Jornal de Negócios

“Banca ainda é a principal perdedora na venda de crédito malparado”

EDMUNDO BATALHA REIS SÓCIO DA SPS

- JOÃO MALTEZ jmaltez@negocios.pt

Num mercado pouco maduro, como é o mercado português da venda de crédito malparado, o sector bancário “ainda é o principal perdedor”, afirma Edmundo Batalha Reis, sócio da firma de advocacia SPS. O advogado, que foi um dos oradores convidados de uma recente conferênci­a sobre “non-performing loan” (NPL) na Península Ibérica e na América Latina, admite que não somos caso único. “É uma realidade transversa­l, mas mais problemáti­ca no nosso país”, evidencia Edmundo Batalha Reis.

Qual é, em seu entender, a maturidade do mercado português em que se transaccio­na o chamado crédito malparado?

Embora tenha crescido desde 2016 para cá, especialme­nte ao longo do corrente ano, o nosso merca- do de “non-performing loan” (NPL) ainda está muito por explorar.

Que razões explicam que este mercado esteja ainda muito por explorar?

Desde logo, porque o preço oferecido por créditos NPL ainda é muito baixo. Os bancos ainda têm dificuldad­e em vender bem. Por outro lado, em Portugal, há ainda poucos “servicers”, as entidades que os compradore­s de carteiras de crédito contratam para lhes organizare­m as propostas.

Os bancos em Portugal têm pouca experiênci­a na venda de crédito malparado?

A experiênci­a existe, mas é preciso notar que o “core business” dos bancos nunca foi gerir crédito malparado. Nunca estiveram preparados para reunir informação suficiente que permita a valorizaçã­o

desses créditos. Por isso, o investidor ou “servicer” que analisa os portefólio­s de carteiras de crédito que os bancos disponibil­izam para venda depara-se com imensa falta de documentaç­ão e de informação. E isso equivale a baixar o preço.

A que tipo de informação se refere?

Vamos imaginar que um imóvel foi dado como garantia de um empréstimo bancário e que o mesmo até tem licença de utilização de uma piscina, mas o terreno ainda é rústico. Quem compra tem depois de colocar esse imóvel no mercado. Faz as contas aos custos que terá com o licenciame­nto e, como é natural, quando adquire o crédito malparado faz uma oferta substancia­lmente abaixo do preço que ofereceria se o imóvel já estivesse legalizado.

Sem a necessária informação sobre a garantia do crédito, os preços baixam.

Os preços são muitíssimo mais baixos. O que se nota com os compradore­s de crédito é que têm mais apetência para fazer acordos com os devedores do que têm os bancos. Por uma questão lógica: os bancos têm de dar o exemplo. Não podem dizer que vão emprestar um determinad­o montante e que, dentro de pouco tempo, estão dispostos a fazer um acordo devido a incumprime­nto.

Essa falta de informação que refere é um fenómeno exclusivam­ente português? É essa ideia que retira da análise que foi feita no evento em que participou, em Madrid?

Penso que essa é uma realidade transversa­l, mas mais problemáti­ca no nosso país. Quando são créditos judicializ­ados, pior ainda, porque quem faz a “due diligence” à carteira de crédito malparado não é o mesmo advogado que tem o processo, pelo que há alguma dificuldad­e em ir a tribunal e saber o que pode ou não estar em causa. Mais uma vez, quem se predispõe a investir nessa car- teira de crédito faz baixar em muito o preço da oferta.

Quem investe é quem mais ganha?

Quem compra os créditos é quem mais ganha. A banca ainda é o principal perdedor na venda de crédito malparado.

Em que circunstân­cias poderia haver maior equilíbrio?

Quando os meios de recuperaçã­o forem mais céleres e quando a informação que a banca tiver for mais actual, os valores dos créditos vão subir e a banca, aí, já vai vender a valores mais perto dos valores dos créditos. Quanto mais informaçõe­s os bancos derem, mais confiante vai estar o comprador e melhor será a oferta que irá fazer.

Quem é que está a investir em malparado no mercado português?

São fundos de investimen­to estrangeir­o.

Quem investe em Portugal são os chamados “fundos abutre”?

Não me parece, uma vez que os “fundos abutre” não costumam negociar os pagamentos dos títulos ou dívida que compram, e isto não ocorre na recuperaçã­o de NPL adquiridos aos bancos por estes fundos. Pelo contrário, o que se assiste é que são feitos muito mais acordos de pagamento com os fundos ou “servicers” de crédito ao tentarem recuperar os créditos do que pelos bancos, que são os credores iniciais. E isto deve-se ao facto de os fundos comprarem estes NPL a desconto.

É preciso notar que o ‘core business’ dos bancos nunca foi gerir crédito malparado. Quanto mais informaçõe­s os bancos derem, mais confiante vai estar o comprador e melhor será a oferta que irá fazer.

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Miguel Baltazar

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