O novo feiticeiro
RÚBEN AMORIM ESTÁ A CUMPRIR A MISSÃO DE RESGATAR AS ESPERANÇAS LEONINAS. PARA ISSO, CONVÉM MANTER A ENERGIA DAS VITÓRIAS, O DISCURSO LÚCIDO, CATIVANTE E EMPÁTICO (QUE TANTA FALTA TEM FEITO AO CLUBE) E OPÇÕES COERENTES E CRITERIOSAS
DE LEÃO AO PEITO, RÚBEN HERDOU AS QUALIDADES APONTADAS A BRUNO LAGE EM 2019
Lembram-se do arranque fulgurante do homem que foi apresentado para treinador do mandato, Marcel Keizer? Estão recordados dos primeiros jogos e discursos de Silas que tão bem soaram junto dos sportinguistas? Eu sei que a memória é curta, mas ambos tiveram entradas de leão e saídas de sendeiro. Rúben Amorim (RA) é melhor treinador do que os antecessores, porém, chegou com o peso de um cheque de marajá passado (ainda não pago) a António Salvador. Contudo, de leão ao peito, RA tornou-se o novo feiticeiro, herdando todas as qualidades que a crítica apontava a Bruno Lage em 2019. Soma vitórias, encanta adeptos (rivais também) e crítica, e semeia pérolas que podem valorizar a aposta do
Sporting nos seus serviços. Sem esquecer que, desde que abandonou o Sp. Braga, ali caiu o dilúvio que já levou na enxur- rada um Custódio que nunca lhe chegará aos calcanhares.
E, mais importante, o seu perfume trouxe uma calmaria a um clube dividido e que voltou a sorrir. Na sequela da série ‘The Young Pope’, ‘The New Pope’, criada pelo genial Paolo Sorren- tino, surge a seguinte frase aquando do momento da escolha do líder do Vaticano: “O carisma para fazer as pessoas esquecerem o passado recente e o equilíbrio moral para acabar com a turbulência actual”, e isto aplica-se como uma luva ao momento de RA.
Vítor Oliveira disse que este
plantel é curto para a luta do tí- tulo na próxima época. Talvez seja, no entanto, a valorização de Quaresma, Nuno Mendes, Joelson, Plata, Jovane, Camacho, Matheus Nunes, Gonçalo Inácio e Tiago Tomás promete encher os depauperados cofres de Alvalade e isso será mérito do jovem técnico que aposta consistentemente neles e aqui tenho de deixar uma palavra – pois já fui duro com ele no passado – a Hugo Viana, que bateu sempre o pé para que
RA fosse a escolha de Varandas, que hoje só pode reconhecer com humildade que as apostas em Bolasie, Jesé, Rosier, Eduardo e o outro rapaz que veio da Ucrânia cá passear, foram péssimas opções de gestão desportiva.
RA está a cumprir a missão de resgatar as esperanças leoninas, criando a ideia de que o amanhã será melhor. Para isso, convém manter a energia das vitórias, o discurso lúcido, cativante e empático (que tanta falta tem feito ao clube) e opções coerentes e criteriosas. E deixo um conselho: cuidado com as expectativas. Ser ambicioso, sem soberba. Ser confiante sem bazófia, um equilíbrio só ao alcance dos melhores bailarinos. A racionalidade que mostrou ao comentar a saída de Lage, “um dia é ele, amanhã sou eu”, prova que conhece a história de que quando os generais romanos regressavam com triunfos a Roma, tinham sempre um escravo que lhes segredava ao ouvido: “lembra-te que és mortal”, enquanto a multidão os aclamava. Essa multidão também um dia aclamou Keizer e Silas.
PS: quando escrevi em Record que sou contra a perda da maioria da SAD no Sporting, dei como exemplo o caso do Valencia. Basta ler as declarações da filha de Peter Lim, accionista maioritário do clube, para perceber a revolta dos adeptos. Ninguém quer filmes daqueles em Alvalade.