Imobiliário: o que Madrid tem que Lisboa não tem?
Investir no imobiliário em Lisboa ou em Madrid tem diferenças em termos fiscais, sobretudo nos impostos que recaem sobre a compra e a venda de participações sociais. Mas o que torna mesmo o regime espanhol mais atractivo é a estabilidade e os REIT.
Os impostos são apontados amiúde como um dos factores de falta de competitividade da economia portuguesa mas, num sector como o imobiliário que há três anos consecutivos regista crescimentos na casa dos 20%, os encargos fiscais deixaram de ser vistos como um obstáculo. Além da estabilidade e da previsibilidade, o que faz falta para conferir sustentabilidade ao investimento são veículos que tenham um regime regulatório e de supervisão conhecidos, dizem agora os agentes de mercado. Numa sigla, fazem falta os REIT. Um exercício de comparação feito pela EY para o Negócios, que analisa detalhadamente os impostos que recaem sobre o imobiliário em Lisboa e Madrid, mostra que os regimes tributários têm “nuances” que permitem poupar ou gastar mais alguns milhões, consoante se invista em Portugal ou Espanha (ver infografia). Uma das diferenças mais significativas está logo no momento da compra. Por cá, a compra de imóveis é onerada com IMT, ao passo que em Espanha se paga IVA (além de imposto do selo). Se os prédios forem afectos à habitação, em Portugal a carga fiscal até se revela mais leve, mas, quando os prédios têm outra finalidade (comercial, industrial, serviços), as empresas que in- vestem em Espanha podem deduzir o IVA, o que torna a compra destes segmentos de imobiliário mais apetecível do que em Lisboa. Outra diferença assinalável, considera Pedro Fugas, sócio da EY, situa-se ao nível da venda de partes sociais. Se uma sociedade espanhola vender a sua posição numa sociedade com investimentos imobiliários, está isenta de imposto sobre as mais-valias desde que controle mais de 5% da sociedade. Trata-se de uma possibilidade que não existe em Portugal, onde o regime de “participation exemption” (que, em determinadas circunstâncias, isenta de imposto as mais-valias e dividendos) exclui as mais-valias imobiliárias.
Regime regulatório é mais importante do que o fiscal
Apesar destas diferenças, elas não são, só por si, suficientes para justificar uma mudança de pêndulo nas decisões de investimento – que o diga o mercado imobiliário nacional, que está há três anos a crescer acima dos 20% e que em 2017 bateu um novo recorde de 21 mil milhões de euros em transacções. “O nosso regime tende a ser fiscalmente eficiente”, afirma Pedro Fugas. O que o regime português não tem é “maturidade para ter posições firmadas, nem um regime regulatório que proteja os investidores institucionais e lhes garanta ‘yield’ e liquidez do título”, considera o consultor da EY, numa posição partilhada por Hugo Santos Ferreira, da Associação Portuguesa de Promotores e Investidores Imobiliários (APPII). “Sempre houve a tentação de encher os cofres com o imobiliário, mas a questão não está tanto em mais imposto ou menos imposto; o que é verdadeiramente importante é ter estabilidade e regimes fiscais e regulatórios que sejam conhecidos”, diz o vice-presidente executivo da associação, que há cerca de um mês e meio organizou uma conferência com a EY sobre o tema. Esses instrumentos são, precisamente, os REIT. “O REIT é um caso de sucesso internacional, é perfeitamente conhecido e é commumente aceite”, diz Hugo Santos Ferreira, para quem o instrumento é fundamental por dois motivos: “Consolidar o imobiliário português como um destino de primeira linha para investidores internacionais” e “permitir que os pequenos investidores possam intervir nos grandes projectos imobiliários”, enumera o gestor. “Ter dinheiro num OIC [organismo de investimento colectivo] pode ser simpático, mas quem consegue proteger os tipos de activos em que o OIC pode investir? Quem garante que ele distribui dividendos? O que o investidor institucional quer é um veículo regulado, com uma classe de activos definida, com o nível de endividamento controlado, com garantia de distribuição de dividendos”, responde Pedro Fugas, da EY. É esta solução jurídica que Portugal não oferece, que o Governo já prometeu e que o sector está especialmente empenhado em ver sair do plano das intenções (ver páginas anteriores). Falta saber se a CMVM deixa e os partidos à esquerda do PS fecham os olhos.
O nosso regime tende a ser fiscalmente eficiente. Mas falta-lhe maturidade e falta regulação que proteja os investidores institucionais e lhes garanta ‘yield’ e liquidez do título.
PEDRO FUGAS
Sócio da EY
Se quisermos que o imobiliário se consolide como destino de primeira linha para investidores internacionais, temos de ter instrumentos competitivos. Senão hoje estão cá, amanhã vão embora.
HUGO SANTOS FERREIRA
Vice-presidente executivo da APPII