Medicalizar a DROGA
Foi alterada a lei que regula o consumo e o tráfico de estupefacientes, descriminalizando algumas substâncias psicoativas e alargando a tolerância ao tráfico e produção de drogas, no âmbito do consumo individual. Para que serve esta alteração? Apenas para que os tribunais não entupam com milhares de processos do pequeno tráfico. Apesar de percebê-la desta forma, concordo com a alteração. Porém, é meio passo no caminho certo. A outra metade, que já deveria ter sido dada há muito tempo, tenho pouca fé que seja cumprida.
Tem sido longa a luta, ainda por cima com resultados manifestos, para que o consumo de estupefacientes que inculcam dependências, seja olhado como um problema de saúde pública e não como um problema de justiça. Tem sido lenta a alteração deste paradigma. Há décadas que a transição dos comportamentos aditivos para os cuidados de saúde é um debate ainda não resolvido pela comunidade política, embora defendido pela comunidade científica. Incapazes de vencer o preconceito contra os fantasmas da droga que agitaram o mundo a partir dos finais dos anos 50 do século passado.
Hoje, são muitos mais que, libertos dessa ganga aflita, sabem que um toxicodependente é uma pessoa doente que precisa de auxílio médico e dispensa prisões que, em vez de curarem, potenciam a escalada do consumo. Reagir clinicamente ao fenómeno de alastramento da procura, obriga a uma reação clínica forte, criando condições para que os doentes se aproximem de centros de apoio e de recuperação. Infelizmente, como tem vindo a alertar o presidente do SICAD, dr. João Goulão, a rede de cuidados neste território dos comportamentos aditivos sofre de falta de meios, de falta de pessoal, de falta de apoios materiais e financeiros para que se possa acudir a esta pandemia que varre o território nacional. Este é o grande desafio que o Estado enfrenta no domínio da Saúde. Não basta fazer leis não punitivas. Sem a medicalização das dependências pouco ou nada restará, a não ser a improdutividade, o aumento da criminalidade e a morte como remate final para muitos infelizes. ●