Joao.mestre@globalmediagroup.pt
Mundos imaginários, bizarrias geográficas e outras curiosidades de bolso. Por João Mestre
ARepública Unida Democrática Livre Popular de San Sombrèro é tudo menos um país unido, popular ou livre. E a democracia propriamente dita só durou os três dias subsequentes à independência, em 1892. Assim começou uma das mais enraizadas tradições locais: o golpe de Estado. Na última década, o pequeno país teve 17 presidentes, incluindo o detentor do mandato mais curto da história, Alivio Escrevez, assassinado a meio do discurso de tomada de posse. Porém, há regras: é necessária uma maioria parlamentar de dois terços para ordenar um assassínio. o visitante não tem o que temer – em San Sombrèro, 79 por cento da criminalidade violenta ocorre no Parlamento. O país está dividido em cinco províncias: as florestas de Maracca e a paisagem lunar de San Abandonio, na costa do Pacífico, e, do lado caribenho, a terra de vulcões Guacomala, a hedonística Lambarda, e Polluçion, onde fica a capital, Cucaracha City. Cucaracha é uma cidade onde charme colonial e abandono pós-industrial andam de mão dada. O tráfico é caótico, e mesmo em ruas pedonais (e átrios de hotel) há que ter cuidado com os carros, mas não faltam recantos onde saborear o doce ritmo de vida local, nomeadamente jardins, onde os reformados se juntam para jogar strip poker, e atividades para quem viaja tanto em família (um petting zoo de cobras) como sem ela (o bairro red light de San Felacio). Além de um otimismo à prova de bala, a população distingue-se por ser invulgarmente bonita e pela sua musicalidade. Os polícias dirigem o trânsito com acordeões, há shows de cavalos dançantes e a marcha fúnebre é tocada em samba. O hino nacional, esse, é o único que tem por base a bossanova – e letra de teor sexual. Herança colonial, os san-sombreranos são católicos, ainda que os indígenas só se tenham deixado converter com a introdução do bingo de paróquia e a redução dos pecados mortais para três. Hoje, podendo o viajante participar no seu quotidiano e ficar instalado na aldeia, como hóspede ou como refém. O que, à luz do otimismo san-sombrerano, sempre será um modo de prolongar a experiência. San Sombrèro: A Land of Carnivals, Cocktails and Coups (2006) é uma sátira à ignorância ocidental sobre os países da América Latina, caricaturando todos os lugares-comuns. É o terceiro volume da coleção de guias de viagem fictícios Jet Lag.