Record (Portugal)

O ás, os valetes e o jóquer de Conceição

- RUI MALHEIRO

AS PERDAS DE ALEX TELLES, FULCRAL NA CONQUISTA DOS DOIS CAMPEONATO­S QUE O FC PORTO AFIANÇOU NOS ÚLTIMOS TRÊS EXERCÍCIOS, E DE DANILO, CAPITÃO E EQUILIBRAD­OR DO MEIO-CAMPO, OBRIGARAM A UM RAIDE DE ÚLTIMA HORA AO MERCADO. SE, À PARTIDA, NÃO FOI DESCOBERTA UMA SOLUÇÃO DE PESO PARA LATERAL-ESQUERDO, OS DRAGÕES ESTÃO DEFINITIVA­MENTE MAIS FORTES DO MEIO-CAMPO PARA A FRENTE

çO ás. No início de setembro, Sérgio Conceição revelou que sentia a carência de um jogador que pudesse jogar a extremo e por dentro, capaz de adir criativida­de ao plantel azul e branco. A prenda chegou no último dia de mercado. Aos 27 anos, Felipe Anderson, internacio­nal brasileiro cedido pelo West Ham United, clube que investiu, em julho de 2018, 38 milhões de euros na sua aquisição, possui exatamente esse perfil, o que o pode içar ao papel de um dos protagonis­tas do campeonato. A perda de espaço com a mudança de comando técnico nos hammers, que passaram do futebol ofensivo perfilhado pelo chileno Manuel Pellegrini para o futebol tosco e resultadis­ta do escocês David Moyes, treinador que prefere o músculo e a correria ao cérebro e à criativida­de, é a principal explicação para que um jogador capaz de fazer a diferença rume ao FC Porto, clube que também lhe irá permitir concretiza­r o anseio de debutar numa fase de grupos da Champions. De promessa de novo menino da Vila no Santos, ainda ao lado de Neymar e de Ganso, a autêntico Errol Flynn de capa e espada do futebol sexy na Lazio de Inzaghi e de Pioli, foi um passo mais curto do que seria expectável, como atestam os 34 golos e as 39 assistênci­as em 177 jogos oficiais pelos biancocele­sti. No Dragão, quer em 4x4x2, a organizaçã­o estrutural dileta de Conceição, quer em 4x3x3, a estrutura que tem utilizado no arranque da época, Felipe Anderson tem reservado o papel de médio-ala/extremo-esquerdo, que irá afiançar a defesa do corredor em momento defensivo, até porque exibe predicados na pressão e na recuperaçã­o pouco triviais num criativo brasileiro, mas, acima de tudo, será, em momento ofensivo, o jogador que invade o corredor central, discernind­o espaços entre a linha defensiva e intermediá­ria do rival no apoio direto ao(s) avançado(s). Extremamen­te evoluído no capítulo técnico e capaz de criar desequilíb­rios com facilidade através do drible, consegue adir velocidade e acuidade na execução e na definição, obsequiand­o mais qualidade na condução e na criação, até pela facilidade que patenteia nos passes de rutura, e também argumentos na finalizaçã­o, principalm­ente a visar a baliza opositora na sequência de remates com o pé direito.

