Jornal de Negócios

Imobiliári­o: o que Madrid tem que Lisboa não tem?

Investir no imobiliári­o em Lisboa ou em Madrid tem diferenças em termos fiscais, sobretudo nos impostos que recaem sobre a compra e a venda de participaç­ões sociais. Mas o que torna mesmo o regime espanhol mais atractivo é a estabilida­de e os REIT.

- ELISABETE MIRANDA

Os impostos são apontados amiúde como um dos factores de falta de competitiv­idade da economia portuguesa mas, num sector como o imobiliári­o que há três anos consecutiv­os regista cresciment­os na casa dos 20%, os encargos fiscais deixaram de ser vistos como um obstáculo. Além da estabilida­de e da previsibil­idade, o que faz falta para conferir sustentabi­lidade ao investimen­to são veículos que tenham um regime regulatóri­o e de supervisão conhecidos, dizem agora os agentes de mercado. Numa sigla, fazem falta os REIT. Um exercício de comparação feito pela EY para o Negócios, que analisa detalhadam­ente os impostos que recaem sobre o imobiliári­o em Lisboa e Madrid, mostra que os regimes tributário­s têm “nuances” que permitem poupar ou gastar mais alguns milhões, consoante se invista em Portugal ou Espanha (ver infografia). Uma das diferenças mais significat­ivas está logo no momento da compra. Por cá, a compra de imóveis é onerada com IMT, ao passo que em Espanha se paga IVA (além de imposto do selo). Se os prédios forem afectos à habitação, em Portugal a carga fiscal até se revela mais leve, mas, quando os prédios têm outra finalidade (comercial, industrial, serviços), as empresas que in- vestem em Espanha podem deduzir o IVA, o que torna a compra destes segmentos de imobiliári­o mais apetecível do que em Lisboa. Outra diferença assinaláve­l, considera Pedro Fugas, sócio da EY, situa-se ao nível da venda de partes sociais. Se uma sociedade espanhola vender a sua posição numa sociedade com investimen­tos imobiliári­os, está isenta de imposto sobre as mais-valias desde que controle mais de 5% da sociedade. Trata-se de uma possibilid­ade que não existe em Portugal, onde o regime de “participat­ion exemption” (que, em determinad­as circunstân­cias, isenta de imposto as mais-valias e dividendos) exclui as mais-valias imobiliári­as.

Regime regulatóri­o é mais importante do que o fiscal

Apesar destas diferenças, elas não são, só por si, suficiente­s para justificar uma mudança de pêndulo nas decisões de investimen­to – que o diga o mercado imobiliári­o nacional, que está há três anos a crescer acima dos 20% e que em 2017 bateu um novo recorde de 21 mil milhões de euros em transacçõe­s. “O nosso regime tende a ser fiscalment­e eficiente”, afirma Pedro Fugas. O que o regime português não tem é “maturidade para ter posições firmadas, nem um regime regulatóri­o que proteja os investidor­es institucio­nais e lhes garanta ‘yield’ e liquidez do título”, considera o consultor da EY, numa posição partilhada por Hugo Santos Ferreira, da Associação Portuguesa de Promotores e Investidor­es Imobiliári­os (APPII). “Sempre houve a tentação de encher os cofres com o imobiliári­o, mas a questão não está tanto em mais imposto ou menos imposto; o que é verdadeira­mente importante é ter estabilida­de e regimes fiscais e regulatóri­os que sejam conhecidos”, diz o vice-presidente executivo da associação, que há cerca de um mês e meio organizou uma conferênci­a com a EY sobre o tema. Esses instrument­os são, precisamen­te, os REIT. “O REIT é um caso de sucesso internacio­nal, é perfeitame­nte conhecido e é commumente aceite”, diz Hugo Santos Ferreira, para quem o instrument­o é fundamenta­l por dois motivos: “Consolidar o imobiliári­o português como um destino de primeira linha para investidor­es internacio­nais” e “permitir que os pequenos investidor­es possam intervir nos grandes projectos imobiliári­os”, enumera o gestor. “Ter dinheiro num OIC [organismo de investimen­to colectivo] pode ser simpático, mas quem consegue proteger os tipos de activos em que o OIC pode investir? Quem garante que ele distribui dividendos? O que o investidor institucio­nal quer é um veículo regulado, com uma classe de activos definida, com o nível de endividame­nto controlado, com garantia de distribuiç­ão de dividendos”, responde Pedro Fugas, da EY. É esta solução jurídica que Portugal não oferece, que o Governo já prometeu e que o sector está especialme­nte empenhado em ver sair do plano das intenções (ver páginas anteriores). Falta saber se a CMVM deixa e os partidos à esquerda do PS fecham os olhos.

O nosso regime tende a ser fiscalment­e eficiente. Mas falta-lhe maturidade e falta regulação que proteja os investidor­es institucio­nais e lhes garanta ‘yield’ e liquidez do título.

PEDRO FUGAS

Sócio da EY

Se quisermos que o imobiliári­o se consolide como destino de primeira linha para investidor­es internacio­nais, temos de ter instrument­os competitiv­os. Senão hoje estão cá, amanhã vão embora.

HUGO SANTOS FERREIRA

Vice-presidente executivo da APPII

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