“QUE A NOVA ÉPOCA SEJA MAIS TRANQUILA”
DAVID BELENGUER
O espanhol assumiu a presidência da SAD em novembro de 2018 e já sabe bem o que é sofrer para permanecer na Liga. Aborda as contas saudáveis e o projeto, em entrevista concedida dias antes da saída de Natxo González
Como viveu esta fase final do campeonato, onde o Tondela só selou a permanência no fim?
DAVID BELENGUER – O final desta temporada foi muito estranho. Depois de ter acabado a primeira volta, pensámos que teríamos um ano muito mais tranquilo, que conseguiríamos o objetivo com muito tempo de antecedência, o que permitiria começar a planificar o ano seguinte. O que aconteceu nos últimos meses foi novidade para todos e um exemplo da capacidade de adaptação a situações estranhas. Mas senti uma alegria tremenda quando o objetivo foi conseguido.
Houve algum milagre, como noutros anos?
DB – O Tondela tem algo de romântico. Faço a comparação que o Tondela é como a Gália, dos romanos. A luta de uma cidade interior, um povo que não está na costa mas que luta com os grandes. Falar de milagre é normal, mas eu, como gestor, prefiro falar de objetivos cumpridos, porque atrás de cada permanência há muito trabalho, muitos erros mas também muitas boas decisões. Atrás disto não há só milagres, há pessoas que trabalham muito para isto acontecer.
Qual será o próximo passo em frente do Tondela?
DB – Nunca vou hipotecar o futuro do Tondela com as minhas decisões. Hoje, a questão económica no futebol é uma incógnita. Não sabemos a totalidade das receitas que vamos ter... Como gestor, não faria bem o meu trabalho se hipotecasse o futuro do Tondela. Somos muito humildes e honrados, jamais tivemos uma falha nos pagamentos. Fomos dos poucos clubes que conseguiram evitar o lay-off simplificado e isso é graças à saúde financeira. É fazer bem as coisas, não gastar um euro a mais do que entra. É a minha filosofia e a forma como o Gilberto Coimbra geriu o clube estes anos todos. Ninguém pode dizer que o Tondela lhe deve dinheiro. Sempre cumpriu com as suas obrigações.
Será demasiado pensar num feito semelhante ao do Granada, também gerido pelo Grupo Hope, e que vai à Liga Europa?
DB – Demasiado? Não. Se o futebol tem uma coisa, é que tudo é possível. Há uma série de limitações, e quanto mais diferenças há nos encaixes, mais limitações existem. Em Portugal as verbas televisivas são limitadas, há uma diferença de 1 para 20 comparando com os três grandes. Em Espanha é de 1 para 2 ou 3. É muita diferença. Se pode acontecer? Pode, mas é muito mais difícil.
Vai haver mais investimento por parte do grupo Hope?
DB – A Hope quer gestão responsável. Nós tentamos maximizar até ao limite cada receita que recebemos. Queríamos estabilizar o Tondela, para ter capacidade de crescimento a partir de uma base forte, e isso já se conseguiu este ano. Precisamente por isso, pudemos evitar o lay-off. Gerimos a situação sem prejuízo para os jogadores e funcionários. Depois da base forte e cimentada, é quando é possível aumentar o investimento para crescer, como a nível da cidade desportiva, da formação ou de aquisição de algum jogador. O clube está saudável, esperemos que esse passo seguinte chegue em breve, se não houver outro arrombo ou crise sanitária.
Lamenta a saída a custo zero de Cláudio Ramos?
DB – Não. Estou muito feliz por ele.
A decisão que tomou é que o momento de estar no Tondela tinha acabado, tinha ambição de viver novas experiências. Não era uma questão económica, mas sim novos objetivos, novas metas. Não apenas lutar pela permanência. O Cláudio vai estar para sempre na história do Tondela, é dos jogadores mais importantes que alguma vez passaram pelo clube e talvez volte um dia. As portas estarão sempre abertas. Foi uma relação muito proveitosa e estamos orgulhosos de que ele dê um salto importante na carreira.
