Record (Portugal)

Saudades de Carlos Gomes

- Rui Dias

çAtendo o telefone e ouço uma voz firme: “Estou a falar com o melhor jornalista do Mundo?” Fico em silêncio, surpreendi­do. Do outro lado da linha vem uma achega: “Só o melhor jornalista do Mundo para falar com o melhor guarda-redes da história do futebol”. “Sabe quem fala?”, perguntou num tom mais agradável e bem-disposto. Respondi que sim: “É o senhor Carlos Gomes.”

O mito eterno das balizas dos anos 50 respondia assim a um contacto feito semanas antes. Deixei o meu número a umas tias que ele tinha no Barreiro e esperava sem grande esperança que devolvesse a chamada. Mas ali estava, desde Viena, entusiasma­do pelo súbito interesse de um jornalista português. Foi o início de uma amizade sincera, regada por um texto que escrevi sobre ele, e que o acompanhou na reta final da vida. Carlos Gomes era um homem especial, intuitivo, desassombr­ado, inteligent­e, nem sempre lúcido, mas que, no essencial, sabia o lugar que ocupava na história do Sporting

e do futebol português. Estive em sua casa na Áustria e visitei-o no Barreiro. Em agosto de 2005 telefonou-me: “Vais de férias agora? Se puderes, passa por aqui”. Passei. No fim, despediu-se: “Quando voltares, já cá não estou”. Sorri, abracei-o e disse-lhe para ter juízo. Morreu em outubro, aos 73 anos, cumprindo o que me disse: “Não me vou matar mas vou desistir de viver.” Enorme Carlos, as saudades que tenho de si.

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