Dueto de sucesso: todo o charme do VW Porsche 914
Concebido em conjunto com a Porsche, o 914 traduz como nenhum outro automóvel as ligações históricas que sempre uniram as duas marcas alemãs
Mais do que a união de forças de duas das mais importantes empresas automobilísticas alemãs, o nascimento do Vwporsche 914 representou a solução conjunta para dilemas enfrentados por ambas os fabricantes. Um projeto, digamos, bastante conveniente e que coube como uma luva para os anseios vividos tanto em
Wolfsburg como em Stuttgart no final dos anos sessenta.
Na ocasião, mais precisamente meados de 1967, Heinrich Nordhoff ainda era o diretor-superintendente da Volkswagen e quebrava a cabeça na busca de um esportivo que substituísse o Karmann-ghia. Ferry Porsche, por sua vez, precisava de um modelo de entrada para o lugar do 912 (modelo com carroceria de 911, mas com o motor quatro-cilindros de 1.600 cm³ que equipava anteriormente o Porsche 356), mas não tinha recursos para desenvolver um projeto totalmente novo. O acordo Porsche-volkswagen resultou no 914, um esportivo de dois lugares projetado pela Volkswagen, mas com carroceria desenhada pela Porsche e fabricada pela Karmann.
No meio do caminho, entretanto, aconteceram alguns contratempos. Nordhoff morreu em 12 de abril de 1968 e o seu sucessor, Kurt Lotz, acreditava que o preço previsto para o 914 não seria suficiente para gerar o lucro desejado. Foi estabelecida então uma nova empresa, a Vw-porsche Vertreibsgesellschaft Gmbh, na qual Porsche e VW tinham, cada uma, 50% de participação acionária.
No mercado, o 914 surgiu exposto tanto nas concessionárias Porsche como nas Volkswagen – isso nos EUA e na Europa. No Brasil, era vendido exclusivamente pela Dacon, então representante da Porsche no País. De 1970 a 1976, a Dacon vendeu 112 unidades do Porsche 914, sendo que o pico de vendas aconteceu em 1973, com 34 unidades.
VISUAL EXCLUSIVO
Com linhas retas e carroceria estilo “targa” (consagrada pela própria Porsche com a criação do 911 Targa, em 1967), o 914 não se parecia com nenhum outro modelo existente. Tinha 3,98 metros de comprimento, 1,65 m de largura e 1,22 m de altura. As extremidades dianteiras recebiam os sinalizadores de direção, enquanto os faróis
(circulares, alojados em uma moldura quadrada) eram escamoteáveis e só apareciam quando as luzes eram acesas. Na traseira, o logotipo “914 VW Porsche” ficava à direita, entre a lanterna e a fechadura do porta-malas.
A convivência dos logotipos ia além do acordo de produção entre as duas marcas. De fato, o modelo podia ser equipado com alguns acessórios da linha Porsche ou Volkswagen, de acordo com o tamanho do bolso de cada cliente.
Na configuração mais barata, vinha com rodas comuns e calotas com o emblema da VW. Mas ele também poderia ser comprado com rodas esportivas Fuchs disponíveis para os Porsche 911 contemporâneos.
A Volkswagen precisava de um esportivo para substituir o Karmann-ghia, enquanto a Porsche desejava um modelo de entrada para o lugar do 912: assim surgiu o Volkswagenporsche 914, elaborado a quatro mãos
No centro do volante, um terceiro logotipo: o de Wolfsburg, cidade-sede da VW alemã. No Brasil, muitos proprietários também costumavam colocar no centro do capô, próximo ao pára-choque, um emblema da Porsche.
Os primeiros 914 eram equipados com motor VW 1700 (1.679 cm³) de 80 cv. A partir de 1974, a cilindrada aumentou para 1.795 cm³, com o salto de potência para 85 cv. O câmbio manual era o mesmo que a Porsche colocava no 911, com engate de primeira “fora do H” (primeira, terceira e quinta marchas para baixo, segunda e quarta para cima). Ou, como é conhecido nos EUA, arranjo “dog leg”, ou perna da cachorro, em alusão ao cão macho quando põe uma das patas traseira no ar para urinar.
MOTOR CENTRAL
O motor central tem acesso por um estreito capô em cuja grade se lê a palavra “Porsche”. Isso deixa espaço para dois porta-malas, ambos de dimensões relativamente modestas – bastante natural num esportivo – mas assim mesmo com volumes de 160 litros (dianteiro) e 210 litros (traseiro), 370 litros no total. O estepe fica no porta-malas dianteiro, enquanto o traseiro foi projetado para receber a capota.
No interior, destaca-se a presença da alavanca do freio de estacionamento à esquerda do banco do motorista, junto à porta, e a chave de ignição à direita do volante (nos Porsches ela tradicionalmente fica à esquerda).
Poucos meses após a chegada do 914 ao mercado, a Porsche lançou uma versão mais elaborada, denominada 914/6. Equipada com motor Porsche 6 cilindros de 1.991 cm³, desenvolvia 110 cv e superava os 200 km/h. Era um motor mais “manso”, já que no 911 desenvolvia 130 cv (um Vw-porsche nunca poderia ser mais rápido que um Porsche...). Para aumentar a aceitação no mercado americano, essa versão também era disponibilizada com transmissão semi-automática Sportomatic de quatro marchas, com conversor de torque e portanto sem pedal de embreagem. A existência do 914/6 fez com que muitos passassem a chamar a versão com motor de quatro cilindros de “914/4”, mas esta denominação jamais foi usada oficialmente.
Em 1971, Rudolf Leiding sucedeu Lotz no comando da VW. Executivo pragmático, oriundo da Auto Union, Leiding não apreciava projetos complexos com motor central e também não sentia qualquer obrigação em manter as antigas tradições da Volkswagen, como também não via muito futuro no motor refrigerado a ar.
Nessa mesma época, a Porsche começou a projetar seu modelo com motor dianteiro de refrigeração líquida – o 924, que só chegaria às ruas em 1977. Sem novos desenvolvimentos, o 914 começou a ficar ultrapassado. E, em 1976, deixou da linha de montagem a última das 118.947 unidades produzidas – o número inclui as 3.107 unidades da versão 914/6, com motor do Porsche 911, produzidos entre 1970 e 1971.
Em 1972, surgiu o 916 (já sem a parceria com a VW), do qual foram fabricados apenas 10 unidades, todas elas equipadas com motor de 2,4 litros e 190 cv, carroceria rebaixada e para-lamas mais largos para acomodar os pneus maiores. ❖