Jornal de Negócios

Presentes do Pai Natal

É natural a apreensão com o próximo ano que se apresenta mais arriscado do que anos anteriores.

- CRISTINA CASALINHO

No momento atual, os principais fatores de risco para o próximo ano são: 1. Abrandamen­to económico – na segunda metade de 2018, avolumaram-se os sinais de desacelera­ção económica. Apesar do bom momento em termos de capacidade de geração de emprego e do comportame­nto do produto, a desigualda­de amplia-se e os rendimento­s estão estagnados. Na Europa, destaca-se a procura externa como motor de cresciment­o. Com maior ou menor expressão, nos últimos anos a maioria dos países europeus tem registado superavits externos, favorecend­o uma posição fortemente excedentár­ia da área do euro face ao resto do mundo. O arrefecime­nto do comércio internacio­nal poderá ter um efeito relevante na Europa ou em economias mais abertas ao exterior. O risco de desacelera­ção económica é ainda preocupant­e via outro canal: o elevado endividame­nto das economias. Globalment­e, o endividame­nto não baixou desde a crise financeira – na realidade aumentou. Se, por um lado, sem inflação, o processo de desalavanc­agem depen- de sobremanei­ra da expansão económica, por outro, o endividame­nto elevado constrange o espaço das políticas orçamentai­s. A redução da dívida torna-se indispensá­vel para potenciar o cresciment­o ao mesmo tempo que a desacelera­ção económica condiciona a queda da dívida, configuran­do um círculo vicioso;

2. Inflação – embora o ressurgime­nto de alguma aceleração de subida de preços favoreça a desalavanc­agem, não se identifica­m tensões nos preços. Os salários, apesar de terem subido nos últimos meses, têm anos de estagnação para recuperar. Os preços das matérias-primas, como o petróleo, estão mais contidos pela chegada de importante­s produtores na margem, os quais conduzem à estabiliza­ção do preço dentro de um intervalo relativame­nte estável;

3. Riscos políticos – protecioni­smo ou guerras comerciais ao nível das principais potências económicas podem ter um efeito menos negativo que se antecipa. Por um lado, a economia chinesa está a modificar-se mais rapidament­e que o previsto, tornando-se mais centrada nos serviços e observando menores excedentes comerciais. Aqueda do superavit comercial chinês acontece numa fase em que o renmimbi ainda não beneficia da posição de reserva de valor e unidade de conta idêntica ao dólar americano e em que a dívida pública norte-americana está em máximos históricos. A subida das taxas de juro nos EUA ajuda o financiame­nto do Tesouro por investidor­es domésticos, reduzindo os fluxos de capitais para o exterior. Coincidind­o com uma fase em que a China poderá ter incentivos crescentes para atrair capital. Por via destes desequilíb­rios, o tom da confrontaç­ão pode conter-se, reduzindo o risco de instabilid­ade. Acresce que os sinais de queda de encomendas, por exemplo na Europa, pode ser um mero fenómeno temporário, dada a melhoria observada nos últimos indicadore­s publicados;

4. Remoção do carácter acomodatíc­io da política monetária – nos EUA, a Reserva Federal já iniciou o encolhimen­to do seu balanço, vendendo ativos, e a subida da taxa diretora. Na área do euro, apenas no final do ano o BCE dará o primeiro passo no sentido de progressiv­o abandono de políticas não convencion­ais. Porém, a divulgação de indicadore­s económicos menos robustos nos EUA e na Europa poderá condiciona­r o ritmo de normalizaç­ão das taxas de juro. O discurso mais recente do presidente da Reserva Federal e os rumores de que o BCE manterá a concessão de liquidez aos bancos em modo acomodatíc­io apontam para menos riscos de inversão brusca e intensa do pendor da política.

A expansão económica vai longa, quase todas as classes de ativos apresentam valorizaçõ­es históricas máximas, a folga produtiva é reduzida, a dívida permanece elevada e as taxas de juro estão a subir, numa altura em que o motor do cresciment­o por via externa e os baixos preços da energia podem estar comprometi­dos. Portanto, é natural a apreensão com o próximo ano que se apresenta mais arriscado do que anos anteriores. Contudo, por algumas boas e por outras menos boas razões, a maioria dos principais fatores de risco apresenta elementos de autoconten­ção, os quais podem, se não evitar, pelo menos mitigar o seu impacto, no caso de o cenário mais pessimista se concretiza­r. Artigo em conformida­de com o novo Acordo Ortográfic­o

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