Grupo de credores ameaça retirar concessões à Brisa
No PSD, estão-se todos a matar lá dentro! Ou param, ou pode ser um suicídio colectivo. Miguel Pina Martins é o CEO e um dos fundadores da Science4you, a estrela da bolsa portuguesa este Natal. O IPO da fabricante de brinquedos científicos, nascida há 10 anos, “é o maior risco que a empresa já correu”, admite. O empresário e empreendedor acaba de lançar o livro “A Ciência de Brincar” no qual, com o jornalista Rui Hortelão, conta a história da start-up. Ao Negócios, falou das expectativas que tem, admitiu erros e falou do seu passado na política como “jotinha”.
Que relação tinha com a ciência antes do projecto da Science4you?
Absolutamente nenhuma.
Não foi daqueles miúdos que gostavam de fazer experiências?
Infelizmente, não. Não gostava dos microscópios nem dos telescópios. O meu irmão, que é mais velho, é que adorava. Ele seguiu biologia. Foi giro porque acabámos por nos reencontrar na Faculdade de Ciências [da Universidade de Lisboa] quando ele estava lá a dar aulas e a tirar o doutoramento. A Science4you, inicialmente, era nessa faculdade. Quando era pequeno, eu gostava muito dos monopólios e dos legos. Continuo a adorar.
Ainda é um brinquedo muito consensual.
A Lego é uma grande inspiração para nós, na Science4you, porque é uma marca “umbrella”, ao contrário da Mattel e da Hasbro. A Hasbro é detentora do jogo do Monopólio e das Nurfs. E a Mattel da Barbie e dos Hot Wheels. A Lego é a Lego. É o maior caso de sucesso, a nível mundial, de crescimento de uma empresa de brinquedos. Até há 10 anos, estava numa situação complicadíssima e passou por um renascimento. Perderam a patente das peças. Hoje em dia, há legos igualzinhos a metade do preço. Mas, mesmo com esse desafio, conseguiram crescer. Começaram a apostar em licenciamento e também no online. Criaram muitos conteúdos para a internet, apostaram em multimédia, em filmes. E o YouTube está carregado de desenhos animados da Lego. Foram muito inteligentes. É aquilo que nós procuramos: um brinquedo didáctico que os pais gostam de oferecer porque tira os filhos dos ecrãs.
A tecnologia não é uma ameaça?
Não, é uma oportunidade muito grande para a Science4you. As crianças estão viciadíssimas em ecrãs. É facílimo comprar o silêncio em casa dando-lhes ecrãs. Eu também o faço. Toda a gente o faz. Mas é mau. O brinquedo é a melhor ferramenta para tirar as crianças dos ecrãs. O mercado dos brinquedos cresceu mais de 10% nos últimos 10 anos porque quanto mais as crianças estão viciadas em ecrãs mais os pais percebem que têm de arranjar maneira de os tirar dali. E o brinquedo Science4you comunica muito bem com os pais. Tem um “mix” entre diversão e educação. E a própria criança vai procurar o adulto para a ajudar. Isso é importante. A Science4you tenta reunir famílias. Além disso, há um potencial de venda online gigantesco. A Amazon tem uma vantagem muito grande – é extremamente democrática. É preciso investimento e tempo, mas é possível. Já provámos que conseguimos chegar à “pole position”. Na quinta-feira antes da Black Friday, tivemos o segundo produto mais vendido na Amazon na categoria de brinquedos, logo depois do Monopólio. Foi o Slime Factory Glow in the Dark. Conseguimos ser número dois! Mas depois acabou o “stock”! (risos)
O projecto da Science4you nasceu quando ainda estava a tirar a licenciatura em Finanças, no ISCTE. Era o seu projecto de final de curso. Tudo começou com um papelinho que dizia “kits de Física”.
