Chimpanzés deixam de ser cobaias
Adeus aos laboratórios e ao cativeiro, venham os santuários. São verdes e amplos. Por isso, às vezes é difícil a adaptação à liberdade.
Anova vida de seis chimpanzés de cativeiro começou na estrada: 16 horas de viagem durante a noite, para não apanharem calor. Mil quilómetros depois chegam ao destino. Não estão confinados às jaulas de laboratórios – o habitat a que se acostumaram desde a década de 20 do século passado, quando os Estados Unidos transferiram milhares destes primatas da selva para centros de pesquisa. Finalmente, as cobaias que tanto se sacrificaram pela ciência podem gozar a reforma num lar de luxo. E com a sensação de liberdade. É nos santuários – têm este nome as colónias de preservação da espécie em espaços verdes e com logística adequada – onde vão passar a viver.
A mudança faseada vem na se- quência do anúncio de Francis Collins, director da agência governamental do Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos (NIH), que em 2011 decretou o corte aos apoios a investigações biomédicas com chimpanzés. Eles são – justificou então – “os parentes mais próximos” dos seres humanos. Na verdade, o material genético é praticamente o mesmo (98%). Faz meio ano que o tal grupo de seis chegou ao santuário Project Chimps (chimpanzés), nas montanhas de Blue Ridge, Geórgia, depois de partirem em veículos com reboques do pólo de investigação New Iberia Research Center, em Lafayette, na Louisiana.
A nova morada terá parecido aos recém-chegados tão estranha quanto espaçosa: pela área de 95 hectares encontravam-se dispersas instalações especializadas (como a clínica veterinária) e a
villa de casas, amplas gaiolas de 139 m2 em versão eco-resort (os animais não estão expostos ao público). “Tudo era novo para eles e causava-lhes alguma ansiedade. Deixámos que se estabelecessem tranquilamente, nos primeiros dias, até perceberem que éramos boas pessoas”, recorda à SÁBADO Ali Crumpacker, directora executiva do Project Chimps.
Três quilos de produtos frescos
Os alimentos serviram de elo de aproximação entre os novos moradores (que se juntaram a 16, vindos em dois grupos prévios) e a equipa de 16 funcionários e 20 voluntários. Três refeições por dia bem nutritivas (três quilos de produtos frescos) intercaladas por nozes e sementes – que os tratadores espalham pelo chão das habitações – resolveram os problemas de adaptação. “Mantivemos os grupos e os líderes, que são sempre os mais valentes e experimentam primeiro”, explica Crumpacker. A equipa monitoriza as actividades desenvolvidas pelos símios. Um deles tornou-se percussionista: deitado de barriga para cima, habituou-se a colocar um balde no estômago e a desencadear uma sinfonia de batuque.
“DEIXÁMOS QUE SE ESTABELECESSEM TRANQUILAMENTE”, DIZ ALI CRUMPACKER