Alojamento local já ocupa 41% das casas do centro histórico
A corrida ao alojamento local antes da entrada em vigor da nova lei teve consequências pesadas no centro de Lisboa. Quando o limite de 25% foi aplicado, já o peso do alojamento local ia muito além disso.
ACâmara Municipal de Lisboa proibiu a abertura de novos alojamentos locais em várias zonas de Lisboa, definindo que os arrendamentos de curta duração a turistas não podem ocupar mais de 25% das casas, limiar a partir do qual o executivo camarário entende “começar já a causar perturbação”. Acontece que, quando esse limite produziu efeitos, a 9 de Novembro, já a realidade tinha ido muito além.
Segundo contas do Negócios, feitas a partir de dados oficiais, 41% das casas do coração histórico de Lisboa (freguesia de Santa Maria Maior) já estão destinadas a turistas. Esta percentagem resulta do cruzamento entre o número de casas destinadas ao arrendamento de curta duração, registadas oficialmente, com o univer- so de casas apuradas pelo INE nos Censos de 2011 (e que não deverá ter sofrido grandes alterações). É um cálculo aproximado, que pode pecar por defeito por não incluir os alojamentos ilegais e por excesso por incluir casas que deixaram entretanto de estar destinadas a turistas.
Os 41% registados no final de Novembro comparam com os 34% apurados pelo Negócios em Agosto (idêntico aos dados avançados num estudo da câmara) e 15% apurados há dois anos num estudo encomendado pela Associação de Hotelaria de Portugal.
Por cada quilómetro quadrado da freguesia de Santa Maria Maior – Alfama, Castelo e Mouraria –, há quase 3.000 alojamentos locais com capacidade para albergar mais de 15 mil turistas, segundo os registos oficiais. Nos períodos em que estes alojamentos estão cheios, tipicamente no Verão, por cada 100 residentes há 184 a 197 turistas a pernoitar nestes bairros. Há poucos meses, o presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, Miguel Coelho, dizia ao Negócios que estima que “passem pela freguesia 250 mil pessoas”.
A segunda freguesia mais pressionada em Lisboa é a Misericórdia – Bairro Alto, Santa Catarina e Cais do Sodré –, onde a quota do alojamento local atingiu os 35% no momento em que foi vedada a abertura de novas unidades – 10 pontos acima do limite definido pela câmara. Três meses antes, a percentagem era de 28% e dois anos antes de 12%. Também aqui, na época alta, será fácil encontrar em algumas noites mais turistas a dormir na freguesia do que residentes. Ainda esta semana a presidente da Junta de Freguesia da Mi-
A câmara não se pode ter atrasado [a definir quotas] porque respondeu no dia a seguir à lei ter entrado em vigor. Andávamos a trabalhar neste processo há bastante tempo, mas não tínhamos lei habilitante para tomarmos medidas.
MANUEL SALGADO
Vereador do Urbanismo da Câmara Municipal de Lisboa
sericórdia disse, ao DN, que “esta freguesia está a tornar-se cada vez mais um dormitório de turistas”.
Questionado sobre se a câmara não terá demorado demasiado tempo a intervir na preservação da habitação nos bairros históricos, Manuel Salgado diz que não. “A câmara não se pode ter atrasado porque respondeu no dia a seguir à lei ter entrado em vigor. Andávamos a trabalhar neste processo há bastante tempo, mas não tínhamos lei habilitante para tomarmos medidas”, disse o vereador do Urbanismo, em referência à lei aprovada pelo Parlamento que teve um período de transição antes de entrar em vigor.
Durante este período, o crescimento do alojamento local foi transversal a todo o centro da cidade. Nas freguesias de Santo António e São Vicente, a percentagem de casas destinadas a turistas passou em três meses de 15% e 12% para 18% e 14%, respectivamente. Em bairros como Arroios ou Estrela, a quota já chega aos 9% e 8%.