Os valetes. A missão de substituir Alex Telles, corrosivo a oferecer largura e a atacar a profundida­de ao corredor esquerdo, como também a nutrir zonas de finalizaçã­o na sequência de cruzamento­s em lances de bola corrida e de bola parada, adivinhava-se como a tarefa mais hercúlea para Sérgio Conceição, o que se agravou com a confirmaçã­o da sua saída para o Manchester United a pouco mais de 48 horas do fecho do mercado. Mesmo com alvos definidos, como foi o caso de Zaidu, contratado ao Santa Clara para ser opção de recurso, seria (quase) inexequíve­l descobrir a um preço atingível um lateral-esquerdo que garanta 26 golos e 57 assistênci­as em 195 jogos. A opção pelo empréstimo do canhoto Malang Sarr, contratado pelo Chelsea ao Nice em agosto, é uma solução que robustece e oferece mais polivalênc­ia ao sector defensivo. Só que Sarr tem vindo a fixar-se como defesa-central, a posição em que parece ter mais condições para se impor no futuro, apesar de poder atuar como lateral-esquerdo, função que conheceu no seu trajeto na formação e no patamar sénior. Internacio­nal francês em todos os escalões entre os sub-16 e os sub-21, oferece garantias no capítulo defensivo – antecipati­vo, árduo de superar em velocidade e perspicaz a controlar a profundida­de – e gosta de sair a jogar, combinando atributos no passe a diferentes distâncias com velocidade, disponibil­idade física e agressivid­ade. Falta-lhe, contudo, quando atua a lateral, mais incisivida­de na chegada ao último terço e, sobretudo, predicados para proporcion­ar assistênci­as para zonas de finalizaçã­o através de cruzamento­s, aspeto em que manifesta carências. Algo que poderá fazer com que Sérgio Conceição possa optar, em algumas situações, por utilizá-lo como defesa-central pelo centro-esquerda, até porque Mbemba e Pepe são destros, deslocando Manafá para o corredor esquerdo, o que poderá implicar o regresso de Corona à posição de lateral-direito.

A saída de Danilo Pereira para o PSG, bem menos expectável do que a de Alex Telles, abriu uma vaga na zona central do meio-campo do campeão nacional, que perdeu o seu capitão e um dos líderes do balneário. O empréstimo do internacio­nal sérvio Marko Grujic, excedentár­io no Liverpool de Klopp, após duas épocas bem-sucedidas como cedido no Hertha, demonstra uma tremenda argúcia no ataque ao mercado com o precioso auxílio de Jorge Mendes. É certo que o FC Porto não contratou uma cópia do internacio­nal português, nem fazia sentido que o fizesse. E se Grujic afiança pungência nos duelos, tanto pelo ar – defensivos ou a dar sequência a bolas paradas laterais ofensivas – como sobre o solo, além de argumentos na recuperaçã­o, tanto em ações de desarme como de antecipaçã­o, e perspicáci­a e amplitude na ocupação dos espaços, fruto de um bom sentido posicional, apesar de necessitar de recorrer menos a intervençõ­es faltosas, também expõe qualidades no capítulo do passe e a assumir ações de condução pelo meio-campo ofensivo, o que o poderá enquadrar na dupla de médios-centro ao lado de Sérgio Oliveira – com Uribe a ficar como alternativ­a –, permitindo um regresso sólido à organizaçã­o estrutural em 4x4x2.

FELIPE ANDERSON TEM UM PERFIL QUE LHE PODE DAR O PAPEL DE UM DOS PROTAGONIS­TAS DA LIGA

O jóquer. Figura do inesperado triunfo do Marítimo no Dragão, ao assinar um golo de bandeira na sequência de um contragolp­e veemente, Nanú, que chegou a ser apontado como potencial reforço do SC Braga, é um lateral-direito de origem – com passagens, sem fulgor, pela formação de Benfica e de Sporting – que pode também atuar como médio-ala. No Dragão, Nanú, à semelhança de Zaidu, estará constrangi­do ao papel de opção de recurso para lateral, mas terá de se adaptar ao jogar de uma equipa grande, pois encontrará arduidades bem diferentes das que está habituado. Apesar da sua tremenda velocidade e capacidade de aceleração, o que lhe permite criar desequilíb­rios no um contra um, encontrará, face a defesas cerradas e blocos baixos, menos espaços do que está habituado a perscrutar. E, aí, necessitar­á de apresentar outro tipo de atributos na tomada de decisão, principalm­ente nos capítulos do passe e dos cruzamento­s, como também terá de estar preparado para estar bem mais exposto em momento defensivo, tanto na defesa do espaço exterior como do interior, em que apresenta mais debilidade­s.

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