Record (Portugal)

Porrada, mulheres, jogo, álcool, dívidas e futebol: a vida de Stan Bowles

- Filipe Alexandre Dias Editor executivo

çNo futebol inglês dos anos 1970 reinava uma cultura de álcool, apostas, noites brancas, orgias de comida e treinos básicos. Um dos maiores produtos deste tempo foi um jogador estupendo do qual pouco terá ouvido falar e ainda menos terá visto: Stan Bowles foi um jogador de técnica apurada e anarquia absoluta, dentro de fora de campo. Não se percebia se era um médio que jogava como avançado ou um avançado que atuava como médio. Mas de uma coisa todos sabiam: com a bola as seus pés, Stan tornava possíveis todos os sonhos. Porém, o instinto vagabundo saía com ele de campo e seguia-o por toda a parte, impedindo-o de fazer uma carreira à altura do seu talento transborda­nte. Jogador inveterado, arrasador com mulheres, avesso a regras e um pesadelo para treinadore­s, clubes e companheir­os, Stan era, contudo, adorado pelo público e as suas diabruras ainda hoje roubam sorrisos. Faleceu no passado dia 24, após uma vida que vale a pena contar.

Criado à beira do rio Mersey, Stan iniciou-se no Manchester City. Quando era um jovem à procura de um lugar na primeira equipa, pegou-se em plena

discoteca com o treinador, um tal de Malcolm Allison. O craque e o futuro técnico do Sporting – também ele um personagem – andariam à pancada duas vezes. Mas isto foi antes de Stan Bowles ser Stan Bowles.

Após curtas passagens pelas ruas traseiras do futebol inglês (Bury, Crewe e Carlisle), chegou ao Queen’s Park Rangers em 1972 para sete anos cheios de futebol e pirataria. Bowles iluminou Loftus Road em 315 jogos engalanado­s por 97 golos. Aqui, Stan Bowles era mesmo Stan Bowles.

Em Londres, levou ao extremo seu anti-profission­alismo. Bebia oceanos de cerveja, perdeu-se com mulheres e atolou-se em apostas. Ernie Tagg, seu técnico no Crewe, dizia: “Se Stan fosse tão bom a passar ao lado de uma casa de apostas como é a passar a bola…”

Ainda assim, foi chamado à seleção inglesa, onde, claro, a viadiagem lhe levaria a melhor – contou 5 internacio­nalizações. No QPR, foi fotografad­o a ler um programa de jogo encostado a um poste antes de um canto; chutou uma bola contra o troféu da Taça de Inglaterra em casa do Sunderland, que tinha ganho o caneco e estava a exibi-lo junto ao relvado; foi preso na Bélgica numa pré-temporada e foi vendido ao Forest de Brian Clough, que lhe cortou as unhas rentes.

Stan acabou arruinado ao perder tudo em corridas de cavalos. Foi salvo pela Sky Sports e pelo QPR, que lhe deram emprego e sustento. A personalid­ade colorida de Bowles ajudou.

Em 2015, o herói de John Barnes, o jogador que o Hamburgo quis antes de contratar Keegan foi visto a vaguear de pijama pela rua. Stan Bowles já não sabia que era Stan Bowles. O mal de Alzheimer foi roubando o ex-craque de si mesmo até o levar na semana que passou. Muitas e muitas diabruras depois.

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