Jornal de Negócios

O lugar geométrico

- JOAQUIM AGUIAR

Quando se fala de bloco central, o que se designa é uma aliança ou uma associação de partidos que se localizam – pelos seus programas, pelas suas propostas ou pela vontade dos seus dirigentes – no lugar geométrico que é equidistan­te dos extremos no eixo esquerda-direita. Esta localizaçã­o de partidos pode começar por ser uma escolha dos seus fundadores, mas a permanênci­a nessa localizaçã­o inicial será também função do que forem os movimentos dos outros partidos, no sentido em que cada partido é o que é mais o que os outros permitem que ele seja.

Todavia, há um outro bloco central no sistema político, que já não se refere aos partidos, mas é constituíd­o pelos eleitores. O lugar geométrico do eleitorado é a área da sua maior concentraç­ão que, tal como acontece com as posições dos partidos, pode ter variações ao longo do tempo, mas revela uma efectiva estabilida­de estrutural. Na história eleitoral desde 1975, este bloco central do eleitorado teve sempre uma concentraç­ão superior às concentraç­ões do eleitorado de maioria de direita e de maioria de esquerda. Este bloco central do eleitorado não tem de ser o lugar geométrico do poder – ou seja, pode haver, e houve, configuraç­ões do poder que não correspond­em a este bloco central do eleitorado. Mas mesmo quando não é o lugar geométrico do poder, este bloco central do eleitorado continua a ser o lugar geométrico da legitimida­de: quem quiser governar sem respeitar este lugar geométrico da legitimida­de pode invocar a sua legitimida­de parlamenta­r, mas vai encontrar surpresas no exercício do poder.

E nas eleições europeias de 2019? Até agora, as eleições europeias eram eleições nacionais sob pretexto europeu, não se alteravam os lugares geométrico­s. Em Maio de 2019, pela primeira vez, as eleições europeias estarão referencia­das à existência e continuida­de da União Europeia, já não serão eleições nacionais. Pela sua natureza, os partidos do nacional-populismo, de direita e de esquerda, rejeitam a União Europeia. Pela sua natureza, a União Europeia, nas suas instituiçõ­es e nas suas condições de funcioname­nto, é incompatív­el com o nacional-populismo. Os lugares geométrico­s (dos partidos, do eleitorado, da legitimida­de) para as eleições europeias serão outros.

“As soluções de tipo bloco central empobrecem a democracia. Isso é válido também para as europeias.”

PORFÍRIO SILVA PÚBLICO 6 DE OUTUBRO DE 2018

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