“Sempre fui INSEGURA”
A Idade Não Me Define. Este foi o título que Helena Isabel decidiu dar ao seu primeiro livro, que acaba de lançar através da Manuscrito. À TV Guia, apesar da timidez, fala de amor, de política e da relação com o filho, Agir
Na apresentação do seu livro, revelou queé tímida e insegura. Explique-nos comoé que é possível? Sou, disfarço é muito bem. Tímida, sempre fui, mas arranjei mecanismos para ultrapassaratimidez. Também sempre fui uma pessoa insegura, hoje menos do que no passado. Uma das coisas boas que a idade me trouxe foi sentir mais confiança em mime não ter a preocupação de querer agradara toda a gente.
Mas, com o avançar da idade, a vida e as experiências, consegue explicar as razões dessa timidez?
A timidez já percepcionei que é uma questão de feitio. Sou aparentemente extrovertida, mas sou uma pessoa reservada em relação aos meus pensamentos, sentimentos, em relação à minha vida interior. Faço amizades com facilidade, mas, no que diz respeito a abrir-me, se calhar, é mais complicado. E em relação à insegurança?
Quando somos jovens, temos uma enorme necessidade de aprovação, quer pessoal, quer profissionalmente ... medo de não sermos capazes.
Mais ainda entrando numa profissão que à época não era bem vista. Claro, claro. Costumo dizer, pelo que observo, que a tim ide zé um adas características dos actores.
Conhece muitos?
Sim, conheço. E acho que representar é uma forma de vencer a timidez. O fazer de outras pessoas ajuda muito a vencer a timidez. É uma personagem, não somos nós. Isso ajuda a vencer medos e a saltar barreiras, como a da timidez. Uma espécie de terapia.
Sim, para pessoas mais reservadas ou tímidas... para ultrapassar problemas pessoais.
Não foi o seu caso. Aconteceu naturalmente.
Aconteceu. Não era uma pessoa com grandes problemas. Foi uma paixão porque os meus pais sem preme levaram a ver teatro desde jovem e comecei, de repente, a querer estar do outro lado.
E o seu pai chegou a ser sócio numa companhia do Vasco Morgado. Foi. E de repente comecei a querer estar em cima do palco e não me satisfazia ficar só na plateia.
Na altura, era uma jovem com algum jeito ou queria e empenhava-se a sério para ser actriz? Não, tinha mesmo vontade de ser actriz. Lembro-me de que a minha mãe me dizia em pequena que eu era apalhaça lá de casa.
Vejam só, a tímida e reservada era apalhaça lá de casa.
[Risos] É verdade, em casa era outra pessoa. Passava o tempo afazer imitaçõesdos cantores da época, fazia pequenos teatros lá em casaco mos amigos e como meu primo. Sempre tive um temperamento artístico, muito ligado às artes. Comecei por fazer ballet e depois o teatro foi uma decisão pessoal. Queria ter uma profissão ligada às artes. E teve a felicidade de ter uns pais que a apoiaram incondicionalmente. Também.
Escreve no livro que era gordinha em criança e adolescente. Se calhar uma das causas para ser mais reservada e insegura... Mas olhe que não tinha muita consciência disso nessa altura.
Ainda não havia a pressão da magreza que há hoje, nem o bullying na escola. Não, não havia essa pressão para ter as medidas certas, que tem tudo menos serem certas, mas lembro-mede que, quando me estreei no teatro, as pessoas me diziam :“Ai, que pena, tem uma cara tão bonita, que pena estar tão gordi-
nha.” Acho que foi mesmo aí que tomei consciência de que, se calhar, devia emagrecer unsq ui linhos. Eu não era obesa, de forma nenhuma. Era cheiinha.
E de repente perdeu 15 quilos.
E fiquei um palito. Mas não nos podemos esquecer de que, naquela época, o meu ídolo na moda era a Twiggy [a supermodelo britânica Lesley Lawson]. O meu e de toda a juventude daquela época.
Quando começou a sua carreira, tinha objectivos concretos ou mesmo a noção para onde ia ou onde poderia chegar, quer no teatro, quer na televisão? O meu único objectivo quando me estreei no teatro era só ode ser actriz. Não queria ser conhecida, não queria aparecerem revistas, só queria representar. Era um bocadinho diferente do sonho dos artistas adolescentes que aparecem hoje em dia–querem quase todos aparecerna televisão e serem conhecidos. O que me movia era ser actriz e representar. Depois, ao longo dos anos, com o aparecimento das novela sedas publicações sobre televisão, e pelo facto de os actor esse terem tornado famosos, a notoriedade veio por acréscimo, não foi nada que tivesse procurado.
