Record (Portugal)

A verdade desportiva

- Nuno Encarnação Gestor

Está sinalizada a intenção da conclusão do campeonato para o início de junho. Mas, até lá, muitas das dúvidas que pairam no ar devem ficar decididas e sobretudo escritas. Há uma coisa que tenho como certa: esta competição é a única que se vai tentar reiniciar em Portugal pela simples razão de que os clubes precisam do dinheiro das transmissõ­es televisiva­s como do pão para a boca.

A Federação ou a Liga não têm a disponibil­idade financeira para acudir a esta competição como o fizeram com a 2.ª Liga. Percebo, financeira­mente, a justificaç­ão de um recomeço, mas do ponto de vista da saúde dos atletas, acho, à data de hoje, um disparate sem fim.

Todos conhecemos os males deste vírus, não sabemos como o travar de forma eficaz, a não ser a reclusão de cada indivíduo. Não há vacina nem fármaco que o detenha e tão-pouco sabemos nos já infetados e ditos curados, que consequênc­ias físicas terão no futuro.

Se a nós e aos nossos filhos nos pedem para não contactar com os nossos pais e avós, a estes atletas dizem-lhes exatamente o contrário. Vão para a primeira linha da frente deste combate, sem máscaras, sem qualquer proteção. Façam carrinhos, encostem-se no adversário, cabeceiem a mesma bola disponível para os 22 atletas em campo, que Deus é grande.

Eu sou crente, mas tudo isto é ridículo. As operadoras não pagam (legitimame­nte) o espetáculo sem este se jogar. Os confinados como nós, protegidos nos sofás de cada uma das nossas casas, teremos de volta o futebol para o nosso próprio entretenim­ento. França, Holanda e Bélgica foram mais verdadeiro­s e determinar­am o fim dos seus campeonato­s, como forma de proteger os milhares de jovens atletas das suas ligas. Nós não.

Imaginem agora que o número de casos positivos aumenta dos atuais 10 (até agora detetados) e que isso afetará algumas equipas. Imagine-se que uma equipa ficaria privada dos seus melhores goleadores ou defesas, por os mesmos estarem infetados.

Perante isto, haverá alguma verdade desportiva nas restantes 10 jornadas? Não, de todo. Este vírus não é uma gripe ou uma lesão de jogo de um atleta. É um motivo excecional que nos levou a mudar de vida. As 24 jornadas jogadas até agora foram jogadas em igualdade de circunstân­cias. As que se seguem, tenho a certeza que o não vão ser.

E, não, dr. Rui Gomes da Silva, o Porto não quer ganhar o campeonato na secretaria, mas não quer perder o seu primeiro lugar na enfermaria. O futebol deve ter verdade desportiva, mas levar a verdade na desportiva é fazer mal a este desporto.

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