Franceses e francesinhas
SERÁQUEOSFILMESdevem
conter imagens de fumadores? A questão foi levantada em França por uma senadora. Se os filmes transportam imagens do vício, será que os mais jovens devem ser expostos à tentação? Boa pergunta. Uma pergunta que, aliás, só peca por defeito. O que leva a elite política francesa a olhar com preocupação para o tabaco – mas não para outras condutas nocivas que o cinema espalha pelas audiências? A violência é um caso óbvio. O sexo – não protegido – é outro. Sem falar de certas bebidas e certas comidas que nem sempre atingem pontuação máxima no fanatismo higiénico em curso. Por enquanto, a ministra da Saúde garante que vai falar com o seu colega da Cultura? E depois?
Depois, talvez Paris se lembre de taxar a indústria cinematográfica de acordo com a concentração de nicotina, álcool e sal presente em cada obra. O que não deixa de ser um retorno a velhas práticas totalitárias.
Na União Soviética, ou na Alemanha nazi, a arte não era o simples resultado de uma expressão individual. A arte estava ao serviço do partido, ou da raça, de forma a disseminar pelo povo uma nova mensagem de redenção. As utopias políticas do século XX repousam no caixote do lixo da História. Mas sobrevivem outras utopias de purificação humana que têm com a cultura a mesma relação autoritária. Se os filmes não promovem os valores “correctos”, para que servem os filmes, afinal?
AAGÊNCIAEUROPEIADEMEDICAMENTOS
já não vem para o Porto. Como habitante da cidade, respiro de alívio. Mas este episódio, desde o princípio, mostra a faceta marxista do primeiro-ministro. Falo de Groucho Marx, não de Karl: estes são os meus princípios, mas se não gostar eu tenho outros. Foram meses e meses a defender Lisboa como destino da fatal agência. Mas bastou um espirro de Rui Moreira – e a sublevação dos portuenses ultrajados – para que o dr. Costa fizesse contas à vida. Valerá a pena perder o peso eleitoral do Porto – e do Norte? Que interessa uma agência quando há eleições em 2019 e uma parte desse País pode amuar ou fazer as malas para uma candidatura vizinha e, quem sabe, com selo regional autenticado? A defesa de Lisboa transmutou-se na defesa do Porto – da noite para o dia. Aliás, para completar o quadro, dizia-se com solenidade que o primeiro-ministro sempre defendera os interesses do Porto na matéria. A insistência com Lisboa era uma alucinação colectiva – ou, Deus meu, uma cabala lisboeta destinada a enxovalhar a Invicta. O Porto lá avançou. O Porto lá perdeu. Amesterdão lá ficou com a taça. E António Costa, pesaroso, lavou as mãos nas águas da parolice portuense. “Eu tentei”, dirá ele, “mas Bruxelas nunca percebeu os encantos da francesinha”. Que pelo menos o Infarmed perceba, agora atirado como um biscoito de consolação para não deprimir os nativos.
O caso não seria grave se fosse isolado. Não é. Portugal tem neste momento um primeiro-ministro que faz tudo para chegar vivo às próximas eleições – e ganhá-las.
Os liberais estão errados. Não é o poder absoluto que corrompe. É a ausência de poder que corrompe absolutamente.
MASHÁLIMITES–
e António Costa, apesar de tudo, começa a senti-los. Os funcionários públicos têm as carreiras recuperadas a partir de 2018 – e os professores ficavam a ver navios? Os sindicatos não gostaram. E o Governo, a tremer, já assinou um dúbio compromisso para repensar o caso – no futuro próximo. Foi o que bastou para que outros profissionais se chegassem à frente: então e nós? António Costa compreende; mas relembra que não é possível “refazer” a história. Tradução: se toda a gente desata a pedir mais dinheiro, Portugal acaba nos braços do FMI outra vez. O raciocínio de Costa é correcto. Mas ignora dois pormenores dramáticos. Para começar, foi o seu Governo que alimentou a esperança de que vinha aí um capítulo glorioso, muito distante dos tempos sombrios da troika. E, para acabar, a propaganda económica do Governo sustentava essa promessa: com juros baixos, défices baixíssimos e a economia a crescer como nunca “neste milénio” (palavra de honra), abrir a torneira e “virar a página da austeridade” era um desígnio nacional. Quando António Costa pede contenção às tropas, ele esquece-se que foi o primeiro a dar o tiro de partida. E agora? Haverá a tentação de dar outro na cabeça para que as urnas o salvem?