Assédio, o clima a mudar e a entrevista interrompida
Rajendra Pachauri foi 13 anos presidente do IPCC (o Painel Intergovernamental da ONU para as alterações climáticas), a instituição que em 2007 recebeu, com Al Gore, o Prémio Nobel da Paz pelo papel contra o aquecimento global. Mas foi forçado a demitir-se em 2015, na sequência de um escândalo de assédio sexual, na Índia. Era também presidente do TERI (The Energy and Resources Institute), um instituto indiano, onde uma mulher, 45 anos mais jovem, fez queixa às autoridades por assédio sexual no local de trabalho. A polícia anexou à acusação mais de seis mil mensagens, de telemóvel e de WhatsApp, ao longo de ano e meio. Mais duas mulheres vieram a público. Pachauri fez queixa pelos prejuízos, contra as mulheres, a sua advogada e vários
media que reportaram o caso – explicou ao tribunal que vive de dar conferências sobre alterações climáticas e que assim as suas fontes de rendimento “secaram”. Também interpôs uma providência cautelar para que o caso não fosse reportado, que foi recusada pelo tribunal por considerar que equivaleria “a uma mordaça sobre os media, ao mesmo tempo que impediria o direito do público de estar actualizado sobre os desenvolvimentos”. Apenas acrescentou que a cobertura mediática deveria deixar claro que o caso ainda decorre e está em segredo de justiça.
Esteve em Portugal a convite das Conferências do Estoril, para falar sobre alterações climáticas. Na entrevista à
mostrou desconforto nas questões iniciais sobre o caso que o assombra desde 2015. A entrevista acabou por durar apenas quatro minutos e três segundos.
Foi considerado culpado de assédio sexual pelo provedor interno (Internal Complaints Committee) do TERI, a que presidia. Teve de se demitir, e também do IPCC. O caso está em tribunal. Depois da primeira queixa, mais duas funcionárias fizeram depoimentos públicos relatando assédio. À que apresentou queixa enviava SMS a pedir: “Por favor, não pode apalpar-me e/ou beijar-me.” Isto é bastante claro, não é? A coisa toda está sob segredo de justiça. Apenas o facto de que alguém fez uma alegação não prova que alguém
seja culpado. Já tive ataques de vários tipos nos últimos anos. Terei todo o prazer em dar-lhe um artigo... em 2010 houve publicações, repetidas por todo o mundo, de que eu estava a fazer milhões de dólares... Pediram desculpa [o jornal Daily Telegraph].
Pediram desculpa porque eu fui a uma firma de advogados em Londres e o editor percebeu... Mas conseguiram o que queriam. O ponto que estou a tentar marcar é que apenas alguém fazer uma alegação... E não houve segunda ou terceira queixa. Não, as outras duas mulheres fizeram depoimentos públicos. Sim. Por isso, vou para tribunal e aliás processei-as pelos prejuízos que me causaram. Tenho a certeza absoluta de que correrá a meu favor. Mas, como disse, a questão está em processo judicial e preferia não dizer nada sobre isso. Nenhum tribunal apresentou acusações contra mim [a polícia de Nova Deli comunicou oficialmente a 1 de Março de 2016 que a acusação foi preenchida por um magistrado judicial, nesse mesmo dia, no Tribunal de Shivani Chauhan, em Saket, por stalking, assédio sexual, “ultraje à modéstia de uma mulher” e intimidação. A política esclareceu que a acusação tem 1400 páginas]. O provedor interno do TERI já o considerou culpado. O tribunal disse que esse processo era enviesado e que não foram seguidos os procedimentos correctos. [O Supremo Tribunal Indiano admitiu que o recurso de Pachauri no Tribunal Industrial, contra a decisão do TERI, deveria ter seguimento]. O tribunal, em todo o processo, tem sido sempre a meu favor. Disse que tem havido outros ataques contra si, e noutras ocasiões referiu que há uma espécie de conspiração. Invocou que os seus aparelhos electrónicos tinham sido alvo de hacking, mas os exames forenses concluíram que não foram. Não, disse que tinham sido alvo de
hacking ou de uso indevido. E ainda mantenho que o meu portátil teve uso indevido. Bem, teria de ter tido um uso indevido muito, muito longo e prolongado: são centenas de SMS enviadas e mensagens... Não vou entrar nisto em pormenor, mas vou dizer-lhe uma coisa off the record ,esósefor off the record. Está bem? De outra forma, prefiro não fazer a entrevista.
Já com o gravador desligado, Pachauri informou que só queria falar de alterações climáticas e que não desejava responder a mais questões sobre o caso. Foi informado que havia mais duas questões previstas indirectamente relacionadas com o assunto. Às quais poderia sempre não responder. Não poderia, contudo, impedir que fossem colocadas, antes de se passar ao tema das alterações climáticas. Pachauri considerou então que nesse caso preferia não continuar a entrevista.