Sim, foi em Janeiro de 2007. O professor Paulo Esperança, que agora é o dean da ISCTE Business School, tinha um método inovador de distribuição de ideias. Era um chapéu que tinha papelinhos com ideias escritas. Cada grupo tirava um papelinho. Eu tirei o do meu grupo, que dizia: “Kits de Física.” Olhámos e ficámos revoltados. Os tipos à nossa frente tinham um camião do lixo com bactérias e que fazia menos três viagens por noite ao aterro porque as bactérias iam consumindo o lixo. O grupo ao lado tinha uma bactéria para colocar nos campos de golfe, de modo a precisar de menos 40% de água. Eram ideias espectaculares! E nós tínhamos os kits de Física... Chegámos ao pé do professor e dissemos: não queremos fazer isto. Não há outro papel? Não sobrou nenhuma ideia? E o professor disse: não. Nós insistimos: queremos trocar. Ele recusou várias vezes e por fim disse: acabou a conversa. Têm duas hipóteses: ou fazem os kits de Física ou não acabam o curso. Claro que fizemos os kits. (risos)
Provámos que conseguimos chegar à “pole position”. Na quinta-feira antes da Black Friday, tivemos o segundo produto mais vendido na Amazon na categoria de brinquedos.
Nesta fase, já havia uma parceria com a Faculdade de Ciências?
Sim, as ideias vinham da Faculdade de Ciências para nós montarmos os planos de negócio. Quando fomos lá, odiámos ainda mais a ideia. Era material de laboratório enorme para vender às escolas. Até que uma coisa me chamou a atenção – era “certificado pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa”. Pensámos: e se, além dos kits, fizermos festas de aniversário e campos de férias na Faculdade de Ciências, certificadas pela Faculdade de Ciências, para os miúdos se entusiasmarem com a química e com a biologia? E brinquedos científicos com o símbolo da faculdade em vez de ser a Mattel ou a Hasbro a dizerem que era bom? Tem potencial! E pronto, fizemos o plano de negócio. Tivemos boa nota. Havia um prémio, mas não ganhámos. Acabámos o curso e eu fui trabalhar para a banca de investimento.
Virou a página e não pensou mais nisso?
Sim, estava feito. Acabou. Em 2007, havia muito emprego. Foi mesmo antes de a crise internacional rebentar. O “subprime” rebentou no Verão e lembro-me de que estava na sala de mercados. Tudo em apoteose. Era uma festa. Lembro-me da cotação do BCP a 4,20 euros. Foram quatro meses muito intensos. Só que comecei a pensar que não era aquilo que eu queria fazer até ao fim da vida. Pensei: o que é que eu faço aqui? Compro ou vendo acções. Ou não faço nada. Era redutor.
Não gostou da experiência?
Fui atrás do dinheiro. Não sabia o que queria fazer. Pagava-se muito bem na altura. O meu ordenado era, para aí, 1.500 ou 1.600 euros. Acabadinho de sair da faculdade! Tive cerca de oito propostas de trabalho deste género, mas esta era a que pagava mais. Estava no curso de Finanças e toda a gente queria ir para a banca de investimento. Fui dos poucos a ter essa oportunidade. Pensei: se toda a gente quer ir para lá, deve ser bom. Ao fim dos quatro meses, fui ter com o meu chefe, que era o Diogo Costa do BIG, e disse-lhe que ia tentar levantar capital para a Science4you.
Mas quando é que percebeu que isso podia ser um caminho para si?
O Luís Martins, ainda hoje administrador da empresa, estava a trabalhar no Audax, que era o centro de empreendedorismo do ISCTE, e tinha a missão de tentar pegar nesses projectos de final de curso e transformá-los em empresas. Ele era meu colega e meu amigo da faculdade. Fui para o BIG e ele para o Audax. O Luís não parava de me chatear. Vamos tentar. E eu aceitei. Mas inscrevi-me no mestrado, para o caso de aquilo correr mal. Pelo menos podia dizer que tinha ido tirar o mestrado.
Servia para se desculpar aos seus pais?
Sim, principalmente a eles. Licenciei-me com média de 14. Não era um superaluno, mas fiz tudo certinho. E, sobretudo, era muito novo, tinha 21 anos. Os meus pais disseram: vai tirar o mestrado. Não há problema. Queres experimentar uma coisa diferente? Não havia pressa. Vivia em casa dos meus pais, não tinha encargos, não tinha muito a perder. Não estava a arriscar muito. Se não corresse bem, era a vida.
O que aconteceu aos seus outros colegas que tiraram o papelinho consigo?
Cada um seguiu o seu caminho. Uns foram para a Delloite, outros para BCP, Santander, PwC... Estão todos muito bem.
Como é que começou a desenvolver a empresa?
Levantámos 45 mil euros. Mas, primeiro, peguei nos meus 1.125 euros – que foi o meu primeiro investimento. Na altura, pagava-se bem na banca de investimento, mas não sobrou muito porque eu “limpei” logo os meus primeiros ordenados em sei lá o quê. Faz parte. (risos) Nunca tinha recebido nada... eram só notas! Pagava rodadas a todos. Darem aquele dinheiro a um miúdo de 21 anos... não fazia sentido nenhum. Depois, lá consegui os tais 1.125 euros e fiz um peditório no ISCTE. Eram precisos 5 mil euros e eu não os tinha. O Luís Martins entrou com mais 1.125 euros. Eu disse-lhe: já que me convenceste a vir para aqui, pões tudo igual a mim. Mas ainda faltava muito. Então, andei a bater à porta dos professores no ISCTE.
Os professores do ISCTE é que financiaram a Science4you?
Sim. O professor Paulo Esperança, de cujo chapéu tirei o papelinho, foi um dos que puseram mais. Ele obrigou-me a tirar a ideia! (risos) Pôs 500 euros. Depois, o professor Gomes Mota pôs 250 euros. A professora Clementina Barroso pôs 250 euros. O professor Leite Inácio, que era o nosso coordenador de projecto, entrou com 500 euros. E fomos pedindo até conseguir os 5 mil euros.
Esse dinheiro serviu para quê?
Para começar a empresa. Depois fomos buscar 45 mil euros ao capital de risco, à Portugal Ventures, na altura InovCapital. E o resto foram os kits de Física que entraram com 5 mil euros em espécie, que eram as patentes. E os outros 5 mil euros foi dinheiro dado por estas pessoas.
Quando foi à Portugal Ventures procurar financiamento, conseguiu logo convencê-los de que era um bom projecto?
Tivemos de fazer cartas de intenções. Mas, nessa altura, a crise ainda não se estava a sentir. Não tive dificuldade em convencer porque não havia nada. O próprio fundo não estava bem montado. Eu era um empreendedor que tinha 2% da empresa. A Portugal Ventures tinha 90%. Isto, hoje em dia, não cabe na cabeça de ninguém. Mas ninguém sabia fazer estas operações, então fazia-se assim. A asneirada que ia sendo feita foi corrigida mais à frente, quando o professor José Epifânio da Franca entrou para a Portugal Ventures. Ele tinha uma enorme experiência neste processos. Tinha feito muitas rondas internacionais e tinha experiência de “private equity”. Sabia fazer [estes processos de financiamento de start-ups] de uma ponta à outra. Quando foi para presidente da Portugal Ventures, disse: isto está tudo mal. E refez a “cap table” toda. Foi extremamen-
A estrutura organizativa de um partido está montada para que as pessoas formem caciques de voto. A única forma de resolver isto é com directas para tudo.
A política dá-nos uma tarimba muito grande na liderança. Quem conseguir liderar organizações de voluntários tem uma vantagem muito superior.
te importante. Tinha muito aquela ideia de investir. Era preciso dinâmica, a economia estava desolada. A 30 de Janeiro de 2008, passam-nos um cheque de 45 mil euros e começámos a trabalhar. Nesse ano, vendemos 55 mil euros e, no ano passado, vendemos um pouco mais de 20 milhões de euros.
Qual foi o primeiro brinquedo da Science4you?
Um gerador eólico. Também tínhamos um estojo de química, brinquedos de física...
Mas quem é que criou esses brinquedos?
O que fazíamos era encontrar brinquedos minimamente científicos, importávamos, fazíamos um livro todo bonito, escrito pelos professores da Faculdade de Ciências que tinham dado os tais 5 mil euros iniciais em patentes, que nos iam escrevendo os livros “pro bono”, porque eram accionistas da empresa. Depois colocávamos o símbolo da faculdade. Na prática, usávamos brinquedos que já existiam. Eu não percebia nada de ciência, ainda não percebo e foi assim que começou. O primeiro brinquedo inteiramente feito por nós foi o vulcão. Hoje, tudo o que fazemos é nosso.
Como é o processo de criar um brinquedo científico?
Temos o “brainstorming”, em que os nossos cientistas dão ideias, o marketing também apura as tendências. Agora estão na moda as bombas de banho. É uma coisa que se atira para a água e faz uns sais. Cada vez mais as tendências têm que ver com os YouTubers. O “slime” [o produto mais vendido] vem muito daí. E a nossa concorrência é sempre extremamente inspiradora. Faz parte.
Têm de estar atentos aos YouTubers?
Sim, porque tudo o que é visual é muito mais fácil de ser tendência. O YouTuber vive muito do conteúdo. O “slime” é giríssimo, por exemplo.
Os brinquedos que produz estão a mudar a forma como as crianças olham para a ciência?
É uma pedrada no charco. Acho que é uma ajuda. Estou capaz de dizer que Portugal é o país onde há maior percentagem de venda de brinquedos científicos na Europa, “per capita”. Quase que criámos esta categoria. Já se associa muito a marca ao brinquedo científico. Felizmente, conseguimos dar esse “input” aqui. Nos outros países, ainda não temos dimensão que o permita. Conseguimos fazê-lo porque juntamos diversão e educação. É ciência na mesma, mas tem de ser divertido. O “slime” é para fazer uma coi-
sa nojenta que se pega por todo o lado e que os miúdos adoram.
Que erros cometeu nestes 10 anos?
Este brinquedo, que é o Smart Monkey, é um macaco de peluche que tem bluetooth cá dentro, que se liga ao tablet. O macaco diz: vou-te ensinar a contar. E a criança diz: um, dois, quatro... O macaco responde: está errado! E faz outras coisas. Uma pessoa olha para isto e pensa: é espectacular! Vai vender como pãezinhos quentes. Não, não vendeu. Foi um fracasso. Porquê? Os pais não querem que as crianças brinquem com os tablets. Quando vão à Science4you, querem que eles não estejam com o tablet. Não conseguimos ter brinquedos híbridos. Por isso continuamos a fazer brinquedos que tirem as crianças dos ecrãs. Mas cometi muitos erros. Um miúdo com 21 anos a abrir uma empresa e que nem sabia que uma entrega no El Corte Inglés do Porto se fazia por TNT ou por DHL... Peguei no carro e fui até lá acima com os bancos rebatidos. Paguei uma fortuna e só me apercebi quando lá cheguei. Foram muitos erros. Mas faz parte. O importante é errar, levantar e continuar. É preciso vermos o erro como uma oportunidade e uma parte integrante do processo. Nós, portugueses, temos um problema com o falhanço. Temos de falhar para aprender. Todos. A vida toda.
Houve uma altura em que esteve muito ligado à política. Aos 19 anos, era deputado municipal do PSD no Seixal e chegou a ser presidente da JSD distrital de Setúbal.
E cheguei a ser ainda, por uns tempos, presidente da mesa do congresso da JSD nacional.
Nunca teve ambições políticas?
Sempre gostei muito da política, e ainda gosto, mas não achei que fosse vida para mim. É um caminho que não é fácil.
Ficou desiludido?
Não directamente. Aqui, eu vendo brinquedos. Tenho de facturar e ter lucro. Na política, o caminho é ter votos. Internos, acima de tudo. Quem é que vota em nós? São os amigos. E vemos os caciques e aquela coisa toda. Se o objectivo é ter votos e uma pessoa tem uma família com 30 pessoas, pega na carrinha, vai buscá-las e leva-as a votar. Fica toda a gente muito escandalizada. Mas o objectivo é ter votos. Ou seja, o princípio do partido político, como está montado, é que sejam formados caciques de voto, que façam um bom trabalho, mas que controlem os votos uns dos outros, para conseguirem lugares. E, quanto mais pequenos são os meios, mais isto acontece. Por isso é que as directas são muito importantes. As pessoas não controlam os cadernos eleitorais. É algo fundamental para a democratização das sociedades. Não é preciso andar a pagar quotas. Aquilo é sempre um escândalo, aquele tem as quotas pagas, quem é que lhe pagou? Mas os partidos foram montados assim...
Ainda está ligado ao PSD?
Não, não estou. Já não tenho cargos.
Mas é militante?
Ainda sou militante, mas já não pago as quotas há muito tempo.
Como empresário, sente que a sua experiência política lhe abriu portas?
Não, porque nunca cheguei a ter um cargo relevante.
Mas tem conhecimentos e, na política, isso também tem valor.
Nós não vendemos ao Estado. A Câmara de Lisboa compra-nos, se calhar, três ou quatro mil euros de brinquedos para “corporate”, mas o Estado não é nosso cliente. Claro que é sempre bom ter “networking”. Por exemplo, o dono da gráfica que nos deu a mão inicialmente, e que foi muito importante no processo todo da Science4you, foi uma pessoa que conheci quando estava na JSD. Nesse aspecto, obviamente, é importante. Mas, acima de tudo, a política dá-nos uma tarimba muito grande na liderança. Acredito que quem conseguir liderar organizações de voluntários tem uma vantagem muito superior quando liderar organizações em que as pessoas dependem do seu ordenado para ali estar. Numa organização de voluntários, a pessoa tem de ter uma capacidade de mobilização gigantesca. Não posso dizer: tens de ir para ali. Só vai quem quer, ao fim do dia, quando já está cansado e sem qualquer perspectiva de receber absolutamente nada. Não havia perspectiva nenhuma de alguém se tornar profissional no distrito de Setúbal. Era por carolice. Acho que isso me deu uma tarimba grande.
As juventudes partidárias não têm boa imagem. Há a ideia de que quem vai para as “jotas” está à procura de um “tacho”.
Como em todo o lado, há boas pessoas que estão nas juventudes partidárias e há outras que são péssimas. Mais uma vez, digo: a estrutura organizativa de um partido está montada para que as pessoas formem caciques de voto. Obviamente, o modelo não é espectacular. Também não conheço outro, não estou a dar soluções. A única forma de resolver isto, no meu entender, é com directas para tudo. Quanto menos se controlar o universo, mais democrático ele é. Mas é muito difícil sair disto. É preciso dominar a máquina do partido e, às vezes, sujar as mãos para a dominar. Porque as pessoas vivem daquilo. Têm de lutar para defender o que é seu.
O PSD está a viver um momento difícil.
É um momento normal que já viveu no passado.
Acha normal a contestação interna ao presidente do partido, Rui Rio?
Na altura do Marques Mendes e do Luís Filipe Menezes, também foi do pior. Acho que até pior do que agora. O Menezes dizia que só saía à bomba e, passado não sei quanto tempo, saiu. Com o próprio Marques Mendes, estava sempre tudo em rebelião. Acho que o PSD e os partidos, genericamente, quando estão na oposição, têm dificuldade em gerir a situação. Há sempre alguém que acredita que pode lá chegar [ao poder] mais cedo do que se prevê. As sondagens não aparecem e as pessoas começam a ficar nervosas porque, mais uma vez, dependem daquilo para viver. É como está feito o aparelho. Quando entra um líder, à partida, há metade do partido que está de fora nas próximas listas de deputados. Isto funciona tudo assim, infelizmente. Quando a Manuela Ferreira Leite ganhou e excluiu o Passos Coelho e o próprio Miguel Relvas das listas de deputados, aquilo gerou um grande mal-estar. Por isso é que agora estão todos sedentos de sangue. Porque já sabem o que vai acontecer. “Vão excluir-me, não tenho emprego, o que é que faço da minha vida?”
Rui Rio terá capacidade para se manter no cargo até às próximas eleições?
Capacidade tem. Foi eleito.
Pessoalmente, o que lhe parece esta liderança?
Foi o que o partido decidiu. Não votei.
O PSD tem sido acusado de não ter feito uma boa oposição.
Estão-se todos a matar lá dentro! Ou param, como disse um dia destes um dos vice-presidentes, ou acho que pode ser um suicídio colectivo. É bom haver oposição em Portugal, é muito importante existir equilíbrios, e também acho que é importante conseguir governar com os programas de governo que fizeram. Sou uma pessoa tendencialmente mais à direita, mas neste momento seria preferível o PS a governar sozinho do que com uma maioria de esquerda. Seria importante que não houvesse mais geringonças, porque é preciso fazer reformas.
Prefere o PS a governar sozinho ou num bloco central com o PSD?
Preferia, se fosse possível, com o PSD. Acho que se conseguiria dar um equilíbrio mais interessante. Faria todo o sentido. Mas o mais importante é a estabilidade política. Preferia que o PS tivesse governado sozinho do que com a geringonça. Acho que o PS tinha um programa de governo muito interessante a nível de reformas e as coisas ficaram um bocadinho por fazer. Mesmo assim, tendo em conta as expectativas e todos os consensos necessários, acho que conseguiram fazer um excelente trabalho. Agora falta implementar algumas reformas que implicam uma estabilidade governativa diferente. É isso que o país precisa. E precisa também de orçamentos amigáveis das empresas para potenciar o investimento, a criação de emprego, a exportação – tudo aquilo que precisamos para continuarmos a crescer.
António Costa esteve aqui há poucos dias. Visitar as suas instalações, precisamente na altura em que estava a lançar a empresa na bolsa, é um sinal político?
Não. Convidei-o num jantar oferecido no âmbito do Web Summit. Nessa altura, não sabia a data e não era público sequer que íamos fazer o IPO.
O primeiro-ministro não veio dar um cunho nacional à operação?
Era importante que não houvesse mais “geringonças” porque é preciso fazer reformas.
Já se associa muito a marca ao brinquedo científico [...]. Não quero ver-me livre disto. É o meu bebé, para o bem e para o mal.
Não teve nada que ver com isso. Acho que o António Costa veio dar uma nota de que quer apoiar as empresas. O país precisa disso. Pelo menos, foi esse o sentimento que tive.
Foi uma grande coincidência...
Foi. Gostámos, obviamente. É sempre uma honra receber o primeiro-ministro.
A estreia em bolsa da Science4you vai, à partida, ocorrer três dias antes do Natal. Porque é que era tão importante que fosse nesta altura?
Porque é quando se fala mais de brinquedos, há mais exposição mediática. Era importante tentar juntar as duas coisas. Esta não é uma operação gigantesca. E acreditamos que ajuda também nas vendas porque temos mais quiosques abertos, uma capacidade de comunicação superior, as pessoas estão mais atentas. Em Janeiro, já ninguém pode ver brinquedos à frente.
Não tem medo de estar a dar um passo maior do que a perna?
É o maior desafio que a Science4you alguma vez teve. Mas acreditamos que é possível. Há uma coisa muito importante, que ninguém controla, que é o “timing ” do mercado. Vimos o que aconteceu com a Sonae [retirou a operação do mercado]. Apesar de que, quando a Sonae aconteceu, o nosso o barco já estava dentro de água, por isso, era completamente indiferente. Temos de perceber o que o mercado acha. É um desafio. Mas na vida é preciso correr riscos. Faz parte do que é a Science4you. Desde o primeiro dia, quando nasceu, foi um tiro no escuro.
Neste momento, há problemas no sector, com gigantes como a Toys “R” Us a passar por dificuldades. Como é que os investidores vão olhar para isso?
É uma questão de verem onde é que nós estamos. O retalho está a passar por problemas e a solução que apresentamos é: vamos apostar no e-commerce. Este é o futuro da Science4you. É a Amazon que nos vai fazer as vendas e queremos construir uma plataforma educativa em que as crianças vão ao site e têm conteúdos educativos, em que aprendem como fazer a experiência de um vulcão, como fazer um “slime”. Conteúdos que permitam aprender um pouco de ciência e que depois tenha uma parte de venda que diga: “Gostaste desta experiência? Tens aqui, podes comprar.” Entra na Amazon, passada uma hora entrega em casa.
A Amazon já representa bastante nas vossas vendas?
É o nosso maior cliente. É onde se vendem mais brinquedos da Science4you no mundo.
A empresa foi sempre muito focada em si. Isso não é um risco?
Porque fui sempre o CEO. Quando comecei, era só eu. Hoje já não sou só eu e não tenho qualquer tipo de funções operacionais. Inicialmente tentava “vender” o empreendedorismo, foi uma das grandes alavancagens que tivemos. E, como era só eu, depois as pessoas queriam fazer o “follow-up”. Então como está o miudinho de 23 anos que entrevistámos há dois anos?
Diz que trabalha em média onze horas por dia e que deixou de ter tempo para si. Abrandou o ritmo, agora que é pai de três crianças muito pequenas?
Tenho os gémeos com três anos e um bebé com cinco meses. Quando chego a casa, tento estar apenas focado nas crianças. Não tenho tido é muito tempo para desporto. A minha corrida, ultimamente, tem sido o IPO. Estou a emagrecer bastante. Nem sei para que é que andei a correr. Se soubesse, já tinha feito um IPO mais cedo. (risos)
De acordo com o prospecto, vai ter de manter as acções da Science4you por, pelo menos, dois anos. O que pretende fazer depois?
Não me vejo a sair daqui enquanto puder acrescentar valor. Acho que ainda há muito para fazer. Não quero ver-me livre disto. É o meu bebé, para o bem e para o mal.