CLXXXI. Caro Éder
Sei que tu sabes que eu tinha prometido não perorar sobre futebol devido a tratar-se de uma matéria tóxica e facilmente inflamável. Contudo, como também sabes, a realidade é dinâmica e esta missiva que te dirijo não é propriamente sobre futebol, mas sim sobre a selecção nacional que é uma coisa bem diferente em quase todos os aspectos, exceptuando talvez na bola. Escrevo-te porque pressinto a tua tristeza por não ires à Rússia com os teus colegas do Europeu, perdendo assim as noitadas de sueca ( jogo de cartas, não fazer confusão), as tardes de bingo e as conversas profundas com o seleccionador nacional sobre o existencialismo na obra de Camus e que na Rússia, tudo indica, versariam sobre o surrealismo na escrita de Dostoievski. Escrevo-te para dizer que não estás esquecido na selecção, e que embora não estejas lá em corpo te encontras presente em espírito, conforme poderás constatar através da leitura deste diálogo que um primo da Cesaltina minha amiga do peito (e de outras partes) gravou, enquanto servia “cordon bleu” (é amesquinhar os franceses enquanto se puder) aos integrantes da selecção nacional no Museu dos Coches, registando-se neste jantar o facto de o Presidente Marcelo ter apenas digerindo um croissant misto de modo a não criar incidentes diplomáticos. Cristiano Ronaldo CR) – Sinto falta do Éder. Fernando Santos (FS) – Onde é que ele se meteu! Não me digam que ficou na cidade do futebol a arranjar as tranças? João Moutinho (JM) – Não. O mister não o convocou. Fernando Santos – O quê? Onde é que tinha a cabeça! Ó Fernando Gomes, ainda é possível alterar a convocatória? Fernando Gomes (FG) – Não. FS – Com vocês, também, nunca nada é possível. Já quando quis convocar cinco guarda-redes foi a mesma resposta. E, agora, como é que resolvo o jogo da final? Ó Cris, quem é aquele que está ali ao lado do João? CR – É o Mário Rui, defesa-esquerdo. FS – Não me venham dizer que também não convoquei o Eliseu! FG – Na realidade, não. FS – Sem o Éder, nem o Eliseu. Devo ter saltado os “e” quando fiz a convocatória. Que chatice. Marcelo Rebelo de Sousa (MRS) – Ó mister, qual será a táctica para o Mundial? FS – Senhor Presidente, apesar das falhas, veja lá que me esqueci do Éder e do Eliseu, vou manter a mesma estratégia de França. Jogar para o empate de modo a conseguir a vitória quando formos à final. MRS – Mas, sem o Éder, como é que faz isso FS – Ponho o Mário Rui a ponta-de-lança. MRS – E quem é o Mário Rui? FS – Fico mais descansado. Afinal, não sou o único que não o conhecia e por isso mesmo será a grande surpresa do torneio. JM – Mister, que tal convidar o Éder para nosso mental “coach”? FS – Isso podia ser uma boa ideia, não se desse o caso de já ter convidado o ministro Mário Centeno para o efeito, visto ele ser conhecido como o Cristiano Ronaldo das Finanças e porque nos dá jeito ter dois Cris, mesmo que um não jogue. Mário Rui (MR) – Mister Fernando, porque não convocou o Éder? FS – Por causa de ti. MR – Que chatice. Por mim, também não ia porque já tinha combinado coisas para o Festival da Músicas do Mundo, em Sines. Há tempos que não vou à terra. FS – Cris, afinal qual foi o outro ponta-de-lança que convoquei? CR – O Gonçalo Guedes. FS – Mas esse não é ponta-de-lança! CR – Também pensei isso, mas não quis contrariá-lo. ? FS – Pronto. Está decidido. O Mário Rui vai mesmo ser a arma secreta. Vou pôr o Nélson Semedo e o Fábio Coentrão a treinarem cruzamentos para ele. JM – Olhe que o Nélson e o Fábio também não fazem parte de convocatória. FS – Bom, o melhor é marcarmos uma reunião para amanhã, de modo a conhecer os jogadores. Doutor Gomes, pode tratar disso? Entretanto, vou ligar ao Éder a dizer-lhe que conto com ele para o próximo Europeu.
Um abraço deste que te admira,
VIRGOLINO FANECA