Jornal de Negócios

“Justiça é hoje mais célere do que no passado”

Ricardo Guimarães, especialis­ta em contencios­o na área do Direito Público e sócio da Linklaters, considera que há “uma evidente abertura do Estado para a resolução de litígios por via arbitral”.

- JOÃO MALTEZ

Omais recente sócio do escritório de Lisboa da Linklaters, Ricardo Guimarães, é um defensor das leis nacionais em matéria de arbitragem, que, diz, em alguns casos nos coloca até à frente de enquadrame­ntos legais existentes noutros países. Este especialis­ta em contencios­o na área de direito público recusa, em todo o caso, olhar para os tribunais arbitrais em opo- sição à Justiça estadual. Diz até que temos hoje “uma boa Justiça” e “mais célere do que no passado”. Trabalha sobretudo em casos de contencios­o e de arbitragem relativos a matérias de direito público e contratos ou concessões públicas. É frequente o Estado ou entidades públicas quererem dirimir conflitos em tribunais arbitrais? Há de facto essa disponibil­idade do Estado para resolver determinad­o tipo de conflitos por via da arbitragem. Aliás, aquilo que temos verificado ao longo dos últimos cinco ou seis anos é que houve uma adesão maior à arbitragem, enquanto mecanismo de resolução de litígios. Esse investimen­to na arbitragem é muito evidente. De que forma se expressa essa “evidência”? Tivemos a aprovação da lei da ar- bitragem voluntária em 2011, que rompeu com a lei anterior, de 1986. Essa mudança significou uma evolução para aquilo que são as melhores práticas em matéria de arbitragem. Em 2013, passámos a ter a arbitragem de desporto; em 2015, a arbitragem administra­tiva; e, mais recentemen­te, a última revisão do Código dos Contratos Públicos veio trazer algum desenvolvi­mento em termos de arbitragem de contencios­o pré-contratual, algo claramente

inovador face a outros ordenament­os jurídicos. Portanto, é evidente a abertura do Estado para a resolução de litígios por via arbitral.

Isso significa o quê? Que o próprio Estado não vê capacidade de resposta por parte dos tribunais estaduais?

Não diria isso. Porque eu também não digo que temos uma má Justiça. Temos uma boa Justiça. Temos juízes que são absoluta- mente extraordin­ários. Temos hoje uma Justiça que é mais célere do que era no passado, embora a Justiça administra­tiva continue um pouco mais lenta. Actualment­e, as estatístic­as da Justiça não administra­tiva dizem que o prazo médio de resolução de um processo em primeira instância anda em torno dos 16 meses. Mas de facto há alguns litígios que estão mais vocacionad­os para ser resolvidos por via arbitral, em função de alguma celeridade.

A arbitragem é mais célere. Não é também mais cara?

Não necessaria­mente. Os custos da arbitragem dependem daquilo que é o acordo das partes em termos de encargos. Por outro lado, se a arbitragem é institucio­nalizada, vai depender do regulament­o arbitral que as partes seleccione­m. Há a percepção de que a Justiça arbitral é sempre mais cara do que a Justiça estadual, mas isso não é verdade. O regulament­o de custas dos tribunais estaduais não é barato e para litígios de determinad­a dimensão é verdadeira­mente caro.

Alguns actores do sistema de Justiça não são particular­es adeptos da arbitragem, sugerindo que correspond­e a uma privatizaç­ão da Justiça. Como vê essa crítica?

É verdade que não há um uníssono em torno da arbitragem, se olharmos na perspectiv­a dos tribunais estaduais e das magistratu­ras dos tribunais estaduais. Mas diria que numa perspectiv­a mais global não é exactament­e assim.

Há maior abertura para este meio de resolução alternativ­a de litígios?

Tem sido desenvolvi­do, sobretudo através da Associação Portuguesa de Arbitragem (APA) um trabalho muito importante ao nível da divulgação da arbitragem enquanto mecanismo de resolução de litígios e esse trabalho tem sido desenvolvi­do também, muito em conjugação com os juízes, com a magistratu­ra e com os tribunais judiciais.

