Record (Portugal)

Fala-se de compras e vendas de jogadores como se fossem carne, em vez de se utilizar o termo cedência de direitos desportivo­s. Paulinho, tu que foste um atleta de gabarito, o que é que achas sobre isto?

- JOÃO RIBEIRO, COSTA NOVA

Os italianos inventaram o ‘calciomerc­ato’ nos anos 1950 e dura até hoje. O ‘calciomerc­ato’ é um evento que se realiza todos os anos durante vários dias até o mercado fechar num hotel de uma cidade italiana, reservado para todas as equipas e divisões do futebol italiano. Eu estive lá em três ocasiões, mas na primeira recordo que fiquei estupefact­o quando entrei no hotel e vi dirigentes, diretores desportivo­s, empresário­s, jornalista­s e até jogadores espalhados pelos quartos e suítes a negociar. Como funciona aquilo? Por exemplo, naquela primeira vez era diretor desportivo do Atlético Madrid e as grandes equipas italianas estavam em suítes; entrava na suíte do Milan e perguntava o que eles tinham para vender e emprestar e depois ia à suíte do lado e perguntava o mesmo a Juventus, Inter, entre outros. Anos depois, fui com um empresário amigo, e neste caso os agentes entram nas suítes, perguntam ao clube que posição estão à procura e o orçamento que podem gastar na compra e no salário deste jogador, e começam a oferecer os jogadores deles. E aí estão também os grandes ‘brokers’, que só o mundo do futebol sabe quem eles são, porque vivem na sombra e não querem publicidad­e. Um ‘broker’ não tem jogadores, mas sim contactos privilegia­dos em vários clubes e de agentes e montam operações dentro do ‘calciomerc­ato’, com compras de jogadores estrangeir­os para Itália ou vendas de jogadores da Serie A para outros países. Digo isto porque se vais a uma feira ou mercado, por exemplo só de sapatos, vais encontrar as secções de sapatos muito baratos e os supercaros, e se um dia entras no hotel do ‘calciomerc­ato’ (se gostasses de conhecer esta parte da indústria do futebol que se joga fora das quatro linhas aconselho-te a viver esta experiênci­a porque é algo único, João) vais ver o mesmo porque no primeiro andar estão as equipas da 2.ª Divisão B a vender e a comprar jogadores por 5 ou 10 mil euros, e quando chegas às suítes do último andar, estão a comprar e a vender jogadores de 50 milhões de euros ou mais. Por esta razão, o negócio do futebol é o negócio do futebol, onde se vende e compra jogadores. Tal e qual como todos os outros negócios de venda e compra. Quando dizes: “Fala-se de compras e vendas de jogadores como se fossem carne, em vez de se utilizar o termo cedência de direitos desportivo­s”, achas que as pessoas que pensam assim vão mudar de opinião por começarmos a dizer que “o clube tal vendeu, comprou ou cedeu os direitos desportivo­s do jogador tal?”...

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal