CENSURA NUNCA MAIS
A televisão estava lá e registou os momentos para a posteridade, cada um deles em dias e locais diferentes, mas com a mesma personagem: o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. Vamos por partes. O primeiro aconteceu em 10 de setembro, à margem do arranque das comemorações do cinquentenário do 25 de Abril, em Viana do Alentejo. Marcelo oferece uma cadeira a uma senhora, e pergunta-lhe, a sorrir: “E a cadeira aguenta?” O segundo, na visita oficial no Canadá, 15, o Chefe de Estado passeia pelas ruas e convive com a população no Parque Portugal, onde encontra mãe e filha lusodescendentes. A mãe mete conversa e diz que se chamam as duas Marias. E o Presidente responde, em tom de brincadeira: “A filha é mais bonita do que a mãe. Mas a filha ainda apanha uma gripe, já viu bem o decote?” E afasta-se, divertido.
Ora, bem, há quem considere estes episódios lamentáveis, deselegantes e impróprios para a figura em questão... Aonde eu quero chegar? A Ricardo Araújo Pereira.
Ricardo Araújo Pereira pegou nesses dois momentos, que desencadearam muita polémica nas redes sociais, e trabalhou-os, de forma genial, com a sua equipa em Isto É Gozar com Quem Trabalha, nos domingos seguintes, na SIC. O que aconteceu a seguir? Um cidadão anónimo apresentou queixa no Ministério Público (MP) contra o humorista e a estação de Paço de Arcos, alegando a prática de dois crimes: um de ofensa à honra do Presidente da República, e outro de ultraje de símbolos nacionais e regionais.
Fonte da SIC conta à TV Guia que a estação só se pronunciará depois de ser notificada pelo MP (que abriu um processo de inquérito) e o gabinete jurídico analisar o processo. “Até lá, não há comentários, porque desconhecemos os pressupostos da queixa.”
Faz bem a SIC em não alimentar a polémica. Fará mal o Ministério Público em dar crédito a esta queixa-crime baseada no exercício de humor de Ricardo Araújo Pereira.
Era o que faltava agora, após 49 anos de democracia, censurar a liberdade e a criatividade artísticas em Portugal.