Sentiu-se alguma vez injustiçada por ser capa de revista? Houve algumas capas que me deixaram magoada. Mas também não me posso queixar muito porque nunca expus a minha vida, e fui sempre poupada. Sei que quanto mais expusermos a nossa vida mais somo salvo de notícias. Sempre fui reservada, mas não escapei de ter duas capas a explorar a minha vida privada.
AMILITÂNCIA NO PCP
Quando se divorciou em 1999, de Paulo de Carvalho, fez capa de revista?
Não, nessa altura, não. Eu e o Paulo conseguimos resguardar esse facto da nossa vida privada. Só um ano depois é que se soube. É a prova de que, quando
as pessoas não querem efectivamente aparecer, não aparecem.
Em 1974, é apanhada de supetão pela Revolução. Já estava no teatro. Esteve na base da fundação do Teatro Ádóque. Sente que foi usada numa estratégia de propaganda político-cultural ligada à esquerda? Não fui em onda política nenhuma. Militou no PCP? Sim, chegueiamilitar no Partido Comunista, mas foi tudoporqueerauma descoberta para mim. Vivia num País onde eu achava que havia imensas injustiças sociais, ainda hoje há, e foi o resultado lógico. Já era artista antes do 25 de Abril, as coisas já eram faladas, debatidas, sentíamos a censura, embora ainda não tivesse uma consciência política apurada, mas estava atenta. Ficava muito revoltada quando um texto de teatro era censurado porque achava que todas as coisasdeviam ser ditas e devia haver liberdade. A seguira o 25 de Abril, to meias dores revolucionárias, como qualquer jovem da época.
Hoje, é uma mulher de esquerda? Sim, com valores sociais de esquerda, porque as injustiças continuam a existir. Vêem-se grandes disparidades de ordenados e de fortunas. Não sou contra a iniciativa privada e defendo uma sociedade mais justa e com mais oportunidades para todos. Acima de tudo, é tudo uma questão de oportunidades. Quem for bom, aproveita-as.
Entre 1974 e 1983, ano em que se casou, foi muito namoradeira?
Sim, fui alguma coisa [risos]. Não gosto muito de falar no meu passado. Mas amou muito e foi muito amada? Sim, acho que sim. Não consigo fazer esse balanço. Vivo o dia de hoje e não sou agarrada ao passado. Talvez seja esse o segredo para me sentir jovial.
“TENHO A CERTEZA DE QUE SEREI AVÓ”
Assim que se abre o seu livro, a primeira coisa que se lê é a dedicatória: ‘Aos meus futuros netos’…
Sou aquariana. Os aquarianos estão sempre a ver mais à frente.
Tem um grande desejo de ser avó? Não é um desejo assim tão grande. Tenho quase a certeza de que os vou ter e por isso quero deixar-lhes uma recordação. O primeiro não está já encomendado? Não, ainda não. Mas falo nos meus netos porque não sei se terei tempo para lhes contar o meu percurso e aqui loque vivi. Deixo no livro um testemunho para eles conhecerem a avó. O Bernardo[ o cantor Agir] é filho único e percebe-se que têm uma paixão mútua. Comoéa vossa relação?
É de grande cumplicidade, mas ao mesmo tempo de grande independência. Adoramo-nos, sabemos que gostamos muito um do outro, mas respeitamos muito avida individual de cada um.
Não sou o tipo de mãe que está sempre a telefonar ou a aparecer, e ele também não. Podemos estar três dias sem nos falarmos,mas sabemos que estamos lá um para o outro.
Imagino que apoie a carreira do Bernardo enquanto Agir.
Sim, e estou muito orgulhosa do que tem feito até aqui.
Custa-lhe ver cada tatuagem que ele fez e cada piercing ou furo novo? Ao princípio custava-me. Não gosto de tatuagens, embora tenha uma rosa tatuada na omoplata desde os 40 anos. Não tenho nada contra as tatuagens. Hoje em dia, até acho piada, agora não é precisos eremt antas. Aceito,éa maneira de e lese manifestar como artista, não tenho nada contra.
Alguma vez lhe disse: “Bernardo, são muitas!’?
Como boa mãe, tentei avisá-lo. Sobretudo quando ele começou a fazê-las e aquilo começou a tomar um rumo que, para mim, era demais e disse-lhe: “Ó Bernardo, se calhar vaiste arrepender” e ele disse-mequedaqui aunsanoshaverá muitos velhos tatuados. Desisti e passei a respeitar a sua individualidade. Era adulto quando começou a fazer tatuagens, não foiumacoisade criança. ●
“Lembro-me de que, quando me estreei no teatro, as pessoas me diziam: ‘Tem uma cara tão bonita, que pena estar tão gordinha’”