Jornal de Negócios

O Titanic da educação

- FERNANDO SOBRAL Grande repórter

No melhor diálogo desse filme decrépito como é “Titanic”, alguém pergunta: “Este barco pode afundar-se?” E um marinheiro responde: “É feito de ferro, senhor. Asseguro-lhe que pode afundar-se.” O sector da educação, mais do que todos os outros, é o nosso Titanic. A educação também é feita de ferro e, por isso, vai-se afundando todos os dias defronte dos nossos olhos. Longe vão as reformas revolucion­árias, como as de Veiga Simão, antes do 25 de Abril. Ou mesmo o tempo das paixões, como no consulado de António Guterres. Agora a educação é apenas um albergue espanhol, onde um orçamento descomunal serve para tudo: reformas curricular­es quando um ministro quer ficar na história; acordos ortográfic­os feitos à medida de interesses económicos; burocratas, docentes, tratados como “man power”; e sindicatos que defendem sobretudo os interesses do partido a que pertencem. Pelo meio ficam os alunos, o elo mais fraco da cadeia alimentar em que se transformo­u o Ministério da Educação. O relatório do IAVE, divulgado ontem pelo DN, exemplific­ava o estado de sítio em que vive a nossa educação: 45% dos alunos do 2.º ciclo não conseguiam localizar Portugal no continente europeu utilizando os pontos da rosa-dos-ventos. É por isso que, no meio deste confranged­or panorama, se assiste a um tumulto que promete: os sindicatos de professore­s (cada vez mais) contra o ministro da Educação. Na base do diferendo, o tempo de serviço congelado. Entre nove e dois anos há um fosso do tamanho do Alqueva: todos se podem lá afogar. O problema é que quem vai ter de lutar para respirar são os alunos, que, julgava-se, pudessem ser a razão de haver escolas e docentes. Podem vir a não ter exames, nem notas, nem aulas. Ou seja: para que é que os professore­s os tentam motivar a estudar, se depois isso pode não servir para nada? Com que cara responderã­o os docentes se um aluno lhes perguntar isto? Talvez como o mestre da lucidez fundida, Arménio Carlos: perdeu dinheiro com a greve? Mande a conta ao Governo.

A educação também é feita de ferro e, por isso, vai-se afundando todos os dias defronte dos nossos olhos.

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