The Florida Project: a humanidade nos arrabaldes da Disney
Sean Baker já tinha filmado Tangerine com um iPhone 5S. Agora, foi buscar uma das suas protagonistas ao Instagram e pô-la a bater texto com Willem Dafoe e três crianças. O resultado? Cannes rendida
Apaisagem que algumas famílias vêem a caminho da Disney, na Flórida, é a vida que outras (muitas) famílias têm de viver. No filme de Sean Baker (Tangerine, 2015) que estreia esta quinta-feira, 15, nas salas de cinema portuguesas, The Florida Project, Moonee, de 6 anos, vive com a mãe, Halley, num motel próximo da Disney – juntas, elas são um tratado sobre a força, a inteligência emocional e a sobrevivência em tempos de cólera. Quando viu o filme, Cannes encantou-se. Já a Academia... bom, enganou-se. Só Willem Dafoe captou a atenção dos Óscares, conquistando, com este filme, a nomeação para Melhor Actor Secundário. The Florida Project tem, no entanto, muito mais para dar. O quê? Brooklyn Prince, de 7 anos, é Moonee. Actriz-revelação, encanta no ecrã – onde brilha numa personagem às vezes esperta, às vezes cheia de esperteza, que passa o tempo a brincar com as crianças que vivem no motel e a meter-se em confusões ligeiras mas sempre imersos em aventura – e fora dele: no programa de Jimmy Kimmel, contou como numa cena em que tinha de mostrar o dedo do meio se enganou (nunca tinha feito o gesto) e teve de pedir à mãe que lhe explicasse o que fazer. Acto contínuo, Jimmy Kimmel desafiou-a a provar que tinha aprendido. Claro: Brooklyn acabou a mostrar o dedo do meio num dos programas mais vistos do mundo — algo envergonhada, muito engraçada.
MOONEE E A MÃE VIVEM SEM DINHEIRO NUM MOTEL PERTO DA DISNEY. ENQUANTO AS CRIANÇAS BRINCAM, O GERENTE (DAFOE) OLHA POR ELAS
Como Halley, mãe de Moonee, o realizador Sean Baker apresenta uma actriz ao mundo: Bria Vinaite. No ecrã, ela é uma jovem mãe que sobrevive apoiando-se em alguns subsídios estatais e negócios mais ou menos legais. Na vida, Bria é a mulher com mais sorte do mundo. É Sean Baker que o conta em entrevistas: “Um amigo meu repostou um post dela no Instragam e eu achei de imediato que ela tinha uma atitude de quem não se preocupava com as coisas. Dei por mim a voltar à página dela e a dizer que era mesmo bom encontrar alguém como ela em Hollywood. Claro que a dada altura alguém me disse: ‘Porque é que não lhe perguntas se ela quer entrar no filme?’” Assim aconteceu – e o cinema ganhou com isso.
Foi, no entanto, apenas Willem Dafoe que despertou o interesse da Academia. Como Bobby, o gerente do motel, ele é garante da segurança das crianças, que repreende mas adora – e de quem, a espaços, parece um pai. Em entrevista conjunta à Variety, o actor explicou que trabalhar com actores inexperientes como Brooklyn e Bria não foi um desafio tão grande assim. “A partir do momento em que estamos num set tudo está nivelado, não interessa o que fizemos ou não antes, interessa estarmos ali a dar o nosso melhor”, disse.