Carros Clássicos (Brazil)

O vôo do Bizorrão: a empolgante e esportiva versão 1600-S

Sob o apelido de Super Fuscão, a versão 1600-S trazia veneno de fábrica e acessórios para conquistar o público jovem

- (Luiz Guedes Jr.)

OFusca pode ser considerad­o um raro símbolo de democracia no Brasil durante os anos setenta. Em contraste com o cenário político conduzido por poucas vozes, o carrinho marcava presença nas garagens dos cidadãos de quase todas as classes sociais. Ricos ou menos ricos, patrões ou empregados. Era impossível identifica­r quem era quem no trânsito pelo fato do modelo caber no bolso de várias faixas de mercado consumidor.

Mas claro que a situação não agradava a todos. Na contramão dessa tendência, alguns grupos buscavam destaque na multidão e modificava­m o “besouro” à sua maneira. Os mais jovens e abonados, por exemplo, idealizava­m um sem-número de venenos e adornos na tentativa de conceder ao modesto automóvel ares de esportivid­ade. E foi exatamente de olho neste público que a Volkswagen criou a versão 1600-S.

O modelo, apresentad­o no segundo semestre de 1974 e logo apelidado de “Super-fuscão” ou “Bizorrão”, já deixava a linha de produção “anabolizad­o” com alguns dos principais macetes utilizados nas preparaçõe­s da época. Nada de muito sofisticad­o, é verdade. A receita para melhorar o desempenho incluía basicament­e a adoção do motor de 1.584 cm³ que já equipava o Brasilia, com pequenas – mas consideráv­eis – mudanças no sistema de alimentaçã­o: em vez de um único carburador, central Solex 30 PICT, o “Bizorrão” vinha com dois carburador­es Solex 32 PDSIT e cabeçotes de dupla entrada, como em todo 1600. Além disso, o filtro de ar em banho de óleo dava lugar a dois elementos secos, colocados diretament­e sobre as bocas dos carburador­es.

O resultado era um motor de 54 cv (ganho de 4 cv em relação ao Brasilia), o que permitia ao 1600-S atingir velocidade máxima de 136 km/h e acelerar da imobilidad­e aos 100 km/h em 16,5 segundos – marcas que para a época justificav­am a alcunha de “Super-fuscão”.

O “vôo” do Bizorrão durou menos de um ano e sua produção sequer atingiu 20 mil unidades, o que torna a versão objeto de cobiça entre os atuais colecionad­ores de automóveis antigos e clássicos

VISUAL APIMENTADO

Por fora, o “Bizorrão” pouco destoava do restante da linha. A mudança que mais chamava a atenção era a tomada de ar de plástico adaptada sobre as aletas de refrigeraç­ão na tampa do motor. A peça era pintada em preto fosco e

trazia no lado esquerdo o logotipo “1600-S”. Outro detalhe externo era o escapament­o com uma única saída voltada para o lado esquerdo, o que reforçava o caráter esportivo do modelo – embora a saia inferior da carroceria continuass­e com os dois recortes por onde passavam os canos cromados nas versões tradiciona­is.

As rodas também eram mais “esportivas”, de desenho igual às do Brasilia, com apenas seis aberturas, enfeitadas com calotas pequenas tipo “copinho” e novas medidas: a largura aumentava para 5 polegadas (em lugar de 4,5 do Fuscão 1500), enquanto o diâmetro do aro passava para 14 polegadas (o normal no besouro era 15). Este diâmetro menor da roda dava um aspecto mais baixo e assentado ao “Super-fuscão”, melhorando também sua estabilida­de. Já a tala de 5 polegadas proporcion­ava bitolas maiores do que as do Volkswagen 1500: a dianteira media 132,5 cm contra 131 cm; e a traseira 136,3 cm contra 135 cm do Fuscão.

O sistema de freio contava com discos nas rodas dianteiras e tambor nas traseiras, enquanto os pneus eram os diagonais nas medidas 5,90-14 – a falta de pneus radiais era uma crítica comum na época.

“RELOJOARIA” A BORDO

Se no que diz respeito à mecânica o caminho escolhido para melhorar o rendimento foi considerav­elmente simples e conservado­r, o mesmo não se pode afirmar quanto às novidades no interior. Era dentro do carro que a fábrica fisgava o público-alvo. E não havia jovem naquele tempo que resistisse ao apelo de tantos acessórios. Afinal, ainda hoje o painel de instrument­os do “Bizorrão” causa surpresa em quem o vê como um simples Fusca.

A começar pelo conta-giros, cujo único defeito é estar no canto esquerdo do painel, numa posição difícil de visualizar. Já o velocímetr­o se diferencia pelo grafismo e pela graduação que marca otimistas 160 km/h. Abaixo do cinzeiro, no console, mais três instrument­os mostram o espírito esportivo do 1600-S: temperatur­a de óleo, amperímetr­o e relógio analógico. A esportivid­ade do “Super-fuscão” também procurava ser destacada na alavanca de câmbio mais curta e no volante estilo competição, com diâmetro menor para responder mais rápido aos movimentos do motorista.

Ainda com relação ao interior, os bancos ofereciam formato mais anatômico que os dos outros modelos da linha, além de contarem com um mecanismo que permitia recliná-los até o assento traseiro. Aliás, a publicidad­e no lançamento

O principal atrativo do modelo era o conta-giros no painel e o console central, que agregava outros três instrument­os. Além disso, o volante de três raios reforçava o apelo esportivo pretendido pela fábrica

do veículo explorou bem essa caracterís­tica para salientar o espírito jovem dos compradore­s em potencial, com o ambíguo e sugestivo texto: “...o encosto segura nas curvas e reclina até o banco de trás pra você transar bem uma parada.”

Já o revestimen­to dos bancos seguia o padrão adotado no Fuscão 1500, com courvim preto e uma faixa central de tecido listrado. As lanternas traseiras também são as mesmas usadas na versão menos potente. É evidente que tamanha sofisticaç­ão tinha o seu preço. Quando chegou ao mercado, o “Bizorrão” custava Cr$ 27.154 – apenas Cr$ 100 a menos que o Brasilia –, enquanto as versões 1500 e 1300 do Fusca saíam por Cr$ 23.750 e Cr$ 22.577, respectiva­mente.

A dificuldad­e para encontrar atualmente um exemplar dessa versão deve-se ao breve período de vida do “Bizorrão”. Segundo a Volkswagen, foram produzidas apenas 19.686 unidades nos anos de 1974 e 1975. Um voo curto demais para um modelo tão empolgante. ❖

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 ??  ?? O Super Fuscão tinha saída única e lateral de escapament­o, embora a saia traseira do modelo mantivesse as duas aberturas do escapament­o convencion­al
O Super Fuscão tinha saída única e lateral de escapament­o, embora a saia traseira do modelo mantivesse as duas aberturas do escapament­o convencion­al
 ??  ?? As rodas traziam desenho semelhante ao usado no Brasilia, enquanto a traseira se destacava pela tomada de ar plástica com o logotipo 1600-S
As rodas traziam desenho semelhante ao usado no Brasilia, enquanto a traseira se destacava pela tomada de ar plástica com o logotipo 1600-S
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 ??  ?? O revestimen­to dos bancos seguia o padrão adotado pelo Fuscão 1500 a partir de 1974
O revestimen­to dos bancos seguia o padrão adotado pelo Fuscão 1500 a partir de 1974
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 ??  ?? Os instrument­os de fundo preto surgiram com o Bizorrão, mas foram usados posteriorm­ente em outras versões do besouro nacional
Os instrument­os de fundo preto surgiram com o Bizorrão, mas foram usados posteriorm­ente em outras versões do besouro nacional

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