O talento de inventar pelo caminho
EVERTON ESTÁ NO PRIMEIRO TROÇO DA VIAGEM QUE O CONDUZIRÁ A PATAMARES SUPERIORES. SERIA MUITO ESTRANHO, VISTAS AS COISAS A ESTA DISTÂNCIA, SE, NO FINAL DA ÉPOCA, NÃO ESTIVESSE, POR DIREITO PRÓPRIO, ENTRE OS MAIS APETECIDOS JOGADORES DO MUNDO
çQuando pega na bola e se faz à estrada transporta intenções perversas, todas associadas ao engano, esse dom de pensar e fazer tudo ao contrário do que evidencia na expressão corporal e até no olhar. Everton prepara-se para cumprir o senso comum, ainda que, mesmo nesses momentos em que se mascara de jogador normal, revele o prazer do adorno, da intervenção personalizada de um toque, de uma acrobacia, de uma finta de corpo, de qualquer elemento que o distinga. Tem imaginação e talento, gosta de ser diferente e tem coragem para ensaiar sucessivos truques que entusiasmam as plateias, inspiram os companheiros e levam os adversários à loucura.
Tira gente da frente com golpes de cintura e a magia de um estilo predominantemente orientado pela mentira. Precisa ainda de coordenar uma série de fatores fundamentais para a função que desempenha junto às linhas laterais e calibrar os valores de objetividade, acutilância e eficácia com as características dominantes do seu futebol habilidoso, teatral e chaplinesco. Revela também perfeita gestão da velocidade; seleciona a rota, define o destino e é prodigioso a limpar quem o aborda, pela prodigiosa conceção da forma como se propõe prosseguir a viagem mas também pela capacidade de travar, arrancar, acelerar e mudar de direção. A finta é fácil e a saída elegante. Mais do que candidato a herói solitário com tendências exibicionistas, a sua capacidade diferenciadora sente-se na deslumbrante participação que, em muitos casos, se faz a um toque apenas – o primeiro golo de Waldschmidt em Vila do Conde é exemplo flagrante.
Everton tem a graciosidade que distingue os grandes jogadores. Apresenta soluções exclusivas e invenções momentâneas que elevam o jogo para outra dimensão. Algumas vezes elege opções sem risco, porque automatizou movimentos recorrendo à repetição de gestos, que outra coisa não é senão o recurso mecânico para jogar em segurança – ele que se impõe por norma correndo os riscos de quem se faz à estrada disposto a inventar pelo caminho.
Oriundo de um país que, tradicionalmente, revela jogadores que se preocupam mais com a bola do que propriamente com o jogo, Everton é uma versão avançada de uma estirpe que não se tornou refém da sua genialidade; que não se sente impelido para exercícios descontextualizados das necessidades da equipa, aqueles que emocionam as plateias mas não cumprem as obrigações estratégicas e solidárias definidas pelo treinador. As exigências do futebol moderno já não se compadecem com essas manifestações talentosas de quem adora enrolar-se com a bola e se alimenta do som que as suas extravagâncias geram na plateia e que, na maior parte dos casos, só servem para complicar a vida aos companheiros.
Destro que joga pela esquerda (na direita é menos influente, à semelhança de Rafa), é um inimigo da linha reta, genial e imprevisível que, sendo uma peça solta da engrenagem, tem visão para ativar cada um dos elementos que pisam terrenos próximos. Everton é um extraordinário criador de espaços, um fantástico inventor de lances suscetíveis de finalização e dispõe de armas contundentes para ser ele próprio a colocar assinatura no tiro fatal. Em pouco tempo já mostrou boa parte do arsenal que lhe confere o invejável estatuto de um dos melhores jogadores da reserva moral do futebol que continua a ser o Brasil. Aos 24 anos, na primeira experiência europeia, está apenas no primeiro troço da longa viagem que conduzirá, desportiva e financeiramente, a patamares superiores. Será muito estranho, vistas as coisas a esta distância, que no final da época não esteja, por direito próprio, entre os mais apetecidos jogadores do Mundo.
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