Quem muda o Montepio?
António Tomás Correia é presidente da Associação Mutualista Montepio Geral desde 2008. Está no cargo há 10 anos. Só isso deveria ser suficiente para não se candidatar. Há outras razões de força maior. Quem se recandidata tem à partida várias vantagens. Está na estrutura, é conhecido, tem obra feita para apresentar. O que fez Tomás Correia pelo Montepio? Nesse prestar de contas háque olhar paraelas. O que deixou para o sucessor, que pode até ser ele próprio? Os últimos números conhecidos, os de 2017, são lucros de 831 milhões. Mas é importante salientar que 95% deles foram conseguidos com uma cosmética chamadacréditos fiscais, que parase materializarem exigem lucros elevadíssimos que a associação nunca terá. São também esses créditos fiscais que garantem que os capitais próprios são positivos.
O problema nas contas da associação mutualista resultam do seu maior activo, a Caixa Económica Montepio Geral, que é também o principal garante dos produtos mutualistas. Ora a caixa económica foi obrigada a registar enormes imparidades que vêm do tempo em que Tomás Correia era presidente das duas instituições. Perdas que resultaram de créditos concedidos a empresários e empresas que se cruzam com o colapso do BES, como o empresário José Guilherme, ao próprio GES, ou de investimentos em dívida estruturada da PT. Algumas, como noticiou ontem o Público, ignorando as regras de risco do próprio banco.
A isto acresce a falta de transparência, com a divulgação de contas consolidadas a destempo. Em vez de crescer, o número de associados está a baixar.
Só isto deveria bastar para que na associação mutualista o desejo fosse de mudança. Acresce que Tomás Correia é arguido num processo relacionado com a Operação Marquês, suspeito de ter recebido 1,5 milhões de José Guilherme. Há ainda dois processos a correr no Banco de Portugal.
Estranhamente, ou talvez não, há uma mobilização de figuras gradas do regime, representadas na sua comissão de honra, para manter o status quo. O que temem?
O próximo presidente da Associação Mutualista Montepio Geral deve ser alguém idóneo e ter a sua idoneidade avaliada, com capacidade de liderança e gestão, conhecedor da actividade, imbuído dos princípios da economia social.
Numa conferência organizada este ano pelo Centro de Estudos de Economia Pública e Social, Tomás Correia salientou a resiliência dos bancos da economia social durante a crise, o que atribuiu ao “respeito por regras que são muito próprias das instituições da economia social, com valores que são muito seus, com princípios que fazem questão de, em cada dia, aprofundar e colocar em prática”.
Desses princípios fará parte certamente a ética, a transparência, a dedicação ao bem comum, e as boas práticas. Provou o presidente do Montepio ser respeitador destes valores? A sua eleição é o que melhor serve a preservação das poupanças e a afirmação da economia social? É o que se devem questionar os associados do Montepio.