Se se confirmar a ida para o FC Porto, terá capacidade?
DB – Eu não sei. Há rumores, sei que tinha ofertas de vários sítios.
Acho que, pela qualidade e tranquilidade que transmite aos colegas, tem capacidade para ser guarda-redes de um clube importante como o FC Porto ou outro. Tem uma personalidade que lhe permite ser parte de plantéis importantes. Desejo-lhe toda a sorte.
Haverá uma aposta firme no Babacar Niasse?
DB – É um guarda-redes de grande
“CLÁUDIO RAMOS TEM CAPACIDADE PARA UM CLUBE IMPORTANTE COMO O FC PORTO. ESTAMOS ORGULHOSOS DELE”
“FOMOS DOS POUCOS CLUBES QUE EVITARAM O LAY-OFF. É FAZER BEM AS COISAS, NÃO GASTAR UM EURO A MAIS DO QUE SE GANHA”
futuro e estamos muito tranquilos com a substituição do Cláudio. Contrataremos outro guardião, mas creio que Babacar ganhou a confiança do clube com as suas atuações na reta final e sabemos que pode perfeitamente ser o guarda-redes titular do Tondela. Confio muito nele e estou certo que pode ser uma das grandes sensações da Liga na próxima época.
Moufi, Pité e Valente vão renovar ou não há hipótese?
DB – O treinador e o diretor desportivo é que têm de decidir essas questões. Eu como gestor, e apesar de ter a minha opinião, tento não me meter nas decisões desportivas. Quando me pedem, digo que lhes vamos baixar o ordenado. Eles recebem para tomar decisões e dar opinião sobre as questões desportivas. Sei que não é o habitual, o normal é todos opinarem. Mas para poder exigir resultados e rendimento às pessoas, tenho de dar-lhes responsabilidades e capacidade de decisão. Essa é uma decisão deles.
Pepelu, Richard e Ronan estiveram emprestados. Poderão voltar?
DB – Há contactos com os seus clubes e agentes para ver em que condições poderão voltar ao Tondela. Todos esses têm essa hipótese, mas não se sabe o futuro. Fizeram boas épocas e há gente a acompanhá-los. Mas é possível voltarmos a vê-los na próxima época.
Quanto rendeu a transferência de Philipe Sampaio para o Guingamp?
DB – Não vou dizer. Era um dever nosso facilitar, também, a situação, pois era um sonho dele jogar em França. Alguns podiam suspeitar que, depois da transferência, ele poderia levantar o pé do acelerador no Tondela, mas demonstrou profissionalismo e compromisso, deu tudo pelo Tondela e há que agradecer-lhe por isso.
Há mais vendas na forja?
DB – Há contactos por jogadores que despertaram interesse de clubes portugueses e europeus.
E o Tondela precisa de vender para manter a estabilidade das contas?
DB – Não é necessário, graças a Deus. Pelo que já expliquei.
E reforços? Pode adiantar-nos algum?
DB – Ainda não, é cedo. Há que manter a tensão nos jornalistas. Fazem pouco caso do Tondela durante todo o ano. Agora que geramos notícias, gostamos de deixar as pessoas à espera... [risos]
DB – A verdade é que nunca penso nisso. Estou muito feliz, levanto-me e deito-me a pensar no que fazer no Tondela. Queremos continuar a crescer, ter mais adeptos no estádio, mais gente identificada com o clube. Vamos dar sequência ao trabalho e ver onde podemos chegar. Estou 100% concentrado no projeto, pensando já em conseguir ficar mais uma temporada na 1ª Liga.
De preferência sem sofrer tanto e sem esperar pelo último jogo, se calhar...
DB – Sim! Para poder ter férias, pelo menos... [risos] Espero que a nova época seja muito mais tranquila. Quando temos menos recursos económicos, quanto antes conseguirmos os objetivos desportivos, melhor, pois mais coisas poderemos adiantar na preparação da época seguinte. Está no Tondela desde novembro de 2018. Até quando pretende ficar por cá?