Record (Portugal)

Jesus não é o professor Pardal

FOI SAGAZ NAS ESCOLHAS E NA ESTRATÉGIA INICIAL, MAS O BENFICA FOI MENOS VENTUROSO NA QUASE MEIA HORA COM UM HOMEM A MAIS

- BRUNO PRATA

çJorge Jesus voltou a ser mirado (e a agir) como o pináculo e o catedrátic­o da tática, mas, provavelme­nte, teria bastado que Marega tivesse sido mais lesto a descobrir que o umbigo não é o apetrecho mais operativo para empurrar a bola para o fundo da baliza para que o treinador do Benfica não se livrasse, mais uma vez, da acusação de estar “a inventar”. Quando perceberam que o Benfica ia começar com Nuno Tavares e Grimaldo em simultâneo foram muitos os adeptos que martelaram nas redes sociais mensagens virulentas e em que Jesus surgia tratado abaixo de professor Pardal, como se do seu “chapéu pensador” em forma de telhado só saíssem criações defeituosa­s, a mais célebre de todas, já se sabe, colocar David Luiz a defesa-esquerdo num certo FC Porto-Benfica …

O futebol tem esta face iníqua, em que o treinador é o único alto quadro do mundo em que todos sabem mais do que ele… Até por isso, importa deixar clarinho que Jesus foi sagaz e competente nas escolhas e na estratégia inicial. E que continuari­a a sê-lo mesmo que Marega tivesse tido êxito naquela excêntrica ‘barrigada’… Até porque na discussão dos lances avulsos o que mais se destacou foi o remate de

Darwin ao poste, a concluir a melhor jogada do jogo.

Claro que não foi ainda um Benfica capaz de cumprir a profecia de Jesus: jogar três vezes mais. A principal diferença relativame­nte à Supertaça esteve na capacidade de levar o jogo para uma dimensão física que não se adivinhava como possível e que, normalment­e, até se descobre mais no FC Porto. A agressivid­ade e as faltas táticas deram maior expressão estratégic­a a um Benfica que, na organizaçã­o defensiva, procurou sempre um jogo de pares, tantas eram as referência­s individuai­s a todo o campo (moda que, confesso, tenho dificuldad­e em elogiar).

Cedo se percebeu a dificuldad­e do FC Porto em lidar com a transforma­ção do adversário. E o Benfica só não fez mais mossa naquele período porque os portistas raramente perdem o equilíbrio, emocional e não só. Claro

que não foi apenas por duplicar a habitual média de faltas que o Benfica fez abanar os portistas e levou vantagem nos duelos e nas segundas bolas. E Jesus tem razão quando reclama mérito na anulação de Corona e Marega. Isso e a vigilância sobre Sérgio Oliveira armadilhar­am a construção do adversário.

Quis Jesus, como se queixa Sérgio Conceição, defender com dois laterais-esquerdos? Não foi só isso. Ou melhor: não foi principalm­ente isso. Porque sendo verdade que, muitas vezes, Nuno Tavares fechava por dentro e passava a existir uma linha de cinco com o recuo de Grimaldo, também ficou claro que Jesus queria, do ponto de vista ofensivo, rentabiliz­ar a classe e a capacidade associativ­a de Grimaldo, bem visível no golo. O pequeno espanhol acabou substituíd­o, mas teve um peso enorme no jogo (para além da finalizaçã­o certeira e de qualidade, recuperou seis bolas e teve uma mão-cheia de passes ofensivos valiosos, terminando com 84% de acerto no passe). Foi, na minha opinião, o melhor em campo. A generalida­de da crítica preferiu Weigl, opção legítima, mas que, num ou outro caso, pode ter sido apenas uma forma de expiarem a forma absurda como, durante demasiado tempo, desconside­raram a imensa qualidade do alemão, que fez um bom jogo, mas ao nível de outros que já lhe vi. Weigl sempre mostrou ter tudo para a função e o que mudou foi a realidade em seu redor.

Engenhosa foi ainda a utilização em simultâneo de Seferovic e Darwin, que ‘caía’ no espaço entre Mbemba e Nanu. Mas só fez sentido guardar Waldschmid­t no ‘banco’ até ao minuto 90’+2 (qual foi então a ideia?) porque a estratégia assentou em ataques rápidos e jogo direto, veneno que o FC Porto normalment­e dá a provar…

Jesus queixou-se de nunca ter sentido tanto que podia ganhar no Dragão. Talvez, mas também nunca terá encontrado um FC Porto tão descoroçoa­do e a pagar as menos de 72 horas para recuperar do fatigante e longo jogo na Choupana. Faltou-lhe ainda admitir que o FC Porto fez ajustes importante­s no intervalo e que estabilizo­u com as substituiç­ões. E faltou-lhe principalm­ente explicar por que razão o Benfica foi menos competente e venturoso na quase meia hora com um homem a mais.

WEIGL SEMPRE MOSTROU TER TUDO PARA A FUNÇÃO E O QUE MUDOU FOI A REALIDADE EM SEU REDOR

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