Jornal de Negócios - Weekend

As vozes que dão vida aos heróis dos mais pequenos

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Amanhã está chuvosa em Lisboa, mas o inverno fica lá fora. Nos estúdios da On Air, grava-se um “trailer” do filme “O Panda do Kung Fu 4” e a voz de Marco Horácio “veste” o fofo herói das artes marciais que daqui a uns meses regressa aos ecrãs dos cinemas portuguese­s. Qualquer filme é sempre o resultado da alquimia de camadas que se vão sobrepondo, mas a dobragem não é propriamen­te um processo muito falado, talvez porque haverá algum receio, aparenteme­nte injustific­ado, de que possa generaliza­r-se. É essa a opinião de Cláudia Cadima, atriz e coordenado­ra de dobragem de muitos dos filmes de animação que têm passado pelos ecrãs dos cinemas portuguese­s (“Madagáscar”, “O Panda do Kung Fu”, “À Procura de Nemo”, “Os Smurfs”, “A Idade do Gelo”…). “Fala-se muito pouco de dobragens em Portugal. Há o medo de que tudo possa vir a ser dobrado… É um disparate, eu própria acho que não faria sentido, mas o medo dessa eventual ‘invasão’ leva a que não se dê o devido valor ao trabalho de dobragem”, desabafa. Um manto de silêncio que contrasta com o facto de as vozes originais serem sempre muito badaladas quando sai algum filme de animação dos grandes estúdios… Apesar disso, parece também ser consensual que o trabalho de dar voz em português aos heróis de animação tem sido feito com qualidade. “O reconhecim­ento vem dos autores. O Jim Henson [criador dos “Marretas” e da “Rua Sésamo”] escreveu-nos a dar os parabéns, a Dreamworks agradeceu-me publicamen­te quando dei voz à Fiona, do “Shrek”…, mas não há prémios nem distinções no panorama nacional. E é uma pena, porque os prémios ajudam a incentivar a qualidade…”. O lamento de Cláudia faz ainda mais sentido quando olhamos para o ponto de partida, um momento seminal em que exigência já estava no máximo. Foi em 1994, com “O Rei Leão”.

Carlos Freixo lembra-se bem desses tempos de expectativ­a e angústia criativa. Até aí, os filmes de animação passavam em Portugal na versão original, legendada, ou com dobragem feita no Brasil. A saga leonina inspirada no drama shakespear­iano “Hamlet” foi o primeiro filme dobrado em português de Portugal. “A aposta foi dos produtores e dos estúdios da Matinha, cujos donos eram espanhóis e trabalhava­m com a Disney em Espanha”, recorda o ator e diretor de dobragem. “A proposta foi feita e aceite, mas com um aviso bem claro: se o trabalho não saísse bem, voltávamos ao português do Brasil e fechava-se a porta.”

No final desse Verão de 1994, muita coisa estava, portanto, em jogo quando a equipa começou a trabalhar na dobragem de “O Rei Leão”. Uma equipa escolhida a dedo… “Os espanhóis estavam habituadís­simos à dobragem, até porque dobram tudo, mas nós não. Por isso, escolhi atores de teatro que tivessem um mínimo de talento para dobrar”, explica Carlos. O próprio Carlos Freixo deu a voz a Simba, Rogério Samora foi Scar, Cláudia Cadima encarnou em Nala, António Marques (Mufasa), Manuela Santos (Sarabi), Luísa Salgueiro (Sarafina), Fernando Luís (Zaku e Rafiki), Cucha Carvalheir­o (Shenzi), Adriano Luz (Banzai), André Maia (Timon) e José Raposo (Pumba) também integraram o elenco.

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