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Mantém-se na SIC, apesar da proposta milionária da TVI “O CONVITE DA CRISTINA pôs-me a cabeça à roda”

O humorista, de 45 anos, foi convidado pela diretora de Entretenim­ento e Ficção e pelo patrão da estação de Queluz de Baixo, Mário Ferreira, mas decidiu não aceitar, por respeito pela casa que sempre o acolheu. Garante que o “dinheiro nunca pode falar mai

- TEXTO CAROLINA PINTO FERREIRA | FOTOS FÁBIO SILVA

Estaéagran de estreia do Fernando numa novela. O que o levou a aceitar de imediato Amor Amor, que é tão diferente do que o que costuma fazer? Sim.Éa primeira novela da minha vida [risos]. Foi um desafio, não estou nada arrependid­o e há duas coisas que tenho de dizer: primeiro, porque é que não faço isto há mais tempo?; e, segundo, quero fazer novelas a vida toda, até morrer. Estou a adorar! O que é que o faz ter esse sentimento? Adoro ser outra pessoa, uma personagem. Estou a emprestar o meu corpo e os meus skills a uma outra pessoa que, neste caso,éoTóQuim, um bombeiro machista, um gajo estúpido. Um bruto que não tem responsabi­lidade nenhuma e não tem respeito por ninguém. É tudo aquilo que eu não sou na minha vida e que não defendo. Se o Tó Quim fosse do meu núcleo conhecido, jamais seria meu amigo e, se calhar, eu já tinha andado à porrada com o gajo! Para quem se estreia de forma inesperada na representa­ção, quais foram as maiores dificuldad­es em vestir a pele de uma pessoa tão diferente de si? Não tive muitas dificuldad­es, na verdade. Acho que a única coisa com que me tenho deparado – e que achava que já não existia em pleno século XXI – é as pessoas desejarem-me mal, por não gostarem do Tó Quim. Pessoas que confundem a personagem com o próprio Fernando Rocha. O que mais o magoou? Há pessoas que me desejam mal e há mesmo quem já me deseje a morte, por o Tó Quim ser machista e xenófobo. Deixa-me estupefact­o! Já vemos novelas desde que me lembro como pessoa e o público ainda não percebeu as diferenças. Fiquei admirado e triste. Mas sempre que leio esses comentário­s só me ocorre pensar: parabéns, Fernando Rocha, estás a fazer um belo trabalho! Sempre foi uma pessoa muito acarinhada pelo público e alvo de muitos elogios por parte de colegas. É por isso que ainda magoou mais? Por isso é que fui apanhado despreveni­do. Há quem diga que sou ordinário porque uso muitas asneiras nas minhas piadas, mas isso é para o lado que durmo melhor, porque é assumido e foi a postura que quis usar. Não me arrependo, será a minha imagem de marca até ao fim da minha vida. Se quiserem, o Fernando Rocha humorista será hardcore, e como sempre foi. Se voltasse atrás, teria optado por outra postura? Faria diferente? Não, faria tudo igual. Estou a ser eu próprio, a ser genuíno, a fazer o que me diverte. Comecei a contar piadas com palavrões porque era assim que contava aos meus amigos no café. Do café passou para um palco maior. Nunca mudei! Fui sempre genuíno à minha forma de fazer comédia. No início, nunca imaginei que ia ser humorista. Na altura, era eletricist­a e tinha noção de que os meus amigos paravam tudo para me ouvir contar umas piadolas. De repente, estava em salas de teatro, arraiais e acabei nos Coliseus e Super Bock Arena, etc. Alguma vez sonhou com essa projeção? Ambicionou por isto? Nunca! Se há 20 anos me dissesse que eu ia ser ator de novela e um humorista conhecido no País inteiro e que ia fazer tournées nos Estados Unidos, na Austrália, não dizia para deixar a droga, mas para abrandar nas doses, que isso estava a fazer-lhe mal à cabeça, minha filha [risos]. Dizia-lhe que estava a sonhar.

O AMOR PELA FAMÍLIA

A novela é gravada em Lisboa, tal como muito do seu trabalho se prende à capital, mas nunca deixou o Porto... Não. Sempre que se grava, às terças e quartas, fico hospedado num hotel perto do aeroporto e regresso ao Porto. Ao domingo, tenho de estar sempre em Lisboa, por causa do Domingão. São viagens extenuante­s. Como é que gere essa nova rotina? Tenho gerido conforme tenho feito ao longo destes anos. Sou do Norte, vivo lá e sempre fiz televisão. Há 20 anos que faço isto. Para mim, almoçar no Porto e jantar em Lisboa é normal. Nunca ponderou mudar-se Lisboa? Neste momento, já estou a ponderar isso. Se tenho novela, programas, torna-se difícil. Estou a pensar, pelo menos, alugar uma casa para não ficar sempre no hotel. Com este confinamen­to, os restaurant­es esta

“O que mais me magoou? Há pessoas que me desejam mal e há mesmo quem já me deseje a morte, por o Tó Quim ser machista e xenófobo. Deixa-me estupefact­o!”

vam fechados e era obrigado a pedir comida para o hotel. Está a imaginar eu a comer no quarto um arroz de polvo? Depois, ia dormir no mesmo quarto onde jantei... Era um cheiro a comida dentro do quarto! Acaba por ser desagradáv­el. E a família? Fica no Porto? Ou acompanha-o nesta mudança? Se poder evitar, para eles, melhor. Têm a vida toda no Norte: os amiguinhos... Tudo! É a mesma coisa que agora eu pôr um pinguim que está no Polo Norte numa selva. Mas, para si, a mudança também é drástica porque nunca quis deixar as suas raízes. Nunca quis, porque é lá que tenho a minha empresa. E quanto mais controlo tiver sobre ela, melhor. Isso é uma das coisas que me faz ir muito ao Porto. Podia pegar na minha família e trazê-la toda para Lisboa. Também é verdade que podia trazer a empresa, também é verdade! Mas é mais fácil fazer estas viagens. É que depois há outro problema... Qual? Se estiver muito tempo em Lisboa e não for ao Norte, vou perder um bocado o sotaque, vou perder o contacto com as pessoas que são autênticas personagen­s e que me inspiram. Pessoas engraçadas, do povo, e que eu adoro. Volta e meia, vou ao café só para lavar um bocado a alma e para me rir com eles. É gente maravilhos­a e pura! Genuína! Gosto muito de estar com aquela gente. Nesse ir e vir, como é que se colmata as ausências perante os filhos e a mulher? Se existe uma base de sustentabi­lidade e de sucesso durante estes 20 anos, devo-a à minha família. É muito difícil um artista aguentar-se sem ter uma base familiar sólida. O que eu digo, a qualquer pessoa que esteja a ler esta entrevista, é que qualquer pai que falhe aos filhos em tempo, que compense com tempo e não com prendas ou com dinheiro. Quando estou vários dias sem estar com os meus filhos e volto para casa, estou mesmo com eles. Pego na minha filha e levo-a ao cabeleirei­ro, fico lá a ler uma revista e a vê-la ser penteada. No dia seguinte, pego no meu filho e vou com ele ao futebol. Estou com eles a 200 por cento. Sente que conseguiu o pai que se propôs a ser? Podia ter sido melhor, porque a falta de tempo não me deixa ser um pai tão presente quanto queria, mas tento compensar. Quando olha para os seus dois filhos,

o que é de si neles? Os valores que eles defendem, a educação que eles têm, o respeito pelos outros, a humildade que sempre lhes transmiti. Sempre lhes disse que é a arma mais poderosa que podem ter. Qual é o segredo para um casamento de 22 anos tão feliz? Não sei qual é o segredo, se é que ele existe. Mas se estou casado há mais de 20 anos, alguma merda bem feita devo fazer. Não tenho a fórmula disto, mas acho que há uma coisa em comum entre nós: gosto mais dela do que gosto de mim e vice-versa e isso vê-se em atitudes muito simples. Por exemplo, se a minha mulher estiver a estrelar dois ovos, se um deles rebentar, ela fica com o rebentado para ela e dá-me o bom. Isto é uma coisa de nada, mas que vale muito. Acho que a isto chama-se amor. Disse-me no início da entrevista que, por si, faria novelas para o resto da vida. Se tivesse de escolher entre a representa­ção e a comédia, para que lado o seu coração pendia? Isso é muito difícil. É a mesma coisa do que ter um filho com 6 anos, nascer um bebé e ter de escolher um deles. Não me façam isso! É impossível escolher. Não consigo. Apesar de, durante o confinamen­to, ter estado a trabalhar na novela Amor Amor, o Fernando vive muito do stand up comedy e do palco. Sente saudades dos aplausos? Muitas! Mas, na segunda-feira, dia 19, vão abrir os palcos e estamos a preparar dois grandes espetáculo­s de comédia, um no Porto e outro em Lisboa, em simultâneo, para assinalar este regresso. Tenho muitas saudades de abraçar pessoas, de estar com pessoas, sem estar preocupado com as máscaras. Até já tenho saudades daquelas pessoas que largam perdigotos a dizer os f’s e os p’s. Cuspam-me lá para cima, que nem me importo. Quanto ao trabalho, não me posso queixar. Tenho tido muito trabalho e há colegas que estão passar dificuldad­es.

O CONVITE DA TVI

Recentemen­te, foi convidado para se mudar para a TVI, mas decidiu permanecer na SIC. O que o levou a tomar essa decisão? Não nego que o convite da Cristina Ferreira e do Mário Ferreira pôs-me a cabeça à roda e a pensar. Foi uma proposta muito boa, deixou-me abananado, mas depois pensei no ADN da SIC. Deram-me sempre trabalho e não posso cuspir no prato que comi. Em 2020, os meus colegas de trabalho ficaram quase todos desemprega­dos e o Daniel Oliveira deu-me o Não Há Crise, o Domingão e o Levanta-te e Ri. E eu penso: se alguém se esquecer do bem que se lhe fez, só se volta a lembrar se precisar outra vez. Era uma proposta muito grande da TVI? Era! Mas isto também não é uma corrida de 100 metros, é uma maratona. Não quero ganhar tudo de uma vez só. Penso que, tendo a espinha dorsal e sendo uma pessoa respeitosa, tenho as duas portas abertas, tanto na SIC como na TVI. Tratei toda a gente com respeito. É a prova de que o dinheiro, para si, não fala mais alto? Nunca pode falar mais alto! O dinheiro é importante, mas o não é o mais importante. Mais importante é a felicidade. Se parar para pensar... Gosto de dinheiro? Claro, toda a gente gosta! Mas prefere ter 500 mil euros e ser feliz ou 30 milhões e ser infeliz? Sinceramen­te, eu prefiro ser feliz! E é feliz na SIC? Sou muito feliz!

“Claro que gosto de dinheiro. Claro que toda a gente gosta. Mas prefere ter 500 mil euros e ser feliz ou ter 30 milhões e ser infeliz? Sinceramen­te, eu prefiro ser feliz!”

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 ??  ?? Aos 45 anos, Fernando Rocha sente-se realizado profission­almente e assume que a mulher e os filhos têm sido a base de sucesso para uma carreira que já soma mais de duas décadas.
Aos 45 anos, Fernando Rocha sente-se realizado profission­almente e assume que a mulher e os filhos têm sido a base de sucesso para uma carreira que já soma mais de duas décadas.
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Cada vez com mais projetos em Lisboa, Fernando Rocha pondera, pela primeira vez, alugar uma casa na capital. A família permanecer­á em Gondomar, onde vivem desde sempre.
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O comediante diz estar muito feliz com o seu percurso na SIC.

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