SÉRGIO ENCHE O PAPO
Em noite de São João, o FC Porto festejou a liderança isolada. Fome de golos saciada com sardinhada... e um inesperado toque de ketchup
“Será uma luta até final“
Dificilmente os adeptos do FC Porto conseguiriam imaginar, até pelas limitações que todos conhecemos hoje em dia, um São João melhor passado do que este. Sem direito ao tradicional arraial, a Invicta viveu ontem o seu sempre emocionante dérbi, na ótica dos dragões uma autêntica festa, por ter significado a tão ansiada liderança isolada no campeonato. Um cenário pouco esperado – e por isso mais saboroso – à entrada para esta jornada, mas que começou a ganhar contornos reais poucos minutos antes do arranque da partida, por altura da consumada derrota do Benfica na receção ao Santa Clara. O balão azul e branco, com a paciência certa, encheu bem e subiu ao topo da Liga NOS... A exibição portista até não foi de gala, mas teve tudo aquilo de que o povo gosta e faltou aos dragões nas últimas jornadas: golos. Os tão necessários golos, condimento principal do futebol, surgiram com fartura, muito por culpa de Marega. Bloqueado nas últimas seis jornadas, o maliano abriu o frasco do ketchup tornado célebre por Cristiano Ronaldo... A acompanhar uma sardinhada de São João? Bem, nunca uma conjugação tão inusitada terá sabido tão bem aos portistas...
O Boavista, é bom dizer-se, não foi um mero figurante no dérbi da cidade. É facto que nunca esteve perto da vitória, mas amealhar um pontinho seria sempre um bom resultado, tanto mais provável quanto a igualdade se prolongasse no marcador. O embargo foi quebrado e, com isso, a estratégia axadrezada desmoronou-se.
A ideia ficou evidente na forma como Daniel Ramos montou a sua equipa num 5x2x3 sobrepovoado no terço defensivo, procurando aguentar o ímpeto do
FC Porto até ser momento de colocar a cabeça de fora. Do lado dos dragões, a nota estratégica mais interessante passou pela colocação de Corona no corredor central atrás de Soares – Marega partia da direita para dentro –, posição na qual o mexicano seria fulcral. Sem surpresa, os azuis e brancos assumiram as despesas desde o apito inicial, impondo-se em toda a linha nos primeiros 25 minutos, com direito a duas ocasiões desperdiçadas na sequência de bolas paradas. Para se ter uma ideia da diferença de volume de jogo, por esta altura o FC Porto tinha 75 por cento de posse de bola e Marchesín apareceu pela primeira vez apenas à pas
sagem dos 21 minutos... A primeira parte fecharia com mais uma oportunidade falhada, no caso num remate cruzado de Corona que passou muito perto do poste.
Ao intervalo, Conceição ganhou o jogo, essencialmente através da entrada de Uribe. Com o colombiano no meio, Otávio encostado à direita apoiado por Manafá e Corona entre o eixo e a esquerda, o FC Porto ganhou maior capacidade de pressão e mais apoios próximos no jogo interior. E foi precisamente pelo meio que desenharam a melhor jogada da partida, que terminou com um passe de morte de Corona para Marega reabrir a sua faturação pessoal. Logo a partir daí, acentuou-se uma das certezas que este futebol em contexto pandémico tornou ainda mais evidente: muito do que se joga, quase tudo o que sai dos pés de cada jogador... está na sua cabeça. Com o marcador desbloqueado, os dragões pareciam outros. Toque de bola, envolvência ofensiva, enfim, qualidade de jogo. Os penáltis que permitiram o avolumar do resultado surgiram com naturalidade, assim como o 4-0 final.
Ao apito final, o jogo bem se podia resumir numa quadra à moda da Invicta. Na noite de São João, o dragão encheu a ‘pança’, fez a festa que queria, sozinho na liderança.*