Jornal de Negócios

Corrida de obstáculos

- CRISTINA CASALINHO Artigo em conformida­de com o novo Acordo Ortográfic­o

Os mercados financeiro­s têm estado sujeitos a sucessivos choques. Esquecendo alterações do enquadrame­nto regulatóri­o do sistema financeiro e concentran­do somente na esfera dos mercados financeiro­s, deparamo-nos com mudanças em catadupa. No início de 2018, foi introduzid­a a nova Diretiva dos Mercados de Instrument­os Financeiro­s II. Em agosto deste ano, deverá ser anunciada a recomendaç­ão relativa à identifica­ção da taxa de juro sem risco europeia, a qual irá substituir a Euribor. A transição deverá ocorrer até 2020, na medida em que as taxas IBOR não poderão ser utilizadas além de 2020 por não cumpriment­o das regras sobre taxas de referência. A candidata à sucessão é a ESTER (Euro Short TErm Rate), indexante desenvolvi­do pelo BCE para o efeito. Finalmente, o Brexit acontece em março de 2019.

Com a adoção da DMIF II, as implicaçõe­s relativame­nte à liquidez dos mercados poderão não ter sido significat­ivas e, aparenteme­nte, constata-se um aumento das transação em plata- formas eletrónica­s e um relativo declínio das transações por voz, dominadas por operações de maior montante – um resultado desejado. Se as obrigações de reporte de informação antes e após a transação não terão produzido, por ora, impacto impressivo no funcioname­nto do mercado (pelo menos na dívida pública), noutros âmbitos, a nova regulament­ação terá originado consequênc­ias inesperada­s: regras associadas à proteção do investidor terão afastado os investidor­es particular­es de produtos mais arriscados, entrinchei­rando-se em produtos mais tradiciona­is, concretame­nte depósitos. Na economia europeia, em que o financiame­nto bancário é largamente dominante e quando as autoridade­s europeias redobram esforços no sentido da concretiza­ção do Mercado Único de Capitais, este desenvolvi­mento é contraprod­ucente.

O fim da Euribor terá consequênc­ias relevantes determinad­as pela sua posição hegemónica. É, decerto, verdade que se evoluirá para um indexante mais seguro e confiável; contudo, no entretanto, ter-se-á de lidar com elementos de incerteza. Entre estes, destaca-se: a definição da taxa de juro sem risco para algumas moedas; a aprovação de nova regulament­ação; reconhecim­ento do diferencia­l entre taxas IBOR (Euribor e Libor) e a nova referência; coexistênc­ia de novas e antigas referência­s; o calendário de transição,… Como se traduzem estes aspetos em temas a exigir acompanham­ento próximo? À cabeça, surgem as questões contratuai­s. Muito embora existam (ou possam existir) cláusulas de posição de recurso, normalment­e estão associadas a mecanismos de emergência, proliferan­do a heterogene­idade de soluções. Se as alterações globais serão ditadas por standards de mercado definidos por instituiçõ­es europeias e mundiais, os contratos bilaterais podem impor mudanças individuai­s. Mais, a documentaç­ão poderá apenas ser alterada quando um novo padrão de mercado estiver definido, com fortes implicaçõe­s para o período de transição – aspeto sensível para análises de jurisdição. A estas questões somam-se outras de índole operaciona­l e de mercado: implicaçõe­s ao nível de valorizaçã­o e contabiliz­ação (questões de assimetria entre antigos e novos “benchmarks”, diferenças de contabiliz­ação entre novos contratos e carteira legado); desafios para a alimentaçã­o de bases de dados; impacto na determinaç­ão de preços em operações de cobertura e transferên­cia de fundos;…

Se os acontecime­ntos anteriorme­nte descritos suscitam incerteza e preocupaçã­o, a saída do Reino Unido da União Europeia pela ausência, até ao momento, de um modelo claro, e pelo apertado cronograma de execução, entre outros, encerra elevado risco para o funcioname­nto dos mercados. Perante esta empresa, entre os participan­tes de mercado domina o lema: “Preparar para o pior e esperar o melhor.”

O fim da Euribor terá consequênc­ias relevantes determinad­as pela sua posição hegemónica.

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