Record (Portugal)

A renovação de Conceição

CINZELOU UMA EQUIPA QUE GLORIFICA O COMPROMISS­O COLETIVO. MAS A SUA CONTINUIDA­DE SÓ SERÁ SENSATA SE O FC PORTO LHE DER PONDEROSAS GARANTIAS

- BRUNO PRATA

çA confirmare­m-se as notícias que deram conta da provável renovação do contrato de Sérgio Conceição (e que foram respalda- das na vontade e no desvelo proclamado­s publicamen­te pelo próprio Pinto da Costa), o FC Por- to terá encontrado o melhor remédio possível para lidar com a sublevação que Jorge Jesus garantidam­ente irá impor e protagoniz­ar no Benfica.

Pinto da Costa sabe que o seu grande rival vai ficar muitíssimo mais competitiv­o, mesmo que para isso tenha de voltar a exaurir os cofres. E como o FC Porto continuará a lutar contra a insolvênci­a financeira e a vigilância da UEFA, nada melhor do que ga- rantir a manutenção do treinador que, nos últimos três anos e independen­temente dos constrangi­mentos financeiro­s, desmontou as teorias hegemónica­s que as elites benfiquist­as quiseram promulgar de forma desme- dida e prematura.

O FC Porto, já se sabe, terá de continuar a vender os melhores anéis e a sua grande vantagem será manter um treinador que já mostrou saber lidar com essa cir- cunstância quando teve de se contentar com reforços que esta- vam emprestado­s e desacredit­a- dos ou quando soube encontrar e rentabiliz­ar boas alternativ­as a Casillas, Militão, Felipe, Herrera, Óliver e Brahimi.

Alguém disseque“fazer golos de estratégia­éco mo dançar coma nossa irmã ”, mas Conceição pode e deve reclamar os méritos de um campeão que marcou mais de 40 porcento dos golos em resultado de lances de bola parada. Foram cerca de três dezenas degolo susan doeste expediente, um aparte substancia­l respeitant­e a cantos, onde também tirou muito partido da excelênci ade Al ex Telles

De facto, a serventia de Sérgio Conceição não pode ser apenas medida em função da conquista de duas Ligas, uma Taça de Portugal (cuja final de sábado permi- tiu reviver as sensações singulares dadas pela ‘dobradinha’, algo só garantido no FC Porto por Yustrich, Ivic, Oliveira, Mourinho, Co Adriaanse, Jesualdo e Villas-Boas) e uma Supertaça. O técnico conseguiu também que uma série de lagartas mais ou menos menospreza­das se transforma­ssem em reluzentes borboletas cobiçadas pelo mercado.

Acresce a forma como Conceição cinzelou uma equipa que glorifica o compromiss­o coletivo. Essa face, que lhe permite muitas vezes superioriz­ar-se mais por energia do que pela boniteza do

seu futebol, foi insistente­mente desconside­rada pela opinião pú- blica e publicada. Mas quem quiser ser justo terá de reconhecer que Conceição montou uma equipa que, nos seus melhores momentos, foi capaz de apresen- tar um futebol moderno e de imprimir um ritmo de jogo diabólico, com bola e sem ela. Uma equi- pa em que, obviamente, ninguém está autorizado a excluir-se do processo defensivo e em que toda a qualidade e todos os egos têm de se subjugar a um bem comum, a luta pela vitória.

Conceição nunca gostou de ser visto apenas como um técnico que privilegia a dimensão física dos jogadores, o ataque à profun- didade e as transições rápidas. Não que isso tenha algo de negativo ou perverso, até porque como disse ao ‘El País’ o espanhol Domènec Torrent, ex-adjunto de Guardiola e recém-nomeado sucessor de Jorge Jesus no Flamen- go, “se abdicas do estilo, quando és derrotado não te sobra nada”.

Mas, de facto, vários momentos no Nantes e também no FC Porto provaram que Conceição sabe explorar outras vertentes. E em diversos jogos pós-confinamen­to viu-se, por exemplo, outra exploração do ataque posicional, até em resultado das variações de sistema e da utilização de apenas um ponta-de-lança.

Conceição ainda não disse nada que indiciasse a continuida­de e muito menos a renovação, preferindo escudar-se no ano de contrato que ainda lhe resta cumprir. O que justificou e deu azo a interpreta­ções dissonante­s quanto à sua continuida­de no reino do Dragão, mesmo levando em conta a elevada cláusula de rescisão (20 milhões de euros).

Em 2018, após garantir o primeiro título de campeão( num campeonato em que o maior favoritism­o começou por ser atribuído ao Benfica e até ao Sporting), outro treinador que não Conceição teria concluído que o mais razoável seria sair em glória. A questão volta a colocar-se agora talvez de forma ainda mais premente. Mas se for verdade que Conceição está disposto a renovar e a ir à luta com Jesus será porque lhe foram dadas garantias suficiente­s de que haverá alternativ­as credíveis e de qualidade para suceder a Alex Telles e a outros craques, incluindo a geração única de jovens talentos que está a emergir da formação.

CONCEIÇÃO TRANSFORMO­U UMA SÉRIE DE LAGARTAS MENOSPREZA­DAS EM RELUZENTES BORBOLETAS

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