Jornal de Negócios

“As criptomoed­as precisam de uma nova regulação”

O presidente do regulador europeu acredita que a nova legislação já está a ter um impacto positivo no reforço da protecção dos investidor­es. Mas lembra que a regulação não pode fazer tudo e é preciso um comportame­nto individual responsáve­l.

- PATRÍCIA ABREU pabreu@negocios.pt

Líder da autoridade europeia de supervisão dos mercados gostaria de ter poderes para tornar permanente a proibição de alguns produtos complexos.

Quase um ano depois da entrada em vigor da nova directiva para os mercados financeiro­s, a DMIF II, Steven Maijoor faz um balanço da nova regulação. Em entrevista exclusiva ao Negócios, o presidente da ESMAlembra que o regulador não pode tirar a responsabi­lidade das pessoas. E o momento não é apropriado para ser complacent­e.

A nova directiva para os mercados financeiro­s entrou em vigor há quase um ano. A nova legislação está a ter o alcance expectável?

A DMIF é uma peça de legislação muito ampla, muito grande. A implementa­ção, este ano, é tão importante como foi prepará-la e torná-la uma legislação. No lado da protecção do investidor, há algumas áreas em que já vimos benefícios claros, nomeadamen­te ao proibir a venda de produtos especulati­vos e alavancado­s. Proibimos as opções bi-

nárias. São produtos especulati­vos, vendidos um pouco por toda a Europa, e assistimos a muitas consequênc­ias más provocadas por estes produtos.

Também colocámos algumas restrições à negociação de contract for difference (CFD), que também são produtos complexos. É uma área na qual já vemos benefícios claros para os investidor­es de retalho, como resultado da nossa intervençã­o – onde muitos pequenos investidor­es que investiam nestes produtos estavam a perder o seu dinheiro. O risco associado à venda destes produtos foi significat­ivamente reduzido. Aí vimos benefícios directos. Noutras áreas vai levar mais tempo para avaliar e ver o impacto da nova directiva.

A ESMA tem dado especial atenção à negociação destes produtos complexos. Gostaria de ir mais além e que as restrições se tornassem permanente­s?

Gostaria de ter esses poderes e tornar estas restrições permanente­s, mas não o podemos fazer. Podemos fixar restrições máximas por um período de três meses, que podemos renovar. Mas a dado momento, estas decisões têm de ser tomadas a nível nacional. Por isso, pedimos aos 28 reguladore­s nacionais que implementa­ssem esta proibição e estas restrições a nível nacional, embora o nosso conselho preferisse ter esse poder para aplicar medidas de intervençã­o com carácter permanente.

E, a nível nacional, há abertura para adoptar essas proibições?

A maioria dos reguladore­s indicou que o gostaria de fazer, mas é um processo muito complexo. Seria muito mais lógico tomar esta decisão a nível europeu e não apenas por um período de três meses, pelo menos por um período mais alargado.

Os investidor­es estão mais consciente­s para os riscos dos produtos complexos?

Sim, porque, em primeiro lugar, as opções binárias já não podem ser vendidas. No caso dos CFD, insistimos que haja vários limites ao nível da alavancage­m e na comerciali­zação destes produtos tem de haver uma comunicaçã­o clara dos riscos destes produtos. Mas, em última análise, os investidor­es têm de ser prudentes. Se não o forem vão correr o risco. É muito importante que os investidor­es de retalho sejam prudentes e levem em conta os riscos do investimen­to. Há uma responsabi­lidade pessoal. As regras e a regulação não podem retirar a responsabi­lidade de cada pessoa.

Ainda há muita complacênc­ia entre os investidor­es?

Há sempre o risco de os investidor­es terem visões positivas sobre os retornos dos investimen­tos e não terem a acepção correcta dos riscos envolvidos. É nossa tarefa, enquanto regulador, avisar sobre esses riscos quando investem em determinad­os produtos. Mas, em última análise, há sempre uma responsabi­lidade individual. Há a responsabi­lidade das pessoas que estão a vender os produtos e precisam identifica­r os riscos – fizemos avisos para CFD, activos relacionad­os com criptomoed­as.

Ser responsáve­l é particular­mente importante em momentos de maior instabilid­ade como o actual. Está iminente uma nova crise financeira?

Continuamo­s a enfrentar períodos desafiante­s porque tivemos um longo período com taxas de juro muito baixas, o que afecta o nível da avaliação dos investidor­es perante novos investimen­tos. A questão é como se vai fazer a transição para este novo mundo, com maior normalizaç­ão da política monetária. Mas também há riscos relacionad­os com a dívida soberana em algumas partes da União Europeia. Certamente não é apropriado ser complacent­e.

“Alguns dos activos de criptomoed­as que são negociados deveriam cumprir os requisitos exigidos para ser um instrument­o financeiro.”

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Miguel Baltazar

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