SÁBADO

A Oresteia, de Ésquilo, estreia-se a 17 de Fevereiro no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, numa encenação de Tónan Quito

Para a deusa Atena, só um tribunal com jurados mortais poderá acabar com as carnificin­as no mundo humano. Eis a Oresteia de Ésquilo, que Tónan Quito encena no CCB, com bailarinos-deuses e os Dead Combo a tocar

- TEXTO RITA BERTRAND

Os homens eram marionetas, que obedeciam cegamente à vontade dos deuses, perpetuand­o ciclos de vingança e carnificin­as que dizimavam famílias inteiras. Entretanto nasceram novos deuses, a discordar dos antigos, que sopravam maldições intermináv­eis sobre as famílias (como a de Orestes, que mata a mãe para vingar a morte do pai) – entre eles Atena, que no fim da Oresteia (cuja estreia será no sábado, dia 17, no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, numa encenação de Tonán Quito) institui um tribunal de homens, para homens, com poder superior à caprichosa vontade divina. Daí em diante, a culpa dos crimes deixa de ser dos deuses, mas também passa a ser legítimo não vingar o pai ou o filho, em nome de um bem maior: a paz.

É o que ensina esta tragédia (em três peças) de Ésquilo, onde – segundo o encenador (que é também actor no espectácul­o) – “o indivíduo só se revela no colectivo e portanto o coro é a personagem principal; as várias personagen­s, que ilustram situações que servem de matéria às suas reflexões, vão saindo dele; é um grupo a reflectir, a vibrar, a debater, para outro grupo, que é o público”. Com dois bailarinos – Vera Mantero e Francisco Camacho, “porque já na Grécia Antiga a tragédia tinha dança e um lado operático, em que a musicalida­de vinha do texto” – nos papéis dos deuses Atena e Apolo, esta Oresteia contém as três peças que Ésquilo escreveu, e em 458 a.C. venceu o festival das Dionísias Urbanas (Agamémnon, Coéforas e Euménides), mas com cortes. “Mesmo assim, o espectácul­o tem mais de duas horas e meia, estamos cilindrado­s com a quantidade de texto”, admite Tónan, que antes encenou O Inimigo do Povo, de Ibsen, e Ricardo III, de Shakespear­e, igualmente textos clássicos (mais recentes) que tratam questões políticas: “Interessav­a-me continuar a pensar sobre isso e contar esta história, em que o poder de decisão é entregue aos homens, num tribunal que é o princípio da civilizaçã­o. Ao mesmo, as erínias, deusas antigas da maldição, da punição dos homens, também se renovam, aceitando transforma­r-se nas novas graças, protectora­s.”

Para trazer a história à cena, Quito – tendo já em Ricardo III usado sabiamente trompete e bateria para adensar o drama – chamou os Dead Combo, “que, não usando palavras fazem uma música que viaja e que reporta a emoções antigas, mas ao mesmo tempo é nossa, portuguesa, e isso faz a ponte com aquele texto que não é nosso, mas é a base da nossa história, do Ocidente”. Cláudia Gaiolas, Isabel Abreu e Miguel Borges completam o elenco, que assume em simultâneo personagen­s fixas e voz no coro.

“O INDIVÍDUO SÓ SE REVELA NO COLECTIVO, POR ISSO OCOROÉA PERSONAGEM PRINCIPAL”, DIZ O ENCENADOR, TAMBÉM ACTOR NO ESPECTÁCUL­O

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