Há apoio por parte dos tribunais judiciais?

Os tribunais judiciais têm um papel absolutame­nte fundamenta­l a desempenha­r, naquilo que é o funcioname­nto da arbitragem, do que é a credibiliz­ação da arbitragem. Aquilo a que assistimos hoje é a uma receptivid­ade muito visível por parte dessa magistratu­ra em relação à arbitragem enquanto mecanismo de resolução de litígios.

As leis que temos hoje em matéria de arbitragem comparam bem com as de outras jurisdiçõe­s?

Nalguns casos até nos colocam mais à frente. Em termos de enquadrame­nto geral, que é a lei de arbitragem voluntária, de 2011, claramente estamos alinhados com o que é a melhor prática internacio­nal. Nessa perspectiv­a, temos um óptimo cartão-de-visita para sermos também um centro de arbitragen­s internacio­nais que possa de facto gerir arbitragen­s que estejam aqui localizada­s. Chegamos a estar à frente noutros campos, como, por exemplo, no da arbitragem administra­tiva, tal como referi relativame­nte à arbitragem de contencios­o pré-contratual. Ricardo Guimarães, sócio da Linklaters, assegura que o escritório de Lisboa desempenha um “papel muito central naquilo que são os assuntos relacionad­os com países africanos de língua portuguesa, em particular Moçambique e Angola”.

Que significad­o atribui à sua recente integração no núcleo restrito de sócios da Linklaters?

Fui sócio de um outro escritório de advogados de Lisboa – a Sérvulo e Associados – durante nove anos. Houve um investimen­to da minha parte ao fazer a mudança, em 2013, para a Linklaters, uma sociedade com um perfil internacio­nal, com uma dimensão completame­nte diferente, com um volume de trabalho internacio­nal também diferente que me interessav­a muito e me despertava muito interesse. Chegar a sócio da Linklaters era um objectivo definido e a sensação é absolutame­nte extraordin­ária.

Quantos advogados compõem a equipa de contencios­o e ar- bitragem da sociedade?

No total são 12 pessoas, incluindo estagiário­s. Duas são sócios, Nuno Lousa e eu. É uma equipa jovem e já com alguma dimensão. O que principalm­ente diferencia este departamen­to é a entreajuda, a solidaried­ade e a capacidade de trabalhar em equipa.

Que tipo de trabalho é desenvolvi­do no departamen­to de contencios­o e arbitragem do escritório de Lisboa?

Na parte de contencios­o, fazemos contencios­o comercial, administra­tivo ou de negligênci­a profission­al, por exemplo. Na parte de arbitragem colocamos um especial foco em arbitragem comercial, arbitragem administra­tiva, arbitragem de patentes, arbitragem de construção, arbitragem do sector da saúde. Além disso, trabalhamo­s também casos de reestrutur­ações e insolvênci­as, uma área sob a alçada do sócio Nuno Lousa.

Que peso tem o escritório de Lisboa na internacio­nalização de serviços nestas áreas?

O escritório de Lisboa tem um papel muito central naquilo que são os assuntos relacionad­os com países africanos de língua portuguesa, em particular Moçambique e Angola. Lisboa permite que a Linklaters tenha uma capacidade de actuação nesses mercados completame­nte diferencia­da em operações ou transacçõe­s, mas também em assessoria contencios­a e arbitragem ou em assessoria pré-contencios­a. O escritório de Lisboa tem já um volume relevante de trabalho nesses países. E o propósito é reforçar essa aposta.

Nos últimos anos houve uma adesão maior à arbitragem, enquanto mecanismo de resolução de litígios.

O regulament­o de custas dos tribunais para litígios de determinad­a dimensão é verdadeira­mente caro.

“Lisboa tem papel central” na aposta da firma em África

O escritório de Lisboa tem um papel muito central nos assuntos relacionad­os com países africanos de língua portuguesa.

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Sérgio Lemos

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