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Humor sem PALAVRÃO

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Dá para fazer humor sem palavrão? Dá sim, claro. Mas não é nada fácil, porque, às vezes, a pessoa precisa de uma palavra maior ou de um palavrão para dar força ao que se quer dizer. Diz-se por aí que para um bom entendedor meia palavra basta, mas precisamos de ser inclusivos: nem todo o mundo consegue ser um bom entendedor… Se bem que o ser humano, na verdade, é o único que consegue preencher uma história inteira com pouca coisa. A minha mulher, por exemplo, é capaz de enxergar uma traição num só fio de cabelo. Com pouco esforço, ela consegue quase descobrir o nome e a altura da pessoa, tudo através do fio de cabelo. Eu já acho que alguém sem touca na cozinha de um restaurant­e, quando descubro um fio de cabelo na comida que pedi, ainda que tenha sido eu, é daquele que acabou de sair do barbeiro. E é claro que quando a pessoa descobre um fio de cabelo na comida, pode até não dizer o palavrão, mas pensa nisso, com certeza. O Gilmário humorista, quando for narrar essa história em forma de stand up, vai refletir exatamente o que todo mundo na sala está a pensar: “Que merda, odeio quando esta porcaria acontece!” E, para dar mais força à coisa, eu contar que há um casamento que acabou por conta de um fio de cabelo que voou para o banco de trás do carro de um certo indivíduo e ele não soube explicar, pois não tinha como, a mulher acabou com relação. Agora, você acaba de ler isso e pensa num palavrão, porque a palavra aqui é pequena para demonstrar o tamanho do azar. Voltando à vaca fria. Vaca que em determinad­os contextos soa a “palavrão”. Às vezes, sou elogiado por não me servir o suficiente de palavrões nas minhas atuações. O que as pessoas não sabem é que isto é sempre reprimido pelos meus pais. Literalmen­te em Angola, existem uma série de castigos para crianças que digam um palavrão, como chineladas na língua, gindungo na boca. Atenção, eu não disse picante! Eu disse gindungo. Era como se eles dissessem: queres palavras mais quentes, experiment­a lá isso, que fica ainda mais quente. E até hoje, quando digo um palavrão, quero ter a certeza de que a minha mãe não me vai ouvir, porque acho que, com alguma sorte, ainda levo uma chinelada na língua. Felizes aqueles que não passaram por isso e hoje podem em palco usar palavrões em vez de palavras.

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