meio da semana brindaram-nos com uns quartos-de-final da Taça de Portugal, a serem jogados no Dragão, às convenient­es 18 horas de quarta-feira, com uma enchente de 13 mil espectador­es...

Quantas mais linhas terei de escrever para que os responsáve­is do nosso futebol percebam que estão a mandar as pessoas para os sofás? Em breve seremos como a família Simpson, onde os desenhos animados de tom amarelo grudam-se e acotovelam-se no sofá para ‘deglutirem’ os programas de televisão. Os estádios esvaziam-se em detrimento de uma casa cheia.

Perdemos assim a oportunida­de de ver ao vivo 50 tochas serem arremessad­as para dentro dos campos (V. Guimarães-Benfica), de ouvir os petardos (dos) idiotas, de observar os adeptos em caixas de segurança (como se numa jaula estivessem), de testemunha­r a desfaçatez dos árbitros que em campo constroem resultados com a sua incompetên­cia crónica e ‘hereditári­a’ e de ainda pagar um balúrdio para este sarau cultural.

Depois de tudo isto, quando conseguire­m reduzir a presença dos adeptos a poucas centenas, pagando a uns quantos reformados para baterem palmas como nos programas do Goucha, podem demolir as bancadas e deixar os relvados. As televisões não precisam de mais.

Que saudades eu tenho, da mão do meu Tio e do meu Avô, que me conduziam aos estádios deste País, e que me davam para a outra o tão esperado saco de pevides salgadas.

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