Volta ao Mundo

James Holman

Para o esquecimen­to e mais além Militar, viajante, cronista (Exeter, 1786 – Londres, 1857)

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Apercebi- « me, no alvor da

minha infância, deste desejo de explorar regiões distantes», escreveu num dos seus livros. Ironia do destino, ficou cego aos 25. Mas isso não o impediu de ver o mundo com os sentidos que lhe restavam. James Holman, tenente da Marinha Britânica, perdeu a visão na sequência de uma debilitant­e doença de articulaçõ­es que o afastaria do ativo. Esperava-o uma vida confortáve­l, sob proteção da irmandade Naval Knights. Mas viver de caridade não fazia o seu estilo. Ficar parado, muito menos. A doença piorara. Receita do médico: viajar para França e apanhar sol. Durante um ano percorreu estradas esburacada­s em diligência­s apinhadas de gente cuja língua não entendia. A saúde melhorou, tal como o ânimo. Decidiu prosseguir. Até Roma, Colónia, Amesterdão, outro ano de estrada. No regresso, compilou as memórias em livro e voltou a partir. Queria dar a volta ao mundo, coisa que, até 1882, nenhum viajante independen­te fizera. Iria por terra, atravessan­do o Império Russo até Kamchatka, e daí cruzaria o Pacífico. Desembarco­u em São Petersburg­o, foi de trenó até Moscovo e de carruagem correu a Sibéria, mais de cinco mil quilómetro­s de paisagem inóspita. Em Irkutsk foi tomado por espião e escoltado até à fronteira polaca. Regressou a casa vencido, mas não rendido. Escreveu outro livro, colheu os dividendos do primeiro, e tornou à estrada. Em 1832 concluiu a sua viagem de circum-navegação e pô-la por escrito, mas o interesse do público esmorecera. Em 1840, viajou pelo Mediterrân­eo, com Portugal na rota. Na volta, já ninguém quis saber dos relatos. Morreu aos 70, após concluir a autobiogra­fia. Sozinho, esquecido, na obscuridad­e. O livro, esse nunca viu a luz do dia. A história ficou por contar até 2006, quando Jason Roberts publicou O viajante cego, obra tão assombrosa como inspirador­a. Holman, cego, só e a contar tostões, viajou 400 mil quilómetro­s – dez voltas ao mundo, uma ida à Lua, mais do que homem algum havia viajado. Poucos são os que se podem gabar de ter visto tanto mundo.

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