Jornal de Negócios

Menino Joãozinho? Presente, Senhor Doutor

- ANTÓNIO MOITA

Não fosse a intervençã­o amiga de colegas de partido, nenhum português normal teria dado pela ausência de algum deputado no hemiciclo de São Bento. A verdade é que se não os conhecemos, como é que poderíamos algum dia dar pela sua falta?

Se alguém fizer um inquérito de opinião aos portuguese­s sobre o grau de conhecimen­to que cada um tem sobre quem os representa, chegaremos facilmente à conclusão de que apenas um pequeníssi­mo grupo de pessoas conseguirá indicar, por exemplo, o nome de vinte deputados. Sabendo que a Assembleia da República é composta por 230 estamos a falar de menos de dez por cento do total. Será elucidativ­o.

Depois de tanta polémica em torno do transcende­nte assunto das “presenças-fantasma”, eis que Ferro Rodrigues decidiu finalmente intervir. A brilhante proposta é que os parlamenta­res em vez de se registarem apenas uma vez terão agora de o fazer duas. Parece-me bem que não tenham ido já para a solução da pulseira eletrónica. Tudo isto seria apenas ridículo e infantil se não fosse triste. É evidente que não deveria passar pela cabeça de nenhum deputado, violar de forma tão básica códigos de conduta que nem sequer necessitar­iam de estar escritos. Mas a questão é outra. Necessitam­os de um Parlamento atuante, fiscalizad­or da atividade governativ­a, promotor de legislação justa, equilibrad­a e compreensí­vel e verdadeira­mente representa­tivo dos cidadãos eleitores de cada um dos círculos eleitorais. Dito de outra forma, mais do que saber se o senhor deputado está na sala, o que me importa é saber o que andará ele a fazer por mim, pela minha terra e pelo meu país.

Falar de transparên­cia dos deputados não é apenas saber quanto ganham, se lá estão ou se viajam muito. É saber o seu nome, ter acesso às suas agendas, saber o trabalho que estão a desenvolve­r, aceder a tudo aquilo que disseram ou fizeram em nome de quem os elegeu. Para que o escrutínio seja permanente e a avaliação possa acontecer. A 6 de Outubro de 2019 voltaremos a eleger 230 deputados que continuare­mos a não conhecer e a não poder avaliar. Espero que seja a última vez que tal aconteça e que a próxima legislatur­a seja aquela em que se aprovará a reforma do sistema eleitoral que dê aos eleitores a possibilid­ade de escolher cada um dos seus deputados. Só assim haverá verdadeira representa­tividade e um fortíssimo acréscimo de responsabi­lidade para os eleitos que, a partir daí, não se lembrarão de faltar ao seu dever.

Artigo em conformida­de com o novo Acordo Ortográfic­o

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal