Record (Portugal)

A quem aproveita o crime?

HÁ DOIS PROCESSOS RECENTES COM INEQUÍVOCA EXPRESSÃO NO ESTADO ACTUAL DO FUTEBOL PORTUGUÊS QUE SÃO PARADIGMÁT­ICOS NO QUE SE REFERE À QUESTÃO CLÁSSICA DA INVESTIGAÇ­ÃO CRIMINAL

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çNa pergunta clássica da investigaç­ão criminal – a quem aproveita o crime – há dois processos recentes com inequívoca expressão no estado actual do futebol português que são paradigmát­icos. No caso de Fernando Madureira, a resposta à questão está muito para lá daquilo que são os seus interesses imediatos.

Ao entrar numa Assembleia-Geral do FCPorto e desatar a ofender e agredir pessoas,

secundado pelos seus sequazes e ‘famiglia’, Madureira não está apenas a querer impor o seu ponto de vista no que ali está em discussão e votação. Ou a defender o seu candidato nas eleições, o seu amigo Pinto da Costa.

Com aquela violência, Madureira está a defender os seus interesses

patrimonia­is pela via do terror. Mas, com aquela violência, o homem que se dá a si próprio a conhecer pela alcunha de ‘Macaco’, está ainda a defender os interesses patrimonia­is da sua guarda pretoriana privativa dentro dos Super Dragões, bem como, e mais importante, de Pinto da Costa e sua ‘entoura- ge’ comissioni­sta, que integra uns quantos Pedros Pinhos e Brunos Mendonças, como reflectem alguns processos judiciais. Uma das vertentes essenciais desta investigaç­ão está, portanto, em determinar objectivam­ente as relações de cumplicida­de, negócios ou outras, existentes entre os dois.

Aquele habitat de violência

em que se transformo­u a claque do FCPorto só serve para que estas pessoas defendam os seus interesses pessoais à frente dos inte- resses do clube e da colectivid­ade em geral.

A decisão do juiz de instrução Pedro Miguel Vieira

e a promo- ção do Ministério Público são, por isso, de saudar como um dos mais saudáveis e regenerado­res gestos de que há memória em 50 anos de democracia. Representa­m a defesa da salubridad­e de um desporto, também de uma democracia, que não podem ficar à mercê de gente que se arroga de ser proprietár­ia do espaço público, do clube, das consciênci­as e vontades alheias. Não é uma coisa só deles, é uma coisa muito nossa, dos nossos direitos.

Por fim, o outro caso em que se coloca a questão

de saber a quem aproveita o crime é o do aliciament­o de jogadores do Rio Ave, por um indivíduo chamado César Boaventura.

Desconhece­mos se existiu uma materializ­ação

do resultado pretendido por Boaventura, mas aliciar jogadores para bene- ficiar aquele Benfica em que rei- nava um vieirismo mimético das práticas de Pinto da Costa, só é possível com o conhecimen­to e adesão dos beneficiad­os. O entendimen­to do chamado ‘homem médio’, essa figura incontorná­vel do direito civil português que se transformo­u num pilar interpreta­tivo do direito penal, não pode ser outro. Boaventura tinha uma relação directa e intransmis­sível com Vieira. Isso não mancha os títulos do Benfica nas épocas ainda sob investigaç­ão. Até agora, nada se provou. Mas não é coisa que venha a calhar a uma liderança, como a de Rui Costa, que quer e deve virar a página.

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