“A atitude perante Bruxelas tem de mudar”
PAULO SANDE CANDIDATO DA ALIANÇA ÀS EUROPEIAS
Na primeira entrevista após ser apresentado como cabeça-de-lista da Aliança nas eleições europeias de Maio, Paulo Sande reivindica um europeísmo crítico do que está mal e promotor de mudanças.
Afirma-se um europeísta de centro-direita. É essa também a génese da Aliança?
Sou de centro-direita, mas essencialmente um liberal. Acho, contudo, que o Estado deve garantir uma boa regulação do funcionamento da economia e da sociedade. Nunca tive filiação partidária, mas tenho proximidade ideológica em relação à Aliança.
Tem condições para ser eleito para o Parlamento Europeu? Ou a sua candidatura é uma espécie de barómetro à capacidade eleitoral deste recém-criado partido com vista às legislativas?
Acredito profundamente que vou ser eleito e que seja eleita mais gente da Aliança. Acho que é possível fazer a diferença, mas ainda não sei exactamente como, até porque não há ainda uma lista formada.
Terá mais independentes?
Um bocadinho dos dois, é preciso experiência, juventude e caras novas e o Pedro Santana Lopes tem salientado isso. AAliança é um projecto para ganhar, não é para fazer balões de ensaio para nada. As eleições europeias, pelo significado que vão ter para a Aliança, podem ser o momento de arranque deste projecto em termos eleitorais.
Estabelece algum patamar mínimo de votação?
Não. O tempo o dirá, mas a ambição é eleger mais do que um deputado. Eleger o maior número possível e isso dependerá da credibilidade que as pessoas derem ao nosso discurso.
Se não for eleito, vai continuar a assessorar Marcelo Rebelo de Sousa?
Vou. O sr. Presidente já o disse.
A Aliança tem evoluído nas declarações sobre a UE, mas o próprio Santana Lopes fala na necessidade de reforçar a atitude de Portugal face a Bruxelas. Houve mesmo dirigentes com declarações eurocépticas. Como profundo europeísta, candidatar-se pela Aliança pode ser um contra-senso?
Acho que não pode nem deve. Em primeiro lugar porque a minha candidatura é a minha candidatura. Serei cabeça-de-lista nestas eleições europeias e clarifiquei, com Santana Lopes, a natureza europeísta desta candidatura. Coisa diferente é levar as pessoas a perceber o que está verdadeiramente em causa. Porque criticar procedimentos, instituições e formas de fazer não significa rejeitar o projecto europeu. Isto tem de ficar muito claro.
Quem faz essas leituras são os próprios partidos ou não?
Todos em geral. Até diria que para consumo eleitoral, para fins de propaganda política. E muitas vezes acaba por ser assimilado como um discurso antieuropeísta. Quero ser muito claro na defesa da Europa, mas uma coisa que tem de ficar clara, e esta é uma oportunidade para o fazer, é que defender a integração europeia e que os povos europeus devem caminhar juntos para o futuro não significa que não há muitas coisas a mudar e que devem ser mudadas. Portugal tem de ser muito mais activo nisso.
Os sucessivos governos portugueses não têm sido?
Não têm sido, desde sempre.
A ideia do bom aluno é contrária a esse activismo?
Gostamos muito de nos inserir e fazer parte, sermos bem-vistos. Acho lindamente, é uma das nossas qualidades e que faz termos tantos portugueses em cargos de liderança. Mas o que me interessa mais são os outros portugueses todos. É altura de fazermos da soma dos indivíduos notáveis que os portugueses espalharam e continuam a espalhar pelo mundo inteiro um colectivo actuante. Não é fácil. Os governos têm de fazer o mesmo. A atitude perante Bruxelas tem de mudar, não necessariamente num sentido de resistência, mas no sentido da concretização de objectivos. A ideia é fazer propostas concretas e exequíveis. E daqui até Maio vão surgir. A integração europeia tem de ser boa para Portugal, não sou masoquista nem maluco. Temos de transformar o nosso mérito individual numa acção colectiva verdadeiramente eficaz. E não termos medo de o fazer, não temos de nos integrar e ficar dissolvidos no colectivo europeu.
Críticas à “obediência cega a Bruxelas” como as que foram feitas por elementos da Aliança têm sido vistas como uma tentativa de ocupar a vaga populista e eurocéptica existente no quadro partidário à direita. É justa esta análise?
Obediência cega a Bruxelas não interessa a ninguém e é detestável porque não devemos obedecer cegamente a ninguém. Mais uma vez estamos a simplificar. Temos de fazer esta crítica de forma construti- va para obter o melhor resultado possível. Ao convidar-me, com certeza que a Aliança não está querer ocupar esse espaço.
Teme eventuais consequências da agitação que a sua escolha gerou, sobretudo por permanecer como assessor do Presidente da República?
O senhor Presidente já respondeu lapidarmente a essa questão, a lei prevê essa possibilidade. Se a lei não protegesse as pessoas nestas circunstâncias, estava a limitar o campo de participação cívica. Só os políticos profissionais é que teriam possibilidade de o fazer. Certo é que não vou fazer nada contra a minha matriz. Obviamente serão evitadas todas as situações que possam ser ambíguas. Falarei das ideias que tenho e, até o mais tarde possível, não criticarei as propostas de outros partidos.
“A integração europeia tem de ser boa para Portugal.”
“Acredito profundamente que vou ser eleito (...) A Aliança é um projecto para ganhar, não é para fazer balões de ensaio.”
O que pensa a Aliança sobre questões-chave para a Europa? Vai defender a revisão dos tratados?
Nesta altura, não faz sentido falar em alterações aos tratados. São 28 países, em breve 27, e é muito difícil conseguir a unanimidade de tantos países e das respectivas opiniões públicas. Pôr 28 países de acordo sobre medidas com significado é virtualmente impossível. Nesta fase, devemos ir tão longe quanto possível naquilo que é melhor para a Europa, na reforma do que já existe.
Isso traduz-se em quê? Num orçamento comum, num seguro comum de depósitos?
Um orçamento comum não. Na reforma que está em curso estamos a meio da ponte.
Mas o Governo tem feito declarações nesse sentido, de que é preciso chegar ao fim da ponte.
É verdade. Mas dizer, como aconteceu após o último Eurogrupo, que foram feitos grandes avanços, não me parece rigoroso. Os mecanismos de solidariedade na parte orçamental e na união bancária ainda são insuficientes. O Banco Central Europeu tem tido um papel decisivo com a compra de dívida…
A proposta franco-alemã vai no sentido de criar uma dota- ção orçamental capaz de assumir esse papel do BCE.
A ideia é substituir este modelo mais ou menos “ad hoc” por um modelo institucionalizado. Mas acho que é também preciso fazer mais na regulação do mercado de capitais e ter uma capacidade fiscal.
Com maior integração?
E maior solidariedade. Apesar de todos os movimentos a que temos vindo a assistir, a UE continua a ser fulcral para os países europeus. Mas os estados têm de perceber, e a Alemanha em primeiro lugar, que os países com superavit orçamental, que o défice orçamental e o crescimento das dívidas dos menos afortunados e com mais dificulda- des, como é o caso de Portugal, não contribui para o progresso comum.
Em relação às duas medidas principais que não avançaram – fundo comum de depósitos e orçamento comum –, a Alemanha rejeita a primeira e propõe a segunda…
Todas essas contradições estão relacionadas com a política interna. E havendo eleições europeias em 2019, isso será ainda mais determinante. O papel clarificador de alguns países é fundamental.
Vai defender mudanças específicas para mais integração?
Não vou defender mais integração, mas melhor integração. Falta que tudo isto seja feito de forma mais propícia ao desenvolvimento europeu, o que passa pela convergência, pela coesão económica e social, o que depende da solidariedade e da sustentabilidade. Este tripé convergência-competitividade-solidariedade tem de ser criado.
As medidas acordadas são, ou não, suficientes para proteger o bloco do euro dos efeitos de uma eventual nova crise?
Não me parece que sejam. Mas como ficou tudo para o Conselho Europeu, pode ainda haver algum avanço em relação aos pontos que referimos, mas aquilo que foi decidido no Eurogrupo não é suficiente para criar